Há muito tempo, as redes sociais funcionam como uma espécie de tribunal, moendo reputações e destruindo imagens. A pandemia de coronavírus e o isolamento social que ela provocou potencializaram ainda mais seu poder destrutivo. Todos agora têm mais tempo e, ao invés de fazerem algo útil com ele, muitos internautas desperdiçam horas preciosas metidos em “barracos” virtuais. Tenho procurado manter uma distância segura das asneiras, que brotam mais rápido que inço depois de uma chuva de verão, mas nem sempre é possível ficar indiferente.
Esta semana, a curiosidade me atraiu para uma discussão em torno da presença dos homens ao lado das esposas grávidas no momento do parto. Num grupo, alguém reclamava que seu irmão teve negado, pelo Hospital Montenegro, o “direito” de acompanhar o nascimento do próprio filho. Logo de cara, percebi que a maioria dos “debatedores” não tinha qualquer relação com o fato em si. Estavam ali apenas para desfilar suas opiniões, em geral, sem o mínimo fundamento na prática do que é um dia numa maternidade.
Não sou pai, mas devo reconhecer que o nascimento de uma criança é um momento sublime, uma verdadeira bênção e, provavelmente, tentaria estar presente se fosse o caso. Contudo, o senso de responsabilidade me obriga a refletir sobre os riscos que esta prática envolve. No caso do Hospital Montenegro, a média é de quatro partos por dia. Como a espera ocorre ao lado do bloco cirúrgico, se cada uma das grávidas tiver um acompanhante, serão oito pessoas no mesmo ambiente. Óbvio que todas elas são hospedeiras de vírus, bactérias e outros microorganismos, que podem ser perigosos para as futuras mães e, mais ainda, para os recém-nascidos.
Infelizmente, muitos pais e mães estão transformando o parto num “evento social”. Querem fotografar e filmar cada contração e urro de dor, ou mesmo o trabalho do cirurgião no caso das cesáreas. Há que se reconhecer, por outro lado, que também existem mulheres que se sentem mais seguras quando amparadas pelo marido numa situação extremamente tensa. Contudo, este é um daqueles momentos em que tudo isso deve ser ponderado. Sentimentos e desejos num prato da balança e a estrutura do serviço médico no outro. Vale a pena correr o risco de ser contaminado, inclusive, pelo coronavírus? E a privacidade das grávidas, onde fica? Sim, porque na mesma sala estarão seus maridos e os das outras futuras mamães.
Em contato com a direção do HM, fui informado que a presença dos pais é permitida “quando possível” e, de fato, por causa da pandemia, as restrições aumentaram. Pelo bem maior, que é preservar a vida. Quando deputados e senadores escreveram a lei que dá aos maridos o direito de verem os filhos nascer, provavelmente não se preocuparam em saber se os hospitais tinham condições de garantir seu cumprimento.
Infelizmente, no debate que acompanhei, nada disso parecia ter a menor importância. Alguns internautas sugeriram, inclusive, que chamassem a Polícia e que processassem o Hospital. Enfermeiras e técnicas de enfermagem foram chamadas de “vacas” e “burras”, o que certamente renderá algumas ações por danos morais mais à frente. Tomara! Às vezes, só o pagamento de uma indenização é capaz de fazer certos tipos pensarem antes de falar ou escrever.
Quanto aos pais que não estão tendo a chance de ver os filhos chegarem a este mundo injusto e fútil, tenho uma sugestão que certamente vai compensar esta ausência. Amem estas crianças profundamente. Trabalhem duro para que elas tenham acesso a uma educação de qualidade e cresçam felizes. E se, um dia, a relação com a mãe se perder, não se divorciem dos filhos. Mantenham-se ao lado deles. Provavelmente eles precisarão muito mais de um pai em diferentes momentos da vida do que na hora do parto.