Rachaduras no Cais podem provocar novos desmoronamentos

porto das laranjeiras. Prefeitura alega que está elaborando projeto de revitalização

Um dos mais conhecidos cartões postais de Montenegro, o Cais do Porto das Laranjeiras é ponto de visita de turistas, de caminhadas pela sua orla ou um simples chimarrão com alguém especial. Apesar da sua importância para o Município, é visível para quem passa por ali os problemas estruturais pelos quais o local passa. Pelo menos dois pontos do espaço histórico estão com rachaduras profundas e deterioradas. Entidades alegam “maquiagens” e descumprimento das características históricas e culturais do Cais. Já a Administração atual declara que está monitorando as rachaduras, e um projeto para revitalização do local em sua integralidade está sendo pensado.

Inaugurado em 7 de setembro de 1904, o Cais do Porto é tombado como Patrimônio Histórico do Município de Montenegro desde março de 2000. Ao longo dos anos os problemas na orla do Rio Caí foram sendo expostos, e isso não é novidade. Segundo o biólogo mestre Rafael José Altenhofen, que também é presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) de Montenegro e do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Caí, o Comitê Caí, são diversos os fatores que ocasionam esses problemas estruturais no Cais.

Com as mudanças climáticas, o reflorestamento e impermeabilização do solo urbano e rural, a intensidade e velocidade na qual a água passa pelo rio foi alterada. “A dinâmica da água também mudou nos últimos anos. O nível do Rio está baixando, e esses momentos que o Rio Caí está mais baixo, têm menos pressão de água segurando as paredes. Quando tem enchente a água vem mais rápido e bate mais forte. A dinâmica da água mudou e isso pode modificar a forma e intensidade que a água chega”, explica o biólogo.

Já no trecho mais próximo ao Caça e Pesca, rachadura também é bastante visível

Além das mudanças naturais, o ser humano também é responsável pela deterioração. Altenhofen cita a criação de um acesso de concreto ao Rio, feito no governo do ex-prefeito Paulo Azeredo, em 2015, após um desmoronamento devido à retirada de vegetação de pequeno e médio porte que já estava fixada nas pedras. “Antes essa parte tinha vegetação, e a vegetação segurava a velocidade da água que chegava, agora foi feita quase que uma chapa lisa de concreto, a água bate ali e sai mais forte”, diz.

De acordo com o presidente do Comdema, o talude de Cais possui pedras encaixadas em outras pedras, e em função disso é necessário fazer manutenção da vegetação que se desenvolve no local. “Quando o capim começa a crescer ou nasce uma árvore, a raiz dessa árvore começa a forçar e desagregar, começa a soltar as pedras, e uma vez solta fica exposto a cada enchente ir desestabilizando”, fala Altenhofen. É necessário então um descapoeiramento periódico para evitar o crescimento da vegetação, o que segundo ele, não ocorre há cerca de seis anos.

A alteração no fluxo de veículos e a rede de esgoto também são outros fatores que causam a desestabilização da estrutura no local. “Montenegro tem mais de 100 saídas de esgoto no Cais. Esse esgoto não tem saneamento, sai para a tubulação pluvial e vai pro Rio, juntando toda essa água correndo constantemente em um cano que nunca é feito manutenção. São vários canos furados, e essa água não sai mais pelo cano, sai pelas pedras já”, concluí.

Críticas pelas “maquiagens”
Para o Comdema e também para o Movimento de Preservação do Patrimônio Histórico de Montenegro (MPPHM), o que vem ocorrendo no Cais são “maquiagens”, que tentam esconder os reais problemas que há no local. “O histórico não é positivo e infelizmente o resultado de anos de maquiagens eleitorais, é nítido, aonde utilizam os nossos cartões postais sem o mínimo de conhecimento, zelo e respeito. Nosso Cais sangra”, declara a vice-diretora do MPPHM, a arquiteta e urbanista Letícia Kauer. Para ela, é necessário que algum gestor tenha a coragem de assumir esta responsabilidade e atuar de fato na origem do problema, pois caso isso ocorra não se terá uma solução.

Além de não trabalhar no cerne do problema, eles também alegam que o Executivo não levou em conta a originalidade e preservação do Cais. “Estão sendo feitas várias ações que descaracterizam o bem tombado. Quando tu cobres com asfalto a pedra que originalmente era granito, isso já está descaracterizando”, comenta Altenhofen.

