Ela chegou a estar quase morta. No ano passado ganhou um cantinho úmido, mas bem iluminado no pátio.
Ali foi se ajeitando. Mesmo sem um espaço de destaque, foi recuperando a forma e a vitalidade. Trocou as folhas, cresceu. Seu frágil caule se reforçou e surgiram quatro novos galhos.
Foi neste momento que ela reconquistou seu lugar de destaque dentro de casa.
Agora, carregada com inúmeros brotos, ostenta sua primeira flor. Sua cor é branca e carregada de paz. Difícil descrever tamanha beleza.
Já é possível contar seis flores. Elas têm aberto, em média, uma a cada semana.
Aqui em casa, chegamos a fazer uma brincadeira sobre a “demora”. Que, todos os dias ao amanhecer, precisaríamos cantar para a plantinha para que as flores se abrissem mais rápido. Afinal, mais vinte e dois “pontinhos” aguardam para se tornar flor.
Hoje, durante o café da manhã, recebi a triste notícia sobre a morte de mais um amigo. Olhei para frente, direto para a orquídea. Há mais flores espalhadas pela casa, mas era como se ela quisesse me mostrar algo. Como se me fitasse.
Meus pensamentos retornaram ao dia de ontem, no momento em que conversava com alguns colegas sobre a expectativa de vida do brasileiro. Segundo o IBGE, me resta de vida o mesmo número de botões que ainda permanecem fechados da orquídea. Me deparar com isto foi assustador e reconfortante.
Assustador, ao perceber a minha pressa em querer que seus botões logo se abram. Reconfortante, por entender que, por mais que eu me esforce para acelerar as coisas, a natureza tem seu próprio tempo.
Um tanto difícil, também. Esta semana, a orquídea já havia dado um alerta. Por detalhe, um acidente fez com que um dos botões caísse do galho. Em meus pensamentos, uma flor a menos. Com isto, a “notícia” de um tempo ainda mais curto. De uma possibilidade que nunca se realizará.
Não foi apenas a orquídea que passou por uma experiência de vida. Penso no quanto todos nós, também, necessitamos destes “cantinhos” úmidos e iluminados. No simbolismo psíquico, água e umidade, encontram uma forte representação no mundo dos sentimentos. E, convenhamos, um pouco de “iluminação” não faz mal para ninguém.
Sentado aqui, ainda olhando para ela, reconheço que a vida é como cada botão aberto. Mas não posso deixar de lembrar da frase escrita nos portões de um famoso cemitério, onde se pode ler: “Nós que aqui estamos, por vós esperamos”.
Então, antes que alguém me leve flores, nada mais saudável do que ir interagindo com as flores que encontro pelo caminho…
Paz e bem!