“Quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”. (Angela Davis)
Toda vez que eu me apresentava, principalmente em locais fora da minha zona de conforto, pensava que “deveria haver um padrão’’, um jeito claro e objetivo das pessoas me conhecerem. Talvez através do meu currículo, da minha persona ou da minha descendência. O tempo me fez perceber que este não era o meu lugar, que essa ideia não me privilegiava e não traria o que “todos” chamam de reconhecimento. Por isso, há algum tempo, decidi que o importante não é o que todos querem ouvir, mas o que me faz bem falar, que toca aos corações e acalenta a nossa alma. Nesta coluna escreverei através da perspectiva de uma mulher negra, que muito cedo se fez perceber a necessidade de voar, de construir e de identificar o seu lugar de fala e, que além de se defender é importante defender os seus.
É necessário debater, dialogar e enfrentar esse problema social, político e estrutural, que é a invisibilidade real do povo negro. É necessário ressaltar que nós, mulheres negras, somos a maioria nos índices de feminicídio, violência sexual, obstétrica e doméstica. E, em contrapartida, a minoria em cargos profissionais valorizados, no acesso à educação superior e índices de riqueza, nos colocando na posição de elo mais fraco do sistema. Ainda somos esquecidas no “comercial de margarina’’, nos modelos de beleza e nos processos decisórios estatais e demais temas relevantes ao cotidiano, mas que não são acolhidos pela sociedade de maneira efetiva. O povo negro precisa de valorização, mas a mulher negra tem peculiaridades, necessitando de equidade, porque não estamos falando só do sexismo, estamos falando do preconceito racial e do folclore sobre o corpo e sexualidade, do nosso lugar no imaginário masculino, na deteriorização da renda per capita.
A intenção não é reproduzir os caminhos sociais que nos trouxeram até aqui, mesmo com esse histórico de adversidades, nosso objetivo é falar sobre protagonismo, sobre participação, sobre empoderamento e contar histórias negadas aos olhos. Poder documentar e dar subsídios para interromper esse processo de exclusão, reproduzido através dos anos. Almejamos que esta coluna seja um espaço de fala crítica. Afinal, problematizar a história é rever conceitos, estreitar laços, ser reflexivo. Quero transportar seu olhar para história afro-montenegrina, os temas atuais, acontecimentos globais, por uma outra lente, mais escurecida, mais retinta, mais aquilombada. E para quem acha que estamos longe disso, que é um tema distante e que Montenegro ou o Rio Grande do Sul não reproduzem esses mitos, está convidado a nos acompanhar neste novo projeto. Tenho ciência que o caminho é árduo e longo. Sigo na certeza que não devo mudar para caber nesse mundo, mas o mundo precisa me respeitar.