“Encontrei minhas origens na cor da minha pele, nos lanhos de minha alma, em mim, em minha gente escura, em meus heróis altivos, encontrei-as, enfim me encontrei’’. (Oliveira Silveira)
Foi na Capital gaúcha que ativistas do Grupo Palmares idealizaram, há 50 anos, o Dia da Consciência Negra. Na época não era chamado de Dia Nacional da Consciência Negra. Recebeu o nome somente sete anos depois, em uma assembleia do Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCRD), no estado do RJ. Dentro dos movimentos sociais é unanimidade que não concordamos com o 13 de maio, dia da Abolição da Escravatura, por não ser um marco de luta, não reconhecer direitos ou proporcionar reparação pelo período de escravidão, consagrando-se como o início de um doloroso período de tentativas de apagamento da participação do negro no Brasil. Consideramos que 20 de novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares, é a representação da resistência negra quanto a sua situação de escravidão. Remete à luta, ao protagonismo, à africanidade, às contribuições da história e cultura negra ou afro-brasileira.
Na concepção de Oliveira Silveira, o autor do 20 de novembro, fazia-se necessário resgatar a história, dialogar com a sociedade sobre as necessidades do povo negro, divulgar e apreciar a cultura negra. Este gaúcho, professor de português e francês, deixou um legado de poesias, livros e artigos publicados e, que com maestria, trouxe à cena nacional temas pertinentes até os dias de hoje. Para quem está se questionando o que Montenegro tem a ver com isso? Somos uma cidade de expoentes negros na região, inauguramos o projeto Kizomba em 1989, cunhado pelo Professora Maria Izabel da Silva, com o objetivo de apresentar aos educandos a História e cultura Afro-Brasileira. O grupo Consciência Negra de Montenegro, que completa 30 anos de fundação, onde seus fundadores Roberto dos Santos, Elizabete Gonçalves, Mariléia Vargas e Inês Santos, desenvolveram trabalhos de conscientização da pauta negra em espaços educativos, saúde e políticas de cotas. Temos um dos mais antigos Clubes Sociais Negros do Estado, a ACB Floresta Montenegrina, contamos com diversos grupos de pauta negra atuantes, formados por músicos, professores, advogados, secretários municipais, profissionais de saúde, empresários,mães,pais e cidadãos que acreditam que a representatividade importa sim. Recebemos reconhecimento da comunidade, doando o nome de Roberto dos Santos, homem negro a uma rua da cidade e temos uma escola batizada com o nome de uma mulher negra, a EMEF Ana Beatriz Lemos.
O Dia da Consciência Negra é sim para celebrarmos avanços, mas também para lembrar que a luta por igualdade continua, a escravidão ainda permanece, que nossa história além de ser reescrita por aqueles com papel de fala,merece ser respeitada. É momento de esclarecer que as reparações sociais, culturais e financeiras ainda não são uma realidade e as políticas de promoção da igualdade racial são frágeis e fortemente questionadas por aqueles que não tem dimensão do que é ser negro no contexto atual.Não estamos falando somente de ser “avaliado’’ pelo tom de pele, mas da dor de uma mãe de um menino negro que constante é alvo nas ruas, das mulheres negras invisibilizadas, dos homens negros que mesmo com todos os requisitos (formação acadêmica e experiência comprovada) “não são aptos’’. Quero esclarecer que o meu cabelo duro é uma opção que compete somente a mim, que minha beleza é legítima, e que independente do tom da minha pele, tenho o direito de autodeclarar-me negro sem medo de represálias.
Mas ainda alguém vai questionar por que ainda estão reclamando? Porque esta é uma luta diária, cansativa, desgastante, mas necessária, porque novembro não deveria ser o único momento de discutir negritude. Porque queria viver minha vida, sem ser cerceado dos meus direitos. Porque meu samba, minhas roupas coloridas, meu terreiro é uma herança ancestral valiosa. Vidas negras importam.