(Re)orientação sexual. Sentença de juiz a favor do tratamento tem causado fortes reações entre ativistas LGBTT
Uma polêmica que surgiu há algumas semanas nas redes sociais tem despertado grande desconforto no público-alvo. Agora, os psicólogos que atenderem pacientes com dúvidas sobre a própria sexualidade e que estiverem sendo vítimas de homofobia podem recorrer ao tratamento de (re)orientação sexual, caso assim desejem. Contudo, a sentença, de autoria do juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, tem sido interpretada de formas diferentes por muitas pessoas. A maioria acredita e repercute a ideia de que o profissional da Psicologia deve fazer a reversão sexual sob qualquer circunstância.
Na intenção de esclarecer os boatos criados em cima da decisão, o juiz declarou que o intuito do texto foi permitir que psicólogos façam tratamentos com os pacientes que apresentam indícios de homossexualidade e que procuram ajuda, sem que sejam punidos pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP). O Conselho coíbe esse tipo de auxílio desde 1999. “Em nenhum momento, este magistrado considerou ser a homossexualidade uma doença ou qualquer tipo de transtorno psíquico passível de tratamento”, disse o juiz, para quem a “interpretação e a propagação” de sua decisão foram equivocadas.
A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1990, definiu que a homossexualidade não é considerada patologia e, sim, opção individual. Isso é o que explica a psicóloga Cibele Bonapace. “Terapia de reversão sexual representa uma violação dos Direitos Humanos, conforme a CFP. Ela não tem nenhum embasamento científico”, afirma.
Segundo a profissional, por se tratar de uma escolha individual de cada ser humano, o psicólogo não tem o poder de curar gays ou lésbicas e, se oferecer esse trabalho, estará sendo preconceituoso e confirmando toda a discriminação que a sociedade impõe. “O nosso objetivo é ajudar as pessoas a reverter sofrimentos e, em função do preconceito, a gente auxilia os homossexuais. Mas somente nesses casos”, reforça.
Ativistas do movimento LGBTT não aprovam a decisão
Segundo o estudante Ezequiel Souza, a reversão sexual é uma proposta que nasceu equivocada. “Esse assunto, desde os anos 1990, estamos superando. Não usamos mais a palavra homossexualismo, como o sufixo ismo, que caracteriza doença. Tratamos hoje das pessoas que gostam do mesmo sexo como homossexualidade. E eu ainda prefiro me referir ao gênero como homoafetividade”, explica.
A retomada desse debate, segundo o ativista do movimento Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBTT), é mais uma explosão do conservadorismo, que tem princípios fundamentalistas e pretende enquadrar as pessoas e estabelecer regras de convívio com o próximo. “O que realmente precisa de tratamento é o preconceito, pois este é prejudicial, ataca, agride e mata”, completa.
Conforme a transgênero Paula Kerber, essa decisão do juiz Waldemar Carvalho é uma “loucura”. “É uma doença homofóbica de preconceituosos que reabriram o debate”, defende. Desde criança, Paula tinha atitudes de menina: brincava de bonecas e colocava roupas de sua mãe. “Nunca gostei de futebol e de tirar a camisa, por exemplo”, confessa.
“Eu sempre digo que se eu soubesse que iria passar por uma fase de tanta discriminação, eu não teria escolhido ser trans. Aliás, eu não escolhi, eu nasci mulher no corpo de um homem”, relata Paula. Para ela, é inútil colocar o psicólogo para trabalhar a opção sexual porque isso cresce com a pessoa. “Quem inventou isso é que é doente e precisa de mais amor e aceitação”, frisa. “O amor não é doença, é a cura.”
Interpretação diferente
Para a técnica em Enfermagem Camila Carolina de Oliveira, qualquer ser humano, em algum momento de sua vida, pode entrar em conflito de identidade. “E ele pode se tratar com psicólogos para tentar se entender. Foi isto que o juiz permitiu. Nunca houve a intenção de curar um homossexual e, sim, de dar a assistência que esta pessoa tem direito”, opina.