Universo Atípico: a dança para o desenvolvimento de autistas

Após sair do papel em 2021, o projeto Universo Atípico, agora consolidado, tem uma missão digna de muita admiração: incluir as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no mundo da dança, a fim de desenvolver seu quadro. A idealizadora do projeto é Bianca Leitão, diretora do Stúdio Balance, de Montenegro, após sua vivência pessoal. Com apenas um ano de idade, seu filho foi diagnosticado com TEA. Bianca conta que desde então, passados mais de três anos, uma longa jornada de estudos iniciou, para que conseguisse cada vez mais desenvolver atividades com o filho. “Notei que muitas das ações que eu fazia com ele tinham a ver com minha área de atuação profissional, a dança. Sempre usei muito a parte corporal com ele, e após ver quantos benefícios isso estava trazendo e o quanto ele estava evoluindo, eu percebi que tinha como ajudar através do meu trabalho no Balance”, conta.

A partir daí, Bibi, como é carinhosamente chamada pelos alunos, organizou um grupo de estudos semanal com os professores e alunos de longa data do Balance, que funcionava com ajuda de diversos profissionais. “Comecei a enxergar a vida de uma maneira diferente e ver que a arte pode transformar a vida destas pessoas com autismo e fazer a diferença”, afirma. “Depois que começamos a estudar, a gente viu o quanto tinha que aprender todos os dias, e estes alunos e o meu filho nos dão oportunidade de viver essa experiência única dentro do universo atípico”, ressalta. “Eles nos ensinam muito mais do que nós a eles, é um aprendizado diário não só para profissionais, mas para a nossa vida e a vida dos alunos típicos também, que acolheram tão bem o projeto.” Em maio de 2021, as aulas práticas iniciaram.

Ação no Dia Mundial da Conscientização do Autismo. Foto: divulgação

Douglas Eduardo Araújo da Costa trabalha com monitoria inclusiva no Balance, desde a criação do projeto, e também na Emef José Pedro Steigleder. Ele explica que após contato da família interessada, é realizada uma entrevista geral para saber as particularidades do novo aluno. Este passo é fundamental para que os professores e monitores saibam como trabalhar com cada criança ou adolescente. Em seguida, o aluno faz uma aula experimental para ver como se desenvolve. O monitor pontua que o trabalho é gratificante. “Nem sempre, nas aulas, os alunos dão um retorno imediato, mas depois percebemos pelos relatos da família que eles estão fazendo em casa o que aprenderam em aula”, destaca.

“É sobre ver o mundo com um olhar diferente”
Bibi afirma que, mesmo tendo o mesmo diagnóstico, os alunos são completamente diferentes, consequentemente, a abordagem na aula é diferente para cada um. “Por isso temos vários monitores e alunos para nos auxiliar, já que são trabalhos, muitas vezes individuais dentro de uma mesma sala”, explica. São nove pessoas entre professores e monitores envolvidos no projeto. Segundo Bibi, os desafios são muitos, mas as evoluções a emocionam dia a dia.

Ela ressalta que a atenção em aula é ponto chave. “A grande maioria destas pessoas não se comunica de forma verbal, muitas vezes a forma de comunicação delas é corporal. Por isso, temos que estar sempre atentos, observar muito cada aluno para poder estabelecer esta comunicação”. Para ela, o trabalho não é apenas profissional. “Envolve dedicação, respeito e muito amor. A troca com as crianças e as famílias é muito valiosa. É sobre ver o mundo com um olhar diferente”, conclui.

Sob o olhar da psicóloga
A psicóloga montenegrina Jéssica Milk Bülow, pós-graduada em psicologia infantil e desenvolvimento infantil, é voluntária na associação Ser Autista. Ela aponta notar que a falta de inclusão é o maior desafio das famílias com autistas. “Ainda falta muita capacitação de profissionais para atuar com as crianças. Acaba que a falta de manejo e olhar prejudica seu desenvolvimento em todos os aspectos”, diz. Jéssica conhece o projeto Universo Atípico e reitera que a dança é uma forma de expressão que traz possibilidades de um olhar ao outro, interação e comunicação. “A dança tem uma comunicação não verbal que facilita a conexão com o outro, espaço de empatia, confiança e movimento”, salienta.

Psicóloga montenegrina Jéssica Milk Bülow. Foto: arquivo pessoal

Como as pessoas com TEA têm ausência da fala em grandes casos, Jéssica destaca que a dança auxilia no estímulo a interação da sensação e percepção, melhorando no desenvolvimento psicomotor, processos de socialização e, principalmente interconexão de áreas responsáveis pela associação do movimento. “Este projeto é muito enriquecedor, pois faz o trabalho com muita propriedade, espaço integrativo e interativo de inclusão, deixando as crianças livres para expressar seu movimento, com auxílio de ações para reforçar os movimentos”, elogia.

O projeto tem grande envolvimento das famílias dos alunos nos processos, o que Jéssica pontua fundamental para a construção de princípios dos pequenos. Ela afirma que após o diagnóstico algumas rupturas nas relações já estabelecidas e as atividades dos pais tendem a sofrer alterações, o que pode causar uma desestabilização emocional. “Reforço o olhar para a família, porque são elas que estão fazendo o movimento de cuidado, estímulo e busca pela melhora do quadro clínico da criança. A família é essencial em âmbito clínico, social e cognitivo”, aponta. “Enquanto tiver amor, cuidado, respeito, acolhimento e empatia existe possibilidade de melhora não somente da criança, mas da família como um todo”, conclui.

Com ajuda de parcerias, projeto é gratuito
Um ponto fundamental do projeto é a gratuidade, ou seja, os alunos com autismo não pagam mensalidade. “Sabemos que as famílias têm gastos enormes e correm muito atrás para conseguir estimular e ver a evolução dos seus filhos”, argumenta Bibi. Por isso, o projeto funciona totalmente com o investimento de parcerias e pessoas parceiras da ação. Assim, o Universo Atípico está sempre de portas abertas para novas parcerias. “A gente busca nomes para abraçar este universo e fazer a diferença. O apoio financeiro da comunidade é essencial para que a gente consiga continuar nosso trabalho”, aponta.

Atualmente com mais de 30 alunos autistas, entre crianças e adolescentes, o projeto também está aberto para adultos. Além disso, tem uma extensa fila de espera. “A gente está tentando dar conta da demanda com pressa, porque queremos que todo mundo faça parte dessa energia e vibração e consiga construir um trabalho diferente, onde todos os alunos tenham empatia e um olhar sensível”, destaca Bianca. Daí vem a importância das parcerias: para que o projeto consiga atender cada vez mais pessoas com autismo. Interessados em ajudar de alguma forma podem entrar em contato direto com a Bibi, através do número (51) 9 9607-4264; ou com o Balance, pelo (51) 9 9179-7988

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