Meu voto foi preto

Eleições, cargos políticos e política partidária sempre foi um tema que, de certa forma, parecia fora do meu escopo de alcance. Muitas vezes a gente para de olhar, de pensar e principalmente de entender o real sentido do pleito. No meu caso, tinha dificuldade de entender a diferença entre política e politicagem. E isso vai acontecer até o momento que você vai precisar daqueles que você votou e eles explicarem que não é a pauta deles, que não tem sentido “neste momento do mandato”.

E, provavelmente, não fará sentido por muito tempo, fazendo com que as políticas públicas atinjam uma minoria. É quando percebemos a necessidade de representatividade em todos os setores da sociedade e principalmente da política para defender nossos interesses. Mesmo sabendo que o racismo estrutural, racismo institucional, negritude, e feminismo negros são pautas de todos, cabe aos protagonistas que vivem essa pauta diariamente, demandar sobre necessidades e prioridades. Somos mais de 50% da população brasileira, mas o número de candidatos negros não chegam nem perto disso. Então … deixa eu te contar uma história! Eleger candidatos negros está sendo a garantia que as pautas pretas vão estar presentes no debate em diversos setores da nação. A comunidade negra necessita de espaços de visibilidade e estar presente nos espaços de poder e de decisão.

Sabemos que existem diversos fatores que indicam o motivo desse restrospecto negativo, começando por um dos maiores resquícios da escravidão no Brasil, que foi o empobrecimento do povo negro. Motivo pelo qual se faz necessário todo o estímulo, e ações afirmativas que abranjam candidaturas negras e de outras minorias sociais. Nossa realidade ainda foi de campanhas com orçamento insuficiente e falta de apoio sistemático dos partidos. Outra questão significativa é falta de visibilidade, onde o maior meio de acesso ao grande público foi reduzido, não sendo possível apresentar suas propostas com dignidade, o que nos colocou em condições de desigualdade na disputa eleitoral. Durante o processo eleitoral observamos que entre a teoria e a prática houve uma distância considerável.

E se essa disputa está complicada para os homens negros, a diferença ainda é maior quando se faz um recorte de mulheres negras. Moramos em um estado que, até o ano de 2022, nunca havia elegido deputadas negras. No último pleito tivemos a maior bancada da históra de deputados negros, sendo três mulheres, incluindo uma mulher da comunidade LGBTQIA +. Mesmo questionando o porquê de termos um pequeno grupo de candidatos eleitos, nossa reverência vai aos precursores negros nos meios políticos do Brasil: Carlos Santos, Antonieta de Barros e Nilo Peçanha. Nosso nobre Carlos Santos (1904-1989), sindicalista, em 1935 assumiu na Assembleia Legislativa do RS, o mandato como primeiro deputado negro e exerceu suas funções de 1935 a 1937. Antonieta de Barros (1901-1952), jornalista, foi a primeira parlamentar negra no Brasil. Nilo Peçanha (1867-1924), advogado, foi o primeiro presidente da república negro do Brasil, também foi deputado, governador e vice-presidente.

Mesmo sabendo que 2022 bate o recorde de candidaturas de autodeclarados negros, nossa ação como eleitor é eleger estes candidatos para que possamos ter o acesso devido. Esta eleição mostrou que iniciamos uma mudança no cenário político, a população está com o olhar mais crítico sobre o recorte de raça, gênero e orientação sexual. Foi a vitória da pretitude e daqueles que se declaram anti-racistas. O momento é de dialogar com candidatos que tenham propostas de pauta preta e tenham compromisso com a negritude.

Quebrar o mito da democracia racial na política partidária é a forma de sermos respeitados, vistos e lembrados. Meu voto foi preto, e espero em breve que Montenegro desponte no cenário político levando a pauta preta com a seriedade que merece. Asè!

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