Apesar das várias tentativas, município não consegue ter um evento para divulgar potencialidades, ao contrário das cidades vizinhas

Há anos, a Expofesta de Brochier; a Citrusflor, de Pareci Novo; e a Oktoberfest, de Maratá; colocam os seus municípios-sede no mapa e, durante os seus dias de festa, agitam a rotina das cidades. Muitos turistas prestigiam os eventos e, de acordo com os organizadores, grande parte do público que comparece é de montenegrinos. O fenômeno, então, levanta a pergunta: por que Montenegro não consegue ter uma festa tradicional
para chamar de sua?
Tentativas para isso não faltaram. Uma das mais recentes – a Expomonte – foi, inclusive, a que mais durou. Teve quatro edições, mas acabou em polêmica na prestação de contas. O caso foi para a Justiça e, até hoje, impõe dificuldades para a realização de um novo evento. Antes dela, no entanto, muitos outros projetos já foram colocados em prática. Em retrospecto, termos como o egoísmo político, a falta de apoio e a baixa união da comunidade são comuns nas explicações do porquê eles não foram adiante. Vamos relembrar?
A FESTA DA LARANJA (1958, 1962 E 1966)

Uma importante festa do século passado durou três edições. A Festa da Laranja foi promovida na gestão de Hélio Alves de Oliveira, com a primeira edição sendo realizada em comemoração ao título de “Município de Maior Progresso” – conquistado por Montenegro em 57, no Conselho Nacional de Estatística. Também marcando o Dia do Colono, a primeira ocorreu no prédio onde funcionava a antiga fábrica de calçados Hack Renner, na Rua Osvaldo Aranha. As demais, em um terreno da Prefeitura e da Tanac.
Em abril do ano passado, algumas tratativas chegaram a tentar retomar o projeto. Encabeçado pela Associação Montenegrina de Artistas (Amarti), um grupo chegou a apresentar na Câmara de Vereadores e ao prefeito a ideia da retomada, que já seria posta em prática em junho deste ano. A iniciativa acabou não indo para frente. “Auxiliamos nesse movimento no sentido de entender o que a comunidade e as entidades queriam”, explica a presidente da Associação, Andrisa Mariano. “Mas, no fim, isso não foi mais discutido”.

As dificuldades são expressas em perguntas. “Todos querem um grande evento, mas como fazer esse evento?”, continua Andrisa. “Quem administraria? Quem tomaria a frente? Foi aí que barrou. Acredito que a maior dificuldade seja essa aproximação entre o poder público, o privado e entidades representativas de classe. Teria que haver um conjunto aceito com a vontade da cidade inteira, com os setores de serviço, indústria e comércio. Acabamos entendendo que aquele não era o momento”, explica.
Festa & festa (1988)

Foi a partir deste evento que o Parque Centenário – inaugurado em maio de 1973 – passou a sediar as festas montenegrinas. Na época, ele ia só até o ginásio Domingos dos Santos e foi ampliado especialmente para o evento. Foi construído o ginásio Normélio Petry (Azulão), o lago artificial que fica próximo a ele e outras obras no restante da área adquirida, como a roda d’água e os galpões para a exposição de gado. O Festa & Festa durou quinze dias, reuniu 120 mil pessoas e trouxe os shows de Elba Ramalho, Capital Inicial e da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa).
Presidente do evento, Agenor Rigon destaca a participação de empresas como a Tanac e a Ambev, que abraçaram a organização, e da comissão organizadora, que contou com importantes nomes da história da cidade. “Para um evento desses, tem que ter muita doação. Nós viajamos o país todo para conhecer outras festas do tipo e foi um trabalho de dois anos para fazer. Aquilo resgatou a auto-estima de Montenegro”, avalia.
Como atrações, ainda, a Festa & Festa trouxe atividades esportivas, exposições, desfile de carros alegóricos e a apresentação da esquadrilha da fumaça, tendo a presença do então governador do Estado, Pedro Simon. Não isenta de polêmicas, houve discussões para a definição do nome e até a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara, que investigou supostas irregularidades. O projeto não passou da primeira edição. Na opinião de Agenor Rigon, os dirigentes posteriores não acreditaram na ideia.
Festa suco e cuca (1996)

