A pergunta pode parecer uma provocação ou uma idiotice . Penso não ser uma coisa nem outra.
Muito se tem falado, e muito se tem esperado por uma vacina nestes últimos e difíceis tempos. Muitos têm emitido suas opiniões e dado seus palpites, contra ou a favor, não importando se com muito conhecimento sobre o assunto, ou conhecimento nenhum. Em meu primeiro ano de formado, em 1968, em Jaquirana, distrito de São Francisco de Paula , enfrentei um pequeno surto de varíola. Se a memória não me trai, o lugarejo em que os casos ocorreram chamava-se Faxinal dos Pelúcios. Uma missão da Secretaria Estadual da Saúde foi até o lugar estudar e confirmar os casos.
A varíola, há muitos anos, é uma doença erradicada do mundo. Que marcou com cicatrizes muita gente, e que matou outros tantos. Anos seguintes, em Brochier, atendi muitos pacientes com outras doenças que também quase desapareceram. Tétano, sarampo, varicela, rubéola, difteria, caxumba, coqueluche, etc…. eram doenças de frequente ocorrência. O que fez com que em apenas poucas décadas quase todas se tornassem raras ou quase desaparecessem? Por uma razão muito simples e única: AS VACINAS.
A descoberta da vacina deve-se ao médico inglês Edward Jenner, que em 1798 observou que ordenhadores contaminados pela Cow pox, uma espécie de varíola animal, ficavam imunes à varíola humana.
Vacinas e antibióticos: talvez as maiores conquistas da medicina em todos os tempos.
Apesar disto, as vacinas nunca foram uma unanimidade. Não foram e ainda não são. Por que será? Entre nós ficou famosa a Revolta da Vacina, em 1904, no Rio de Janeiro, causada pela insatisfação popular em razão de uma campanha de vacinação obrigatória contra a varíola, conduzida pelo sanitarista Osvaldo Cruz.
Em 2019, antes portanto da atual pandemia de Covid-19 , a Organização Mundial da Saúde declarou que os movimentos antivacina eram uma das grandes ameaças mundiais à saúde. E não é coisa de países atrasados do terceiro mundo, mas da velha e culta Europa. Os motivos? Vários. Dúvidas quanto à eficácia e segurança, teorias de conspiração, dos que veem nas vacinas um método de controle populacional por parte de governos, e até mesmo publicações de cientistas mal intencionados, divulgando informações falsas para sua auto-promoção. E talvez, muito importante, uma discussão sobre a liberdade individual e o alegado direito de decidir sobre a própria vida.
Qualquer que seja o motivo, os resultados já estão se mostrando e são perniciosos. Entre eles, a volta de doenças já quase extintas, como o sarampo e outras.
Estivéssemos a falar de vacina anti-tetânica, acho que não precisaríamos nem perder tempo com a discussão. Se alguém tiver como sonho de consumo morrer de tétano, só nos cabe desejar, que, mesmo com sofrimento, morra feliz. Não levará ninguém junto consigo.
Mas quando se trata de doenças altamente transmissíveis, por mecanismos pouco controláveis, que podem atingir quem tenha amor a vida e nenhuma ideação suicida, o assunto é bem diferente. Nestes casos, a proteção é individual, mas também coletiva.
É um grande dilema ético e jurídico. Tenho o direito de, ao não querer me proteger, por em risco a vida dos outros?
Menos mal que grande parte das pessoas entre nós esteja favorável à vacinação. Compensa em parte um injustificável atraso governamental inicial em adquirir vacinas, e as reiteradas manifestações de descrença e deboche, por parte de quem deveria ser o grande incentivador deste recurso, que o mundo inteiro necessita.
Um grande abraço.