Joãozinho foi criado próximo da água. Acostumou-se na piscina, primeiro com apoio dos pais, depois com boias e, quando ficou um pouco maior, já tinha domínio da natação. Um peixinho. Nas férias, pegava “jacarés” na praia. Na chácara dos avós, cambalhotas, mergulhos, desafios de apneia no açude.
Um belo dia, pegaram o Joãozinho, colocaram num helicóptero e o jogaram no meio do oceano. Ele nada bem. Vai se virar.
Para muitas pessoas, essa é a relação com o mar de informação que é a internet. Temos fôlego e habilidade básica para o nado, mas… é o oceano sem fim. Aí em volta estão os cardumes de fake news, as verdades camufladas e ligeiras, as promessas predadoras, as versões com tentáculos, as narrativas abissais. Um mundo onde gigantes e microcriaturas deslizam nas mesmas correntes.
Tentamos focar, mas somos constantemente bombardeados pela rede maior, moldada por algoritmos ocultos, manipulada principalmente por aqueles que gritam mais alto. Para uma pessoa comum, a quantidade de informação extrapola em muito a quantidade de tempo que se tem para racionalizá-la. Ao não entender racionalmente o mar de dados, agarram-se a destroços de informação, boias de salvação. Flutuadores que atraem grupos criam o tribalismo desenfreado e cego. Aqueles que se recusam a usar apoios são punidos com o estado de confusão constante e desconcertante.
O filósofo americano Ken Wilber diz que todo mundo tem alguma parte importante da verdade. Isso se aplica às pessoas e às ideias. As declarações de um racista, por exemplo, revelam sua experiência emocional e equivocada relação com a realidade. Por mais desprezível que possa ser, é uma parte da verdade que vivenciamos em sociedade e que não pode ser ignorada.
Carl Gustav Jung dizia que nós não podemos mudar nada sem que primeiro aceitemos.
E se você pegar centenas de verdades diferentes e mergulhar um pouco mais fundo nelas, em vez de rejeitar cegamente o que ameaça seu apego? O próprio senso de si é um mosaico de experiências herdadas e inter-relacionadas, que coletivamente guiam a cultura global. Uma rede de verdades pode ser mais reveladora do que uma verdade reconfortante.
Antes da internet, quando comecei a mergulhar no conhecimento além da escola, me senti em um mar, perdido e confuso. Falamos das armadilhas das informações falsas mas não nos damos conta de que nossos cérebros também são repletos de arapucas preconceituosas, ideológicas e pré fabricadas.
A internet é jovem, está aprendendo a se organizar. A habilidade mais importante do século é a capacidade de refinar racionalmente o aparato da mente que faz sentido, em vez de seguir cegamente os filtros e preconceitos. Questionar ideias que nos fazem sentir emocionalmente seguros e perguntar por que essas informações podem ser certas ou erradas do ponto de vista de outra pessoa. Esqueça a piscina, bem vindo ao mar.