Foi para este evento – que também não passou da primeira edição – que Montenegro recebeu a famosa dupla sertaneja Leandro e Leonardo. A festa nasceu com o objetivo de promover os sucos de citros – produto de destaque na economia local – e a cuca – alimento de origem alemã e já tradicional no município. De acordo com a organização, mais de 20 mil pessoas prestigiaram a iniciativa no Centenário, consumindo mais de 10 mil litros de suco e cerca de 5 mil cucas.
Secretario municipal de Agricultura da época, Pedro Wollman destaca que a participação da indústria e do comércio na realização do evento foi muito forte e afirma que o retorno financeiro foi positivo. Para ele, é a falta de uma identidade em Montenegro que impede que festas do tipo se enraízem como tradicionais, a exemplo dos municípios vizinhos. “Montenegro perdeu sua identidade. Já foi capital do milho, da acácia, e hoje já não tem mais uma orientação. Cada Administração que entra quer inventar uma coisa diferente”, opina.
Pedro segue: “É preciso uma vontade política para que uma festa dessas aconteça sem que ela vire uma campanha política. A comunidade sempre quer esses eventos. Eles mostram que o município existe e valorizam a comunidade e as empresas locais. Mas eles têm que ser colocados no calendário do município e este calendário deve estar acima das administrações que vierem.”
Arte e festa (1999)

Mesmo antes de Montenegro ostentar oficialmente o título de “Cidade das Artes”, as manifestações artísticas do município fomentaram a tentativa de um novo projeto de festa. Durante quatro dias de junho de 1999, no Centenário, a Arte e Festa trouxe diferentes apresentações e exposições, tendo sido prestigiado com uma cobertura no programa Teledomingo, da RBS TV, com participação da apresentadora Regina Lima.
A festa reuniu cerca de 22 mil pessoas no parque. Durante a abertura, a prefeita Maria Madalena Bühler chegou a afirmar que o evento marcaria o início de novos tempos para Montenegro, com indústrias a empregos, o que efetivamente ocorreu.
A promoção, contudo, não teve continuidade. “Por falta de iniciativa dos governantes”, avalia um dos membros da comissão organizadora, Marcos Hans. “Falta eles abraçarem ou delegarem para uma empresa que o faça. O Executivo que não colocou o evento no calendário do município.”
Expomonte (2006, 2008, 2010 E 2012)

Projeto de maior sucesso no que se refere ao número de edições, a Expomonte foi lançada na gestão Percival de Oliveira e reuniu mostras da indústria, comércio, agronegócio e cultura montenegrina. Dentre as atrações, Titãs, Paralamas do Sucesso, Papas da Língua e Roupa Nova se apresentaram e levaram milhares de pessoas ao Parque Centenário.
A quarta edição, no entanto, foi afetada pelas condições climáticas, registrou prejuízo de R$ 218 mil e acabou envolvida em um processo por irregularidades na prestação de contas da entidade contratada para a organização. Uma ação civil pública foi movida contra Percival e o Grupo Tarca de Arte Nativa – a entidade gestora. Para o Ministério Público, o Grupo foi usado como “laranja” pela Administração, com o objetivo de burlar a Lei das Licitações na contratação de serviços.

