Foi através do caminhão que César Mateus de Oliveira, 31, e Amanda Veridiana Henzen, 23, se conheceram. Os dois participam do GANG 31 AM, grupo de caminhoneiros da região. “A gente já se conhecia, mas começamos a conversar no grupo e percebemos que tínhamos muitas afinidades e muita coisa pra falar sobre caminhão”, conta César. A troca de experiência sobre o mundo do transporte de cargas acabou formando uma família, que vai aumentar em breve, com a chegada de um filho.
César é natural de Montenegro, cresceu no bairro Senai e quando criança, nunca imaginou que seria caminhoneiro. Filho de um barbeiro, a ideia era seguir a profissão do pai, o que mudou quando teve os primeiros contatos com o caminhão. “Tem pessoas que falam que pra ser caminhoneiro tu já tem que nascer com a paixão, mas eu discordo. O meu pai era barbeiro, eu olhava ele cortando cabelo e achava que seria barbeiro também. Foi depois que descobri o caminhão na minha vida”, expõe. A relação com o caminhão começou em um comércio de bananas da cidade, onde trabalhava. “Eu comecei a puxar o caminhão pra frente e pra traz e eu comecei a gostar. De lá pra cá, a paixão só foi aumentando. Peguei um pequeno e depois fui indo pros maiores”, relata César.
Já Amanda teve na família, formada na sua grande maioria por motoristas, a inspiração para seguir na profissão. Natural de Salvador do Sul, a relação com o caminhão iniciou ainda na adolescência. “Com 14 anos eu comecei a aprender a dirigir, foi quando eu comecei a ter mais noção. Aí com 19 eu tirei carteira e com 20 anos já comecei a trabalhar como motorista”, afirma. Ela conta que até tentou cursar pedagogia na universidade, mas fez apenas dois semestres e logo percebeu que o que interessava mesmo era o caminhão.
Hoje o casal trabalha transportando cargas de areia e brita de Montenegro e Triunfo para a empresa Julinho Materias de Construção, de Salvador do Sul, que pertence à família de Amanda. Há cerca de um mês, as viagens têm sido feitas somente por César, por conta da gravidez de Amanda. Mas, no início, ele contou com ajuda da esposa, que já atuava no transporte de areia e brita. “Eu, antes, trabalhava transportando ração, nunca tinha trabalhado com caçamba. Então contei com a ajuda da Amanda, que já dirigia caçamba, pra começar a pegar o caminhão”, aponta.
Com a chegada do filho, que chamará Enzo, o casal já faz planos. A ideia é seguir trabalhando na empresa da família e incentivar o pequeno a seguir a profissão dos pais, mas sem impedir outros caminhos. “Ele, desde agora, já viaja com a gente no caminhão. Então é natural que ele cresça gostando disso. A gente quer que ele siga a profissão que ele escolher, mas vamos incentivar ele a valorizar a nossa profissão”, destaca Amanda. César aponta que o filho vai crescer em um ambiente totalmente diferente do dele, com a profissão já inserida no meio familiar, o que deve facilitar. “Ele vai ter uma coisa que é muito forte, que é a família. Trabalhar em família é muito bom. Tem um acolhimento, não é como trabalhar em uma empresa como funcionário. Então a gente quer que ele goste de caminhão, goste de cuidar, e goste da profissão”, afirma.
Profissão também é feita de desafios
Quando começou a atuar como motorista, o principal desafio de Amanda foi vencer o preconceito em uma profissão formada, na sua grande maioria, por homens. “Tinha muito essa questão de desmerecimento por ser uma mulher na direção”, relata. Para lidar com a situação, ela conta que teve que se impor e mostrar que era tão capaz quanto qualquer outro motorista. “Hoje em dia eu não dou mais bola, sei da minha capacidade e também tem muitas pessoas que admiram o meu trabalho”, afirma Amanda.
Para César, ainda existe uma desvalorização da profissão e, principalmente, falta de empatia por parte de outros motoristas no trânsito. “Infelizmente não é uma profissão tão valorizada, mas é muito importante. A gente percebe no trânsito mesmo, quando estamos com o caminhão carregado acontece de pessoas que se colocam na frente do caminhão. Então falta um pouco de empatia de alguns motoristas”, aponta.
O preço do diesel é outro ponto que preocupa a categoria. César diz que, para quem trabalha em um negócio familiar, onde o produto transportado é entregue diretamente para o consumidor, a situação é ainda mais difícil. “O combustível está pegando de mais, porque pra nós que trabalhamos com o consumidor final, quando sobe tem que repassar. Então tu tem que começar a buscar maneiras de economizar combustível, tem que andar mais devagar”, expõe o caminhoneiro.
Antes de engravidar, Amanda conta que o casal até pensava em fazer viagens mais longas de caminhão. Agora, com o pequeno Enzo chegando, os caminhoneiros não têm mais essa ideia. César relata que essa é uma tendência observada em muitos colegas de profissão, que estão deixando de fazer viagens mais longas para ter mais qualidade de vida. “Eu sinto que está dando uma debandada do pessoal que viaja para longe. Porque é difícil tu pegar e sair viajar pra longe, tu não pode se programar pra nada e fica muitos dias longe de casa. Vários amigos já me chamaram pedindo pra eu arrumar uma vaga mais perto de casa”, afirma César.
“Não conseguimos viver longe do caminhão”
Sem fazer as viagens diárias de caminhão, Amanda diz estar sentindo muita falta do trabalho. “Desde que parei de dirigir, tenho sentido muita falta, parece que o dia não rende. Quando a gente viaja o dia passa mais rápido e tu curte a viagem. Então eu não me vejo longe de jeito nenhum”, expõe. A programação agora é pra voltar à direção, o que ainda deve demorar um pouco. “Não vou conseguir voltar logo, porque lá em Salvador só tem creche depois de um ano. Mas assim que puder vou voltar, porque eu sinto muita falta”, diz Amanda.
Para César, a profissão é especial porque possibilita fazer novas amizades nas viagens e nos grupos de encontros de caminhoneiros. “Temos muitos amigos nessa profissão. O mais legal é que em cada segmento que tu trabalha, conhece novos grupos e vai fazendo novas amizades. Então, esse mundo é muito legal e hoje podemos dizer que não conseguimos longe do caminhão”.