Até acho – e só acho – que amor de pai não é a mesma coisa que amor de mãe. Amor de mãe é aquilo: conforto, alimento, compreensão com os erros, sonho de vida boa para o filho, parceria para sempre. Amor de pai…
Como conta Kafka, cuja opressão paterna lhe sufocava, “o homem que de maneira tão grandiosa era a medida de todas as coisas, não atendia ele mesmo aos mandamentos que me impunha”. Mas, mesmo oprimido, transformou-se num gênio. Ou se transformou num porque o pai foi rude?
Há quem afirme que uma presença masculina disciplinadora educa. Mas um pai opressor educa? Vá saber.
Já o monstro argentino da Literatura Jorge Luís Borges teve um pai presente. Mostrou ao filho o que era uma biblioteca, tinha uma em casa que contava o mundo, introduziu-o em duas línguas ao mesmo tempo, inglês e espanhol; jogava xadrez com o filho, discutiam filosofia. Fez seu amor demonstrar-se pela cultura. Deu no que deu.
Leopold Mozart, pai do menino prodígio Amadeus, levou o filho desde os 5 anos para a Europa inteira ver o gênio que gerara. É certo que o menino não teve infância, nem adolescência. Mas vá que nem quisesse ter. Mas seu pai decidiu que não teria. Era música pra príncipe, música pro clero, música, música, música. Ufa… Era música. Se o menino perdeu, eu não sei. A humanidade, sei que ganhou. E o velho Leopold também, um dinheiro bem legal.
O pai de Mozart, como o de Kafka, pensavam primeiro em dinheiro. Depois o depois. Leopold também era músico, mas não chegava aos pés da sandália número 28 que o filho calçava.
Não é fácil ser pai de filho talentoso. Mas tampouco o contrário. A sombra de pais talentosos pode sufocar vontades e qualidades de muitos filhos. A maioria sucumbe na sombra paterna. Exceções como Luís Fernando Veríssimo, os filhos de Dorival Caymmi, talvez. No mais das vezes, não sobra, geneticamente, talento para distribuir. É só olhar para o filho de Pelé.
De qualquer forma, sempre tem quem vira o jogo, quem dá a volta por cima.
Enfim, o pai é aquele que joga duro. Aquele que se puxa desde o homem das cavernas para dar aos filhos o caminho da sobrevivência. Aquele que precisa preparar guerreiros. Eram outros tempos. Não é preciso mais ser assim. Mas perder um cacoete de cem mil anos não é fácil.
Hoje não deveríamos mais precisar deste tipo de educação. E talvez dar amor a uma criança seja também dar-lhe condições de enfrentar um mundo cruel. Ninguém mais sabe direito como agir. Não sei se o tapeio quando ele erra ou se o compreendo, sorrio e digo: vamos tentar de novo? E nem sempre um filho está errado quando se acha que está.
O Estado não cumpre mais suas regras básicas de educação, segurança, justiça e saúde. Mas o pai tem que ser cumpridor. Todo pai sempre tem que saber o que fazer. Só que não sabem. Sem contar os milhares que sequer têm pai na certidão de nascimento.
Lembrei-me agora de Edgar Alan Poe, escritor americano de histórias de terror e policiais que influenciou gerações de outras pessoas geniais. Ao fim da vida, escreveu “Eureka”, um livro que antecipou várias teorias modernas da ciência em pleno século XIX, como o Big Bang, entre outras. Poe foi um cara pra baixo. Sua mãe morreu e o pai o abandonou. Não teve parâmetros de pai bom ou pai mau. Era um bêbado, como muitos de nós. E fez um mundo.
Por fim, sabe-se lá o que seja isto: amor de pai.Para uns, muito importante. Para outros, sabe-se lá.