As forças de segurança da Venezuela praticaram “maus-tratos” e “torturaram”, de forma “generalizada e sistemática”, pelo menos 5 mil manifestantes e detidos, denunciou a Organização das Nações Unidas (ONU), nesta terça-feira (8).
O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos apresentou um relatório preliminar sobre a situação na Venezuela, a partir de 135 entrevistas com testemunhas realizadas à distância – a partir da Suíça e do Panamá – diante da recusa do Governo venezuelano em acesso ao país.
As partir das entrevistas, as primeiras feitas à distância pela ONU, fica evidente que desde que começou a onda de protestos, em abril, a Venezuela aplicou um “padrão claro” de uso excessivo de força contra os manifestantes da oposição. O documento cita a Guarda Nacional Bolivariana, a Polícia Nacional e as polícias locais.
“Milhares de pessoas foram detidas arbitrariamente, muitas delas foram vítimas de maus tratos e inclusive de torturas. E não há indícios de que essa atuação vá acabar”, denunciou em um comunicado o comissário para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein.
“A responsabilidade das violações de direitos humanos que estamos registrando se referem aos mais altos níveis do governo”, disse Al Hussein.
Violência
Os entrevistados foram vítimas, doutores, advogados, jornalistas e paramédicos relataram como as forças de segurança dispararam, sem aviso prévio, gases de efeito lacrimogêneo contra os manifestantes.
Várias pessoas entrevistadas afirmaram que cartuchos de gás lacrimogêneo foram disparados a curta distância e que a polícia usou como munição bolas de gude, porcas e parafusos.
Segundo as fontes, as forças de segurança também recorreram ao uso de força letal contra os manifestantes. Um total de 124 pessoas morreram nesta onda de protestos, 73 delas pelas mãos das forças de segurança ou de grupos afins.
“Segundo a análise da equipe de investigadores, as forças de segurança são responsáveis por pelo menos 46 dessas mortes, enquanto os grupos armados pró-governamentais, denominados ‘coletivos’, seriam responsáveis por outras 27 mortes”, especificou a porta-voz do Escritório do Alto Comissariado, Ravina Shamdasani, ao apresentar o relatório em uma coletiva de imprensa. Consultada sobre as demais mortes, ela respondeu que “ainda não está claro” o que houve.
Shamdasani admitiu que alguns manifestantes também atuaram de forma violenta, “mas isto não justifica de forma alguma a repressão generalizada e sistemática feita pelas forças de segurança”. Além dos mortos, foram contabilizados 2 mil feridos.
A repressão também resultou em pelo menos 5 mil detenções arbitrárias. “Em vários casos investigados há indícios verossímeis de que as forças de segurança realizaram tratos cruéis e que, em algumas ocasiões, recorreram à tortura”, especifica o texto.
Procuradora
Esses abusos ocorrem “em plena ruptura do Estado de Direito na Venezuela, com ataques constantes do Governo à Assembleia Nacional e ao Escritório da Procuradoria-Geral”, disse Zeid, que denunciou a destituição de Luisa Ortega e pediu medidas de proteção para a ex-procuradora.
O comissariado pediu às autoridades venezuelanas que ponham fim, imediatamente, ao uso excessiva da força contra os manifestantes, que parem com as detenções arbitrárias e que libertem todas as pessoas detidas ilegalmente.
Além disso, pediu que seja suspenso o uso de tribunais militares para julgar os civis.