Os recentes ataques têm gerado comoção nas redes sociais e até polêmica nos grupos de debates de Montenegro
Do dia 18 de fevereiro para cá, mais de 580 pessoas foram mortas na guerra da Síria. As tristes imagens do ocorrido rapidamente circularam pelas redes sociais e foram compartilhadas, inclusive, por muitos montenegrinos. Acabou que, localmente, iniciou-se uma polêmica. Enquanto algum demonstravam sua solidariedade com o povo em sofrimento, outros questionavam a validade do movimento diante do que acontece no Brasil.
A Guerra na Síria começou em março de 2011 e se estende até hoje. É fato que, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre 2011 e 2015, foram registradas mais mortes violentas em terras brasileiras do que no país em guerra no mesmo período. Existem, ainda, outros conflitos pelo mundo. Os dados, no entanto, não invalidam o sentimento solidário com um povo que, mesmo a quase 12 mil quilômetros, também sofre. E existem, sim, formas das pessoas daqui ajudarem as que vivem lá.
O montenegrino Samuel Gonzaga conheceu um sírio enquanto fazia intercâmbio em Portugal. Ahmad era seu nome. O rapaz falava pouco na guerra. Tinha a mãe, o pai e a irmã no país em conflito, mas decidiu não voltar. Seguindo os passos do irmão, ele está em Portugal desde 2015. “Ninguém quer voltar para a Síria”, lembra Samuel, repetindo as palavras de Ahmad. O estudante montenegrino passou três meses com o estrangeiro, dividindo a mesma residência estudantil. Sobre a guerra, apenas uma breve história foi partilhada.
“Ele contou que estava na rua, com os amigos. Daí um deles disse que ia embora, deu tchau e foi. Depois, o Ahmad chegou em casa e ficou sabendo que aquele amigo morreu voltando pra casa”, recorda. “Aquilo me marcou. A pessoa está ali, contigo, vai tentar ir pra casa e acaba morrendo em um bombardeio com mais 300 pessoas. Este que é o contexto da guerra.”
Samuel acompanhou as discussões nas redes sociais locais. Ele pondera que não se pode diminuir o que acontece na Síria, nem perder o senso de realidade do que ocorre no Brasil. Ao ver comentários como o de pessoas sugerindo que os traficantes, por aqui, precisam ser todos mortos, ele lembra que a intensificação do conflito sírio deu-se quando começaram a matar os rebeldes. “O que eu não gosto é destas conversas desconexas”, opina. “Eu conheci um sírio e a gente via nele, no semblante e na maneira de ele não falar muito sobre, que aquilo marcava.”
Como alguém daqui pode ajudar a Síria?
Existem alguns grupos e entidades que realizam ações diretas no país em conflito. Confira alguns deles e saiba no que você pode ajudar:
UNICEF – O Fundo das Nações Unidas (Unicef, em inglês), mantém uma campanha constante para recolher doações destinadas aos sírios. Segundo a organização, o dinheiro doado é voltado para vacinação, construção de abrigos e compra de alimentos, cobertores e kits de material escolar. A doação pode ser feita pelo site secure.unicef.org.br;
ACNUR – A agência de refugiados da ONU está promovendo campanhas específicas para arrecadar verba para famílias que estão na Síria. Com uma equipe de 635 pessoas atuando na região, a agência provê itens emergenciais, como cobertores, roupas e colchões, além de contribuir na reconstrução de escolas e desenvolver programas de educação. É possível doar pelo site doar.acnur.org;
INTERNATIONAL RESCUE – A ONG International Rescue Committee começou a trabalhar na Síria em 2012, dando suporte a cinco clínicas que oferecem serviços básicos de saúde na região e também atendendo a pacientes com traumas. Em seis anos, o grupo já ajudou a cerca de um milhão de pessoas, em sua maioria crianças. Doações são realizadas pelo site rescue.org/country/syria;
FONTE: BBC
Afinal, que guerra é essa?
Em 2011, antes dos conflitos, muitos sírios se queixavam de um alto nível de desemprego, corrupção em larga escala, falta de liberdade política e repressão pelo governo Bashar Al-Assad, que havia sucedido o pai. Com este sentimento, alguns adolescentes pintaram mensagens revolucionárias em um muro de escola no sul do país. Acabaram presos e torturados pelas forças de segurança.
O fato – também inspirado pela Primavera Árabe – provocou protestos por mais liberdades no país. As forças sírias, por sua vez, combateram as manifestações abrindo fogo contra estes ativistas e matando vários. As tensões se intensificaram e milhares de pessoas foram às ruas pedindo a saída de Assad. E, cada vez mais, a resposta do regime aumentava o uso de violência.
Quando simpatizantes do grupo anti-governo também pegaram em armas para se defender e, após, expulsar as forças de segurança de suas regiões, o conflito se intensificou. Os grupos rebeldes reuniram-se em centenas de brigadas para combater o regime e conquistar território. Em 2012, os enfrentamentos chegaram à capital Damasco e à segunda maior cidade do país, Aleppo.
A disputa foi adquirindo contornos de guerra sectária, com a maioria sunita do país contra os xiitas alauítas – braço islâmico a que pertence o presidente. Isso arrastou potências regionais e internacionais para o conflito, conferindo-lhe outra dimensão. Os rebeldes acabaram mudando, sendo superados por grupos radicais e jihadistas – entre eles, o Estado Islâmico – e a presença de outros combatentes criou uma verdadeira “guerra dentro da guerra”. No meio disso tudo, o povo foi sofrendo.
O Centro Sírio para Pesquisa de Políticas calcula que o conflito já tenha causado a morte de mais de 470 mil pessoas, ainda que não haja cifras totalmente confiáveis a respeito. Hoje, quase sete anos depois, especialistas avaliam que o levante contra Assad está perto do fim. As fotos do recente ataque, que reverberaram nas redes sociais locais, foram feitas na região da Ghouta Oriental – um território controlado por grupos jihadistas. Foi mais uma tentativa do governo de sufocar os grupos opositores, que têm perdido força com o passar do tempo.
Segundo a Onu, neste ataque, 76% das residências da região foram devastadas e 400 mil moradores precisaram se mudar para abrigos subterrâneos. Apesar de ter sido negado, há suspeitas de que a ação tenha usado gás sarin, um composto químico extremamente tóxico que age no sistema nervoso.