Pra não dizer que não falei dos professores

Repetir exaustivamente que o professor merece respeito é o mesmo que falar “estamos fartos de corrupção”, e continuar votando nessa gente. Essa gente que nos rouba, e desacata todo e qualquer cidadão comum, que não possa lhe oferecer vantagem, propina, uma mala de dinheiro. É dessa obscenidade toda que também nasce o desprezo pela nossa classe: educação é sinônimo de bolso vazio.Isso tudo já foi dito, reproduzido nos discursos vazios, na demagogia de quem devia trabalhar por nós. A sociedade faz coro às dificuldades e imoralidades que o magistério enfrenta, mas até certo limite. E o limite da nossa coletividade se chama ENEM. O ENEM é outra história; com o ENEM não se pode mexer. O professorado pode e deve reivindicar seus direitos, só não pode respingar no ENEM. A mídia cai em cima, e o professor vira bandido em manchete nacional: imagina prejudicar o futuro dos estudantes? Mas e o presente tão sofrido dos nossos educadores, é prejuízo pra quem? A vida real não é feita apenas de notas e provas, e ser professor, hoje em dia, vai além de ensinar conteúdos: quem persiste na profissão dá aula de cidadania.

Tem muita gente se perguntando quando é que foi que o professor deixou de ensinar por amor? Ninguém paga a conta do mercado com abnegação, a companhia elétrica não aceita crédito de boa vontade. É preciso dinheiro pra poder viver. E, não só pra pagar o aluguel e a farmácia, mas pra comprar bons livros. Pra comprar papel higiênico e durex e doar pra escola; pagar pra poder trabalhar, sim. Precisa muito investimento, de tempo e dinheiro, pra fazer um curso e se atualizar. Não será com R$350,00 por mês, nem com planos de carreira engessados e ultrapassados, que o Brasil vai acertar sua conta com o magistério.

A escola sempre é apontada como espaço de transformação, mas sozinho um professor nada consegue. Prova disso é a minha colega de profissão, de luta e, infelizmente, ex-colega de escola, Daniela Heckler, que na semana passada teve seu projeto “Poesia para colorir…o seu dia”, a partir da obra de Carlos Fernando Leser, vencedor do Prêmio Arte na Escola Cidadã – categoria educação infantil. Uma ação conjunta entre alunos e uma professora pra lá de criativos, o comprometimento da gestão escolar de 2016, pais e escritores, possibilitaram à EMEF do Bairro São Paulo voos mais altos; uma comunidade que deixou arte e poesia invadir seus lares e cotidianos. Isso é ensinar com amor. Aprendemos todos nós.

A Daniela não é muito diferente dos outros educadores que conheço, mas hoje, pra mim, ela é inspiração, é esperança na minha profissão.
Alguns governos alegam falta de dinheiro pra incentivar nossos projetos, pra bancar um plano de carreira decente. Outros, dizem não ter como honrar o compromisso de pagar salários em dia. Mas pra isenção fiscal, pros ajutórios das empresas privadas, sempre há orçamento. Os governos falam que precisam de mais empresas, por causa da geração de uma merreca de empregos. Eu acredito que precisamos de mais Danis, por nossos milhares de alunos.

E como eu não disse nenhuma novidade mesmo, encerro com palavras de Paulo Freire: “É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo…”

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