O atraso, logo na segunda-feira pela manhã, denunciava um dia atípico.
Reuni as coisas para passar o dia trabalhando no consultório. Saía pelo portão, quando lembrei que precisava levar um equipamento à assistência técnica. Ainda dispunha de uns dez minutinhos e não precisaria desviar meu trajeto. Resolvi aproveitar a oportunidade.
Trânsito tranquilo, sinaleira aberta, muitas vagas para estacionar. De dentro do carro, ainda tive tempo de ver a grade da loja sendo erguida. Tudo certo. Ao menos, parecia.
Ao entrar, já na porta, fui recebido com um tímido:
– Por favor, senhor, aguarde um minuto. Estamos inicializando o sistema.
Estranhei, mas dei um bom-dia e aguardei.
A impaciência que surgia me alertava de que os minutos de “gordura” dos quais eu gozava já não existiam mais. A mocinha que atendia, vendo que a coisa não andava e tentando ser atenciosa, começou a puxar assunto. Possivelmente, mais por tentar ganhar tempo do que por simpatia. Nada contra a menina. Ela transparecia não ser o tipo de pessoa que acorda cantando feito passarinho. Mas, sem saber, “acordaria” dentro de muito pouco tempo.
– O senhor está com muita pressa?
– Sim, tenho uma consulta agendada.
– Ah, médico?
– Não, psicólogo!
– Nossa, que legal. O senhor vai para a terapia? Eu também vou! Dois anos! Me ajuda muito, sabe?! Agora, estou indo duas vezes por semana. Meu psicólogo tem trabalhado comigo muitas questões. Estou revendo muitas coisas. Eu não gostava de terapia, sabe? Mas, aí, com o tempo a gente vai percebendo as coisas, entendendo, se transformando… Hoje o sistema está lento meeesmo… O meu psicólogo é o “Fulano de Tal”. Minha amiga que indicou. Ajudou muito ela. Em qual o senhor vai? Senhor, o sistema voltou. Qual é mesmo o seu nome?
Ainda sem entender o que se passava, respondo:
– Eu sou o “Fulano de Tal”. O seu psicólogo.
A mocinha “congela”. Em poucos segundos, suas bochechas estão completamente rosadas.
Em total silêncio, ela preenche minha ficha. Agradeço e sigo para o consultório,ainda pensando na situação inusitada.
No intervalo do meio-dia abro o aplicativo de mensagens. Percebo um número desconhecido, com a seguinte mensagem:“Aqui é a moça da assistência técnica. O senhor teria um horário para me atender ainda hoje? ”.
Como diria um amigo meu e também psicólogo:“Que me perdoem os bem-resolvidos… mas, terapia é fundamental! ”.
A mocinha acabara de descobrir isto.
Paz e bem!