Base do talude tem infiltração que afeta o subsolo. Foto: Arquivo Ibiá

Por ser um bem tombado pelo Município, a responsabilidade pela preservação do Porto das Laranjeiras compete ao Departamento de Cultura da SMEC, entretanto há um termo de cooperação técnica com Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae), gratuito, aonde disponibiliza profissionais habilitados para assessorar qualquer demanda em relação ao patrimônio histórico. Segundo Letícia, o Município não cumpre com a sentença do Ministério de compor uma comissão inventariante (composta por um arquiteto e um historiador). “Esta comissão é a responsável pelo inventário/levantamento de todos os bens do município. Este levantamento é técnico, que analisa rasgos arquitetônicos, urbanos, históricos de todas edificações e espaços declara.

Como a comissão ainda não existe, o Movimento aponta este termo de cooperação técnica com o Iphae para que seja utilizado em todos os temas relacionados ao patrimônio. Somente profissionais habilitados podem interferir nestes bens, entretanto eles reiteram que isso não vem ocorrendo.

Movimento defende um diagnóstico do Cais e um macroprojeto
Para o presidente do Movimento de Preservação do Patrimônio Histórico, Ricardo Kraemer, qualquer ação realizada no Cais deve passar primeiramente por um estudo do ponto de vista do patrimônio histórico. “Nós do Movimento queremos que seja feito um diagnóstico de tudo isso (Cais), um projeto disto”, fala.

A vice-diretora, Letícia Kauer, complementa que o tema de fazer um macroprojeto é um lavantamento estrutural, técnico do Cais como um todo. Esta é uma demanda antiga que o Movimento cobra do Executivo e do Legislativo com frequência. Inclusive, Letícia cita que de forma mais intensa na época em que foi divulgada a revitalização em frente à Câmara da Vereadores, enquanto outros trechos apresentavam riscos.

Limpeza na orla do Rio Caí não ocorre há diversos anos

“O movimento defende este estudo estrutural de toda a orla e sonha com um concurso de projeto para aí sim buscar recursos e executar etapas do projeto. Entregando assim um espaço de qualidade para os mais distintos usos que temos no Cais, com segurança e valorizando o patrimônio histórico e natural”, completa.

Prefeitura admite que Cais apresenta riscos de desmoronamentos
O Executivo Municipal não ignora a situação estrutural do Cais. Segundo o secretário municipal de Gestão e Planejamento, Fabrício Coitinho, a Administração está monitorando as rachaduras sobressalentes, assim como outras já identificadas ao longo da orla. O secretário admite que a situação da orla é bastante preocupante, e declara que as intervenções feitas no passado foram pontuais e não ocorreu uma avaliação das condições totais da estrutura, o que está sendo feito agora.

Coitinho informa que a Administração está pensando e trabalhando em um projeto para revitalização do Cais em sua integralidade. “A equipe da Secretaria Municipal de Gestão e Planejamento está pensando na melhor forma de embelezar a orla, respeitando o máximo possível as características histórico-culturais do local e ampliando a área de convívio, a segurança das pessoas e a mobilidade de toda a extensão. Para esse projeto, trabalharemos junto do IPHAE para que consigamos manter todos os nossos requisitos antes de partirmos para o processo licitatório”, fala. Entretanto, até o momento não foi definido ainda qual será a modalidade de financiamento utilizada, ou seja, não há recursos para obras.

Lado a lado, a mesma rachadura no ano de 2018 e, agora, no ano de 2021

Em relação ao talude, o secretário explica que já há um termo de referência pronto e em fase de orçamentos prévios para recuperação. “Entendemos que atuar pontualmente será adiar problemas. Pretendemos recuperar todo o talude de uma só vez”, diz.

Sobre limpeza da orla, Coitinho relata que uma licença ambiental foi dada, e agora o Executivo está planejando o serviço. Data de quando isso ocorrerá não foi informado, somente que será ainda em 2021.

Segundo Fabrício, a situação é preocupante e, por isso, será trabalhado primeiro a base para, só depois, ser investido no embelezamento. “Fizemos consultas técnicas a profissionais da área de engenharia de estruturas e ao Iphae, para que fosse desenvolvido um termo de referência completo, atendendo às necessidades de todas as disciplinas. Nossa maior preocupação é desenvolver uma solução que resolva este problema para sempre. Depois disso, poderemos trabalhar na revitalização, fazendo um bom uso dos recursos que temos. Trazendo benefícios verdadeiros e duradouros para a população de Montenegro”, fala.

Entidades criticam “maquiagens” realizadas na orla do Cais do Porto

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