Você sabe o que são as cotas raciais? Existem muitos assuntos que são básicos para se falar de negritude. Na minha perspectiva cotas para negros nem deveria ser o mais importante, mas provavelmente é o mais debatido, mais questionado e mais falado nas rodas de conversa. Um detalhe interessante é que a política de cotas é datada do início do século XVIII. Abrangeu todos os imigrantes que vieram para o Brasil, mas somente quando se tornou uma ação afirmativa para negros e povos indígenas, foi considera desnecessária aos olhos da população. E, se você não sabe, praticamente toda a população brasileira de origem europeia é cotista, recebeu incentivos e teve tranquilidade financeira para cuidar dos seus.
E mesmo todos sendo beneficiados ainda alguém vai perguntar: por que houve tanto debate quando esta política pública foi estendida aos afrodescentes e povos indígenas? Então… deixa eu te contar uma história! Primeiramente, cotas é uma das formas de diminuir o abismo social, um meio temporário de reparação histórica que é utilizado para alavancar o crescimento econômico.
No Rio Grande do Sul, temos exemplos muito promissores de imigrantes que vieram de outros países e receberam terras, implementos agrícolas, subsídios financeiros e proteção social para a sua permanência. Esses incentivos nada mais são que um programa de cotas bem estruturado e com efetivo resultado. Países considerados desenvolvidos, ao término da escravidão, indenizaram a população negra, ofereceram escolarização e as cotas foram largamente apoiadas pela branquitude, como forma de apoiar as demandas dos grupos minoritários. As cotas universitárias e de trabalho são uma modesta iniciativa do governo brasileiro de equipar todo o investimento feito em alguns grupos de origem etnocêntrica.
Eu chamo de modesto porque somente oferecer a vaga na universidade a uma comunidade empobrecida, em um espaço impregnado de racismo estrutural, elitista, e cobrar sucesso com esforço individual, é no mínimo uma afronta. Que oferecer vagas de trabalho em ambientes hostis em que a comunidade negra não terá perspectiva de crescimento é desumano. Acreditar em meritocracia, sabendo-se que, independente do meu currículo, o que vai contar em uma promoção é o formato do meu cabelo ou cor pele. E já que não terei direito há uma sesmaria, que sejam direcionados a projetos racializados incentivos financeiros. Que nos espaços esportivos, a criança negra seja prioridade educativa, a fim de protegê-la. Que nas escolas, definitivamente, não sejamos visto como descendentes de escravos, que tenhamos representatividade nas imagens, nos brinquedos, e que nossa história seja dignamente desenvolvida com propriedade. Que territórios pretos como a ACB Floresta Montenegrina sejam protegidos como patrimônio cultural da cidade, um guardião da história, cultura afro montenegrina e da região do vale do Caí. Que o lado negro de Montenegro seja reconhecido, seja visto nas campanhas institucionais da cidade, como forma de agradecimento a sua contribuição na constituição da nossa região.
E se passar pela cabeça de alguém que sou contra as cotas, quero deixar bem claro que apoio, que acho necessário, que defendo as cotas em todos os setores, mas vou exigir incansavelmente que tenhamos o mesmo suporte oferecido a todos os imigrantes ao longo da história. Da mesma forma que foi pensada uma política que desse conta das necessidades dos grupos étnicos vindos da Europa, seja oferecido a diáspora africana, comunidade negra e aos povos indígenas. E que aqueles que foram ao longo da história beneficiados com cotas, com incentivos, e hoje são modelos de sucesso, sejam solidários, tenham compromisso social, ampliem seu olhar para a necessidade de outros povos. Que se coloquem no seu lugar de parceiros de luta e não de “salvadores”, pois não precisamos. E lembre-se se você não é antirracista, você é racista. Asè!