Uma lenda do Metal no sossego do campo

ROCK LOCAL. Consagrado nos palcos, agora Fumanchu leva Arte a Santos Reis

Quando na festa pelo Dia Internacional do Rock (em julho, na Estação da Cultura) o vice-prefeito Cristiano Braatz se referiu ao vocalista Fumanchu como “lenda do metal nacional”, ele definia muito bem uma trajetória em busca do sonho. Também despertou curiosidade naqueles que não conheciam, e se surpreenderam, com a imagem daquele “headbanger”  careca e esquio, com voz gutural. Os 51 anos de Antônio Marcos Teixeira dariam um filme, até porque um livro já foi escrito.

Nascido em Caçapava do Sul, rodou a região Sul levado pelo pai Walter, que era construtor, até a criação do Polo Petroquímico colocar a família nas margens do Rio Caí. O ano era 1980, e aqui o menino de 8 anos recebeu o apelido que viraria seu nome artístico. “Foi algo muito inusitado”, recorda. Um colega na Escola Manoel de Souza Moraes percebeu semelhança dele com o lendário ponta-direita Luiz Fumanchu, estampado em figurinha do álbum do Brasileirão.

Os anos passaram, e em 1985 o Brasil vivia a efervescência cultural impulsionada pela liberdade do pós-ditadura. A primeira edição do Rock In Rio sintetizava este sentimento, com a presença de ícones do Rock’n Roll como Queen, AC/DC, Ozzy Osbourne, Iron Maiden. Morador do Industrial e aluno do Delfina, Fumanchu era apresentado aos mosaicos de cultural em Aulas de Arte e pela primeira vez ouviu um vinil de metal. “Ali eu pirei”, define.

Mas não era de nenhum “gringo”, mas da brasileiríssima Sepultura, com sua formação clássica no recém lançado EP “Bestial Devastation”. “Eu disse, quero fazer essa voz”, referindo-se ao vocal gutural de Max Cavalera. Foram tempos de formação intelectual visitando a Biblioteca Pública Municipal Hélio Alves de Oliveira, que na época tinha uma discoteca onde ouviam clássicos, como a britânica “Iron Maiden”.

Anos 80 e sua liberdade
A cena da Montenegro na “década perdida” também deu palco às ambições do artista. Fumanchu lembra com carinho da “Banda Verde” e da “A Coisa”, e de músicos como “Sibila”. Mas não havia palco para o choque social pesado proposto pelos estilos “death” e “thrash metal”; que somente a mudança para São Leopoldo, em 94, permitiu.

Fumanchu promoverá oficinas em Santos Reis

Fumanchu mergulhou na atmosfera cultural entre o Vale do Sinos e Porto Alegre, recebendo influências e definindo seu estilo. Então, retorna para Montenegro mudado. Ele era “thrash” e “punk”, e queria falar sobre podres poderes, destruição da natureza e demais aspectos humanos inconvenientes. “A gente usava muito a música como protesto contra aquilo que não engolíamos”, referindo-se a banda “Nonconformity”.

Na sua busca por conhecimento se torna instrumentista, faz oficina de percussão do Grupo Cultural Afroreggae e de teatro na Feevale, atua em um curta-metragem e ministra oficinas de artesanato para crianças em Novo Hamburgo. Ainda na banda montenegrina aperfeiçoa mais suas técnicas vocais na escola Prediger, em Porto Alegre. “O lance do vocal gutural não é só gritar”, recomenda.

Artes em Santos Reis
O projeto da Nonconformity acabou, mas Fumanchu não. Ao contrário, subiu ao “Olimpo do Rock” com outras duas bandas. Em Esteio é frontman da “Revogar”, banda de “Black Metal” de projeção nacional, que antes de um hiato forçado venceu a batalha internacional da “Metal Devastation Radio” (EUA), através do programa “The Zach Moonshine Show” (2019 e 2020) alcançando 5.506 votos. O segundo projeto de sucesso é na portoalegrense “Steel Grinder”, onde foi convidado para trazer sua essência vocal.
Sempre se reinventando, o “metaleiro” foi procurar o sossego do campo, em curiosa simbiose com o “barulho” que faz nos palcos. Em Santos Reis tem seu atelier de artesanato e esculturas, e é diarista nos pomares de citros. Um trabalho que dignifica, mas alerta que é temporário, pois quer retomar uma vocação.

Agora o sonho do artista plástico, ator, músico e promotor cultural é levar arte e inclusão as crianças e adolescentes da comunidade. Para isso lança neste sábado, dia 23, um projeto social apoiado pela Sociedade Cultural Beneficente de Santos Reis.

A estreia será em grande estilo, com edição especial do projeto “Hip Hop Além dos Palcos”, promovido pelo Embaixador do Hip Hop no Rio Grande do Sul, MC Pedrão. Será no ginásio da comunidade, a partir das 13 horas, aberto a todos os interessados.

Bicho-grilo para conhecer o homem
Fumanchu também largou tudo para viver de artesanato, sendo que desde criança era fascinado pela paz e liberdade de um “bicho grilo” (hippie) sentado no chão e criando com as mãos. Então nos idos de 2000, aos 28 anos, largou o emprego no Polo para morar nas ruas vendendo sua arte, e compreender o significado de irmandade.

Em montagem durante formação de ator na Feevale

“Eu queria ter essa visão! De como era às vezes não ter onde dormir, às vezes ter que dividir a comida com um companheiro que não vendeu. Ver os olhares das pessoas com desprezo e preconceito”, descreve. Sob as estrelas, e entre elas, encheu folhas de papel com memórias e filosofia. “Minha viagem era escrever e criar!”.

Os pensamentos viraram o livro “Sob Efeito”, que saiu graças ao incentivo do saudoso Luiz Américo Alves Aldana, o “Paraguai”, a quem dedicou a obra. “A arte traz leveza, traz cor e tira do mais profundo. A arte salva!”, resume.

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