Donas de casa voltam a utilizar fogão à lenha para preparo das refeições
“A gente fica apavorado aqui em casa. Pesquisa, pesquisa e só aumenta. É um horror. Quando compra, tem que fazer durar já que o valor pesa muito ao final do mês.” Este é o relato da montenegrina Valda Adriana da Luz sobre o gás de cozinha, que tem passado por alta de valor e impactado famílias do Brasil inteiro. Valda mora, atualmente, com sete pessoas e sua família é uma das muitas que tiveram que deixar o fogão a gás de lado. Há pelo menos dois meses, Valda trouxe seu antigo fogão a lenha de volta para dentro de casa. “Não tem nem porta mais, mas é o que tem nos salvado. Coloquei até um papel alumínio improvisado”, destaca. O motivo da volta do antigo fogão é clara: após pesquisar preço por todas as revendas da cidade, o último gás que Valda comprou, há dois meses, pagou R$ 78,00 reais. Agora, o valor subiu ainda mais com nova alta.
Valda salienta que ainda permanece com o gás comprado para emergências, casos bem pontuais, mas que as refeições são todas preparadas já no fogão à lenha. “Meu marido acorda cedo para ir trabalhar, então ali ele usa para fazer o café porque é mais rápido, mas, se não, a gente já estava sem”, conta. Se reinventando como muitos brasileiros, Valda diz que apesar dos pesares, tem se acostumado com o fogão à lenha. “Aprendi a usar e gostei. Enquanto eu puder, vou usando meu fogãozinho velho. Aí com a esperança de no Verão comprar outro, caso o valor do gás não melhore, né? Aproveitar que no verão abaixa o valor dos fogões”, projeta.
“Tive que fazer fogo em latas de tinta para terminar de cozinhar”
Aline Nunes, de apenas 26 anos, também sofre na pele os efeitos da alta. No momento desempregada, sobrevivendo do trabalho de reciclagem que faz na rua e com cinco filhos pequenos em casa, as dificuldades são constantes, mesmo que com ajuda muito grande da Cufa, conforme relata. “Faço só almoço para mim e minhas crianças e de noite a gente toma só café por causa do gás”, destaca.
Um relato bastante pessoal de Aline mostra que a dificuldade não é pouca. “Não tenho vergonha de dizer que esses dias eu não tinha gás em casa e tive que fazer fogo em latas de tinta para poder terminar de cozinhar a comida, na lata mesmo”, relembra. Há mais ou menos 6 meses Aline utilizava fogão à lenha, mas teve que se desfazer dele. “Muito velho. Ele acabou quebrando, aí eu coloquei no lixo. Mas faz muita falta porque o gás é muito caro, tem que economizar um monte”, lamenta.
Em época de pandemia, diversos problemas tendem a afunilar ainda mais a situação de desespero pela qual a população passa. Pelo menos a comida precisa estar na mesa de cada trabalhador e cidadão brasileiro. Mas, como se não bastasse a alta no valor dos alimentos, a realidade do povo brasileiro nos últimos meses é sofrer, ainda, com o preço do gás de cozinha. No último dia 11, a Petrobrás anunciou mais um aumento de 5,9% no valor. As distribuidoras e revendedoras do ítem são livres para definir se e como repassarão o aumento. O reajuste para as distribuidoras, de acordo com a empresa, segue o equilíbrio com o mercado internacional e acompanha as variações do valor dos produtos e da taxa de câmbio.
“Aumento do salário mínimo só deu para compensar o aumento do botijão de gás”
Silvio Cezar Arend, economista da Unisc, reitera que o principal fator para o grande aumento no valor do gás é a cotação do petróleo no mercado internacional, assim como ocorre para o preço da gasolina e óleo diesel. Infelizmente, Arend não confia que haja previsão para diminuição do valor. “A política de preços da Petrobrás tem sido de acompanhar o preço internacional e repassar para o consumidor interno toda a volatilidade do mercado internacional. Soma-se isso ainda a desvalorização cambial. Isso tudo é em favor da rentabilidade da empresa como acionistas”, explica.
Tudo junto gera um grande problema e, segundo o economista, causa muito mais que impacto nas famílias, e sim um verdadeiro “estrago”. “Isso é um problemão, pois o preço do gás de cozinha, dependendo do período de comparação, aumentou mais que o salário mínimo, então o aumento do salário só deu para compensar o aumento do botijão de gás. Mas, e as outras coisas que subiram no período? Por isso a dificuldade cada vez maior de fechar as contas no final do mês”, destaca.
“O impacto é muito alto, as famílias cada vez mais têm que escolher o que cortar dos seus gastos para conseguir dar conta da alta de alimentos e do gás de cozinha, pois sem alimentação não dá para passar o mês. Também por isso um número maior de famílias está passando fome. Li uma reportagem falando em 60 milhões de pessoas que não têm nem uma refeição adequada por dia.”, reitera Arend.