Na semana passada, a rede de lojas Magazine Luiza abriu uma seleção “diferente” para o programa de treinamento 2021. Anunciou que, neste processo, serão admitidas apenas pessoas negras. Logo, os tribunais da internet começaram a publicar as suas sentenças. “Racismo às avessas”, criticaram alguns. “Se fosse o contrário, o mundo viria abaixo”, atacaram outros. “É puro marketing”, concluíram mais alguns.
Para analisar a situação, é preciso partir de alguns pressupostos. O primeiro deles: existe racismo no Brasil e negar este fato é demonstrar uma total alienação em relação ao mundo que nos cerca. Segundo: embora não restrinjam as seleções aos caucasianos, muitas empresas, de fato, dão menos oportunidades aos negros. Quando confrontadas, alegam vagamente que o candidato não se “encaixou” no perfil desejado.
As estatísticas mostram que a população negra tem menos acesso a boas escolas e oportunidades de formação profissional, dificultando sua inserção no mercado de trabalho em pé de igualdade com os brancos. As políticas de cotas adotadas nas últimas décadas, tanto no ensino quanto no preenchimento de cargos públicos, por exemplo, ainda vão levar muito tempo para corrigir essa desigualdade. Os negros são poucos nas faculdades mais disputadas, nos cargos de gerência das empresas, nos parlamentos e nos governos. Se não existe racismo, como muitos teimam em dizer, por que, em quase 150 anos de história, Montenegro nunca teve um prefeito negro, ou pelo menos um vereador?
Ninguém é totalmente tolo de imaginar que o Magazine Luiza não está aproveitando a situação para fazer marketing. De qualquer forma, se em uma de suas muitas seleções a empresa decidiu dar uma oportunidade maior aos negros, talvez esteja apenas corrigindo um erro do passado. E se for um “mea culpa”, que mal há nisso? Antes tarde do que nunca.
Quando defendemos ideiais como igualdade e fraternidade, é preciso ter em mente o que eles realmente significam. Uma disputa só é justa quando todos partem do mesmo princípio. Exercitar a fraternidade é reconhecer que alguns precisam de mais apoio do que os outros porque não tiveram os mesmos meios, a mesma sorte. Ao invés de condenar as seleções “diferenciadas”, precisamos trabalhar para que elas não sejam mais necessárias.