Muito… prazer!

Nos tempos de antigamente, as drogas não tinham todo este tom pejorativo que os tempos modernos lhes dão. Não sem razão, é claro. A medicina tem nos provado dia a dia que a busca do prazer desenfreado, da alienação química, da loucura que não seja de cara, só nos têm abreviado a vida, apesar de uma aparente e fugaz intensidade.

Olhando para trás, nunca nos bastaram os prazeres naturais que o cérebro produz, como serotonina e dopamina. É pouco! Queremos mais. E sempre quereremos.

Em “O cemitério de Praga”, de Umberto Eco, nos deparamos com este reclame oitocentista que ilustra esta crônica. Um chumaço de algodão com cocaína e lá se foi a dor de dente. O próprio Freud a usava, na boa.

A escritora sueca Karin Bojs publicou em seu livro “Min Europeiska Familj” – Minha Família Europeia – conforme reportagem do El País, que os humanos inventaram a agricultura para fazer cerveja. Foi, realmente, uma bela ideia essa, da humanidade agricultar para beber e não para comer.

É de se duvidar um pouco. Acho que primeiro se plantou para comer. Daí, no decurso do processo, alguém descobriu que dava pra fazer uma ceva do troço. Bom, aí… Daí ela fala que povos antigos faziam viagens enormes para celebrações. Diz não crer que se viajasse tão longe há sete, dez mil anos atrás, para comer purê. Viajavam longas distâncias para beber cerveja. E muitos povos teriam se tornado agricultores para poderem produzir a bebida, já que só caçando não lhes daria o barato que dá a ceva.

Sei lá, se todos estes teóricos estão certos ou não.Mas que a conversa deles faz sentido, lá isso faz. Quem não quer dar uma saidinha da realidade? Quem não gostaria de uma vida onde se pudesse ter prazer cem por cento do tempo?

E nem vamos falar das bebidas ungidas pelos deuses: o vinho dos padres, o santo daime, os alucinógenos das diversas culturas que fizeram mais um transe dos sacerdotes do que uma solução para os problemas dos fiéis.
Estas questões de vícios em busca de prazer são das coisas mais complexas do ser humano. Qual bêbado, cheirador, crackento, noveleiro da Globo, whatsappepeiro vai questionar ou condenar, por exemplo, o ator americano Terry Crews sobre seu vício em pornografia, como ele próprio revela na internet, o confessionário da modernidade? Vícios são como lendas. Todos as temos.

O jornalista alemão Norman Ohler, em seu livro “Drogas na Alemanha nazista”, conta como Hitler drogava seus soldados com metanfetaminas como o Perventin para eliminar o medo, o cansaço e fazer com que os militares lutassem mais e melhor. A Polônia e a França caíram graças a estes “soldados universais” à base de drogas.
O prazer move o mundo. Seja ele natural ou artificial. Seja pacífico ou brutalizado.Se é para morrer numa guerra ou para matar, melhor que seja drogado. É o mesmo que acontece em nossa guerra urbana de hoje em dia.

A busca por prazer e delírio existe desde que o mundo é mundo. Todos, vez que outra, saíram ou vão sair da realidade. Cada um tem a sua e muitos não gostam dela. No mais das vezes, é uma simples escapadela e sempre voltamos. Mas para alguns é um monstro que mora em nossas sombras, em nossos becos escuros. E seguidamente sai de navalha na mão a sangrar o que temos de melhor. Nos tempos de guerra, o prazer é convocado para matar. Nos tempos de paz, a gente só flerta com ele para encher a vida de gozo.
É saber escolher.

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