Câncer, Aids, problemas cardíacos, depressão, Covid-19… Existem muitas doenças testando nosso sistema imunológico o tempo todo e a maioria delas, quando encontra um organismo fragilizado e mal nutrido, pode ser mortal. Contudo, na minha modesta opinião, não existe enfermidade mais perigosa do que a ignorância. Ela se manifesta em surtos de alienação, negação da Ciência e muita – mas muita – raiva. Quando contamina um ser humano já doente, não há remédio e nem curandeiro que resolvam. É caixão na certa, para alegria dos agentes funerários.
Não bastasse o flagelo que o coronavírus já representa para o mundo todo, estamos sendo vítimas, ao mesmo tempo, de uma pandemia de ignorância. Esta semana, finalmente, começou a vacinação contra a doença nascida na China, mas muita gente continua acreditando que ela não existe e não pretende se imunizar. Apesar das mais de 210 mil mortes no país. Da mesma forma que desprezam as máscaras, o álcool gel e os conselhos anti-aglomerações, estão certos de que, se forem contaminados, terão apenas uma gripezinha. Há quem diga, inclusive, que ao tomar a medicação da chinesa Coronavac, desenvolvida em parceria com o Instituto Butantan, a pessoa pode “virar jacaré”.
Na primeira vez em que li sobre o risco de me transformar num réptil, lembrei vagamente que já tivemos algo assim na história do Brasil. Busquei socorro nos livros para avivar a memória. Em meados de 1904, o Rio de Janeiro vivia uma epidemia de varíola. O governo conseguiu aprovar uma lei no Congresso tornando a vacinação obrigatória, mas quando veio a público que a medicação era feita a partir de material retirado de vacas, as fake news varreram a “cidade maravilhosa”. Dizia-se que as pessoas vacinadas passariam a ter as feições de um bovino.
O receio de virar um quadrúpede ruminante produziu o efeito desejado. Rapidamente, as pessoas começaram a fazer manifestações contra a imunização em massa. Em poucos dias, os protestos resultaram em quebradeira. O presidente Rodrigues Alves colocou o Exército nas ruas para reprimir a baderna. Nos confrontos, houve pelo menos 30 mortes. Com medo de uma guerra civil, o governo recuou e a obrigatoriedade caiu. O episódio ficou conhecido como a Revolta da Vacina.
Naquele ano, cerca de 1.800 moradores da então capital federal foram contaminados, mas não existem registros seguros sobre a quantidade de mortos. O fato é que a ignorância cobrou seu preço. Em 1908, o Rio foi atingido por uma nova onda da varíola. E, desta vez, os doentes foram 6.500. Aí, sim, muita gente correu atrás da vacina. Afinal, a dor ensina a gemer.
Quando vejo as pessoas combatendo a imunização contra a Covid-19, eu fico a me perguntar o que, de fato, move essa gente. Provavelmente, só chegaram à idade adulta porque receberam, ainda no colo dos pais, vacinas contra tuberculose, tétano, difteria, poliomielite, sarampo, coqueluche, rubéola e caxumba. Talvez até tenham corrido aos postos para se imunizar contra a Gripe A e outras variações da Influenza. Agora, porém, agem como se tivessem o “corpo fechado”.
Respeito o argumento daqueles que temem a medicação porque ela foi desenvolvida com pressa, mas não se pode desprezar o fato de que estamos diante de uma ameaça mundial. Diferente de outras moléstias, que têm alcance mais restrito, a Covid 19 é letal em todos os países. É lógico que os melhores cientistas do mundo, governos e corporações estão empenhando toda a sua energia no projeto. Logo, os resultados devem mesmo surgir mais rapidamente.
Então, meus amigos, não vamos retroceder a 1904 e permitir que a história se repita. Quando houver a possibilidade, dentro do cronograma definido pelo Ministério da Saúde, vou tomar a vacina, sem medo de virar jacaré. Acredito na Ciência e em Deus, que concedeu ao homem o poder de salvar vidas.