Além disso, segundo aponta a ação, a Prefeitura fez o repasse de verbas para cobrir o anunciado prejuízo do evento antes de apresentar uma prestação de contas definitiva. Faltaram até os documentos fiscais de comprovação da venda dos estandes. Dentre os resultados do processo, Percival foi condenado a pagar dois salários mínimos em favor de uma entidade assistencial, mas recorreu, e a Prefeitura está barrada – caso opte por uma nova festa – de contratar qualquer empresa ou entidade para tomar conta da organização.
Em entrevista ao Jornal Ibiá, quando do anúncio do cancelamento da quinta edição da Expomonte, o então presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Alexandre Schmitz, lamentou o impacto da falta de uma festa para o setor produtivo da cidade. Para ele, um evento do tipo é uma oportunidade de as empresas locais captarem novos clientes e incrementarem suas vendas.
FESTA DE INTEGRAÇÃO DOS FILHOS DE MONTENEGRO (2013)
Nascida após as edições da Expomonte, na gestão Paulo Azeredo, a festa buscava reunir pessoas de cidades que já haviam pertencido a Montenegro. Marcado por um grande desfile com integrantes dos 23 municípios “filhos” e “netos”, o evento no Centenário trouxe como atrações a dupla Claus e Vanessa e o artista Elton Saldanha. Ele acabou cancelado antes de sua segunda edição, já no meio das polêmicas do projeto Expomonte.
Gestão Kadu Müller anuncia projeto de nova festa para 2019

O atual prefeito, Carlos Eduardo Müller (Kadu), acompanhou de perto as tratativas da quinta edição da Expomonte, quando de seu cancelamento, pois ocupava o cargo de secretário municipal da Indústria e Comércio na gestão Paulo Azeredo. Após, ele foi eleito vice-prefeito junto de Luiz Américo Aldana e assumiu a Prefeitura depois do processo de impeachment. Nomeada diretora de Cultura pelo atual prefeito, Priscila Nunes falou ao Jornal Ibiá sobre a falta de uma festa tradicional do município.
JI – É interesse da atual gestão que ocorra uma festa?
Sim, está nos planos resgatar a festa do município, mas iniciando em um formato menor para depois ir aumentando. Uma mega festa, hoje, financeiramente não seria viável. Então, eu já tenho o esqueleto deste projeto escrito e é bem no formato dos eventos que já vêm ocorrendo, com entrada gratuita e bem democrático, para que todos consigam ir em todos os dias.
Para quando se pensa a realização deste evento?
É para o ano que vem, em 2019. A previsão é para o mês de maio fazer uma, depois de dois anos outra e aí, na terceira, já seria a dos 150 anos de Montenegro e se poderia ter uma festa um pouco mais robusta. É um planejamento a longo prazo. Estando na terceira edição, já vamos poder pedir recursos junto ao Ministério do Turismo, então vamos torcer para ter esta continuidade. Já será outra gestão.
Qual é o principal desafio para se ter uma grande festa?
O que eu percebo é que o principal é o planejamento e a continuidade. Tem que se levar em conta o que aconteceu na história do município e não se pode descartar tudo cada vez que se troca de administração. Não dá pra cortar aquele pedaço fora e começar tudo de novo. A gente tem esse problema. Uma festa do município tem que acontecer a cada dois anos porque é uma trabalheira danada e tem que ter muito planejamento. Se a gente olhar que um mandato na Prefeitura é de quatro anos, acaba se fazendo duas festas e termina o planejamento. A preocupação tem que ser com a continuidade. Tem que se buscar uma identidade para o município, para que se faça a festa e ela se enraize.
O que você pode adiantar sobre o projeto deste novo evento?
A ideia é que seja no ano oposto a de Sebastião do Caí, intercalando, como fazem Brochier e Maratá. Queremos começar menor e ir conseguindo patrocínios para não contar apenas com recursos públicos. Algo que a gente precisa muito é o resgate da auto-estima de Montenegro e as pessoas precisam dar uma risada, escutar uma música de qualidade e ver o que está acontecendo na cidade. Então queremos algo bem democrático e trabalhado para que seja com entrada gratuita. Ainda estamos decidindo o nome que usaremos.
De que forma as irregularidades da Expomonte atrapalham a realidade atual?
O que a gente não pode é ter uma parceria e repassar dinheiro público para a realização do evento. Nada impede que a gente utilize o nome “Expomonte”, mas não podemos contratar um terceiro para executar a festa. Tem que ser tudo direto. Se a gente contratar som, tem que ser licitado. Os artistas, têm que ser via Sesc ou por inexigibilidade de licitação. Vai ser mais trabalhoso e com uma burocracia muito maior do que se fosse por meio de uma parceria com alguma entidade. Com isso, a Administração demora mais para conseguir chegar ao resultado e é preciso mais planejamento.
AFINAL, COMO OS VIZINHOS CONSEGUEM E NÓS NÃO?
A EXPOFESTA DE BROCHIER – Nascido em 1993, o projeto Expofesta comemora a emancipação política de Brochier, dando oportunidade para que o comércio, a indústria e os produtores locais exponham o seu trabalho e suas realizações. Já são treze edições, que ocorrem no mês de abril, a cada dois anos. “O diferencial é tentar envolver lideranças das comunidades”, avalia o presidente da última edição e vice-prefeito do município, Fernando Aurélio Braun.
Fernando explica que existe uma comissão de voluntários – nem todos ligados à Prefeitura – que, com seis meses de antecedência, já começam a pensar na festa. Em 2018, a receita com ingressos e patrocínios foi maior do que os R$ 400 mil investidos e a própria festa se custeou. R$ 40 mil haviam saído dos cofres públicos e o valor nem precisou ser utilizado. “A Prefeitura é só parceira. A festa é organizada pela comunidade, com lideranças e entidades, e esse é o grande diferencial”, diz Braun.

