Quando os filhos saem de casa

Devo começar por um lugar comum, por um dito que todos já ouvimos muitas vezes e pronunciamos outras tantas “Os filhos não nos pertencem. Foram feitos para o mundo.” Bonita frase. Plena de despreendimento e compreensão de mundo, de alguém com mente aberta, bem aberta. Mas será que na hora da verdade, todos a vivenciam com serenidade, sem aperto no peito ou vazio no coração?

Há situações na vida, sobre as quais nossas opiniões só valem de fato quando as experimentamos ou vivemos. Falar sobre um assunto pode ser até fácil. Viver, nem sempre.

E a experiência da saída de casa, já a vivi pelos dois lados: ao sair, muito cedo, para estudar, com 12 anos. E, quando mais tarde meus filhos também fizeram o mesmo, embora com mais idade.

Para continuar minha argumentação, busco um exemplo na natureza. As águias são animais belíssimos e majestosos, planando nas alturas ou se precipitando em voos certeiros na busca da presa. Constroem seus ninhos em escarpas rochosas de grande altitude e a salvo de predadores. Seus filhotes em pouco tempo abrem os olhos e substituem a penugem que os cobre por penas. Vão ganhando tamanho, força e envergadura. E ensaiam movimentos com as asas, mas sem arriscar a segurança do ninho. Mas chega um momento definitivo, em que os filhotes já crescidos, estão prontos. Para enfrentar o grande e definitivo momento. E a mãe-águia identifica este momento. Tem taquicardia? A adrenalina sobe? E o que faz? Enche-se de coragem e empurra o filhote para fora do ninho. É o melhor presente que pode dar a ele. Ao serem precipitados no abismo, descobrirão suas próprias asas, e o privilégio de serem águias.

É uma imagem forte e poética. E com os humanos, como será? De fato, ao criarmos nossos filhos, os estamos preparando para seu grande voo solo? Para serem independentes e livres? Para viverem sem a tutela dos país?

Não sou nenhum insensível ou desalmado, que acha que tanto faz a companhia dos filhos ou não. Tê-los tão perto que um churrasco aos domingos possa com frequência ser possível é um privilégio, é o padrão-ouro. Mas maior privilégio ainda é sentir que os filhos estão bem. E o pior de tudo é sentir ou saber que estão mal. Bem ou mal pode ter a ver com sua situação financeira. Mas nem de longe deve ser o mais importante. Outros valores, intangíveis, também pesam, e muito. Realização pessoal, profissional ou amorosa. Relações, amizades, conceito pessoal e profissional, saúde física e emocional, paz e equilíbrio com o mundo. Felicidade, enfim. Isto, para mim, diz muito. Ou quase tudo. Por isto, aceitar que os filhos sigam seus caminhos, sem querer que sejam uma cópia melhorada nossa, é um ato de amor e respeito.

Os filhos devem ser e estar preparados para sairem de casa. Mas e os pais, também se preparam? Aceitam a situação? Sofrem demais? Pensam lá no fundo que os filhos são uns ingratos ou egoístas, que só pensam em si? E por isto vão embora?

Tenho que recorrer mais uma vez às aves, para usar a conhecida expressão da “Síndrome do Ninho Vazio”. Sentir a saída é normal. Ter saudade também. Mas vivenciar como um luto, não. Nos cabe preencher nossas vidas com outras coisas que também nos realizem e deem sentido. Para que os nossos filhos não tenham que experimentar sentimentos de culpa, onde culpa não existe.

E estarmos dispostos a acolhê-los de volta, se um dia assim precisarem. Terão sempre o seu ninho.

E usar a maravilha da tecnologia moderna, que aproxima vozes e imagens, que anula distâncias, e principalmente, aproxima corações que nunca estiveram separados.

Grande abraço.

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