Reconhecendo a participação do público montenegrino, Fernando revela que a divulgação é intensificada aqui no município. Para ele, o evento sobrevive em Brochier porque, além da colocação da Prefeitura como participante secundário na organização, a Expofesta já faz parte da tradição brochiense. “Nem sabemos quem será o prefeito, mas já sabemos que terá festa. É uma coisa certa.”
A OKTOBERFEST DE MARATÁ
Colonizada por alemães, Maratá trouxe para si a tradicional Oktoberfest, que já está chegando em sua 14ª edição. Ocorrendo, também, a cada dois anos, o evento é custeado por sua própria arrecadação e por patrocínios. Da Prefeitura, instituiu-se nas últimas edições um limite de repasse de apenas R$ 30 mil. “A gente não visa o lucro. Com o valor, fazemos investimentos no parque e com a mídia. As sobras, nós repassamos para entidades como a creche, o coral e o grupo da terceira idade”, aponta o presidente da última edição, Maico Schmitt.

Maico destaca que há um ano de trabalho para a organização da festa e que há uma preocupação em incentivar a participação dos moradores. “A diferença, aqui, é que a Administração puxa, mas é a comunidade que faz. São eles que trabalham e se dedicam, fazem o desfile e vendem o chope. O mérito é deles, que sabem que não é para tudo que a Prefeitura vai correr”, coloca. Ele avalia, ainda, que por ser um município pequeno, há mais facilidade de acesso da comunidade a seus representantes políticos, o que promove a união e as tratativas da festa.
A CITRUSFLOR DE PARECI NOVO –
Chegando a sua sétima edição e já com data marcada para a escolha de sua corte, a Citrusflor é outro evento de destaque na região. Apesar de ainda não ter definido um período no ano para ocorrer – ela já aconteceu em maio, setembro e julho, a cada dois anos, mas com algumas quebras – o evento já é tradicional e leva muitos turistas para Pareci.

“O grande objetivo é divulgar a cidade e, com isso, a economia acaba girando”, indica a ex-rainha da festa e atual secretária municipal de Planejamento, Ilsandra Fell. “É uma questão de tradição que já virou marca da cidade. Não é questão do partido tal. A própria população já cobra dos administradores para que ela ocorra”. Ilsandra explica que a arrecadação da festa custeia os próprios gastos e destaca a participação da comunidade, que abraça a organização e capricha nos mini-jardins, que são a principal marca do evento.