PESQUISADOR da Unisc analisa mudanças no Novo Ensino Médio
“Não consigo vislumbrar benefícios para a escola pública com o novo Ensino Médio. Ainda mais, se considerarmos as diferenças que estão ocorrendo na implementação na rede privada de ensino”, a opinião é de Éder da Silva Silveira, professor do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). O educador lidera o Grupo de Pesquisa Currículo, Memórias e Narrativas em Educação – CNPq, pesquisando e orientando trabalhos referentes ao Ensino Médio.
Para o especialista, enquanto nas escolas privadas os itinerários formativos são flexíveis e integrados dentro da mesma área do conhecimento, nas redes públicas estaduais há uma mescla de duas áreas com componentes fixos, muitos dos quais são ministrados por professores sem formação adequada. Silveira critica a redução significativa da carga horária da formação geral básica, agora limitada a 1.800 horas, contra 3.000 horas anteriormente no Rio Grande do Sul. Ele aponta que a obrigatoriedade de 40% da matriz curricular ser destinada aos itinerários formativos diminui o acesso aos conhecimentos clássicos disciplinares, essenciais para todos os estudantes.
Desde seu início em 2020, durante a pandemia, o Novo Ensino Médio tem enfrentado críticas pela redução no aprofundamento dos conhecimentos básicos. Silveira também destaca a falta de divulgação das mudanças para o ENEM pelo Ministério da Educação, além dos benefícios percebidos principalmente para o mercado editorial.
“Percebemos que quem mais está se beneficiando é o mercado editorial dos livros didáticos e empresas, institutos ou organizações sociais do setor privado, pois o Novo Ensino Médio traz a possibilidade de realizar parcerias público-privadas para a oferta de parte deste currículo”, aponta Éder. “A reforma também trouxe uma mudança no FUNDEB. Com o Novo Ensino Médio, mudam algumas regras do financiamento público, agora os recursos também podem ser usados para financiar estas parcerias com o setor privado. Trata-se de uma política educacional que produz violência no e através do currículo com todos os estudantes e trabalhadores da educação.”
Pontos positivos e negativos da reforma
Éder faz uma análise crítica sobre as mudanças do Novo Ensino Médio. A reforma permite que os alunos tenham mais horas de aula em disciplinas que, segundo Silva, quase desapareceram na experiência anterior do Ensino Médio. Isso melhora o acesso aos conhecimentos. Por outro lado, Silva destaca que a reforma fragiliza a formação geral e científica dos cursos técnicos profissionalizantes do Ensino Médio. Além disso, aumenta a segmentação e as desigualdades nos sistemas de ensino.
Ele também aponta incertezas e fragilidades introduzidas no ENEM, enfraquecendo o acesso a certos conteúdos e disciplinas que não são mais obrigatórios. Outra preocupação levantada é a precarização do trabalho docente e da qualidade da educação, já que a reforma permite que profissionais com “notório saber”, mas sem formação pedagógica adequada, possam lecionar nos cursos técnicos.
O educador enfatiza que a reforma do Ensino Médio carece de uma postura mais democrática e ética, especialmente quando o texto aprovado não incorpora os avanços propostos pelo Senado. Para ele, é essencial adotar políticas educacionais multidimensionais que assegurem um Ensino Médio de qualidade, socialmente referenciado como um direito fundamental para os jovens.
Silva argumenta que o fortalecimento da escola pública e sua autonomia são fundamentais. Ele ressalta que o alto número de jovens fora da escola ou que abandonam os estudos é alarmante, demandando políticas sociais eficazes e iniciativas para valorizar os professores, suas carreiras e as instituições escolares.
Para mudar esse cenário, Silva propõe uma abordagem que combine políticas educacionais inclusivas com medidas concretas para garantir a permanência e a conclusão dos estudos pelos jovens de todas as classes sociais.
Andamento do PL nº 5230/2023
A Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 9, o Projeto de Lei nº 5230/2023, que estabelece novas diretrizes para o Ensino Médio e regulamenta sua implementação. Agora, o processo avança para a reedição das normas infralegais, que detalharão a (re)implementação da reforma. Em seguida, haverá a revisão dos currículos estaduais.
A aprovação da nova lei, no meio de 2024, indica que apenas uma parte das mudanças poderá ser adotada pelas redes de ensino e escolas já em 2025, com outras alterações previstas para 2026.
É necessária a definição do formato do Enem, que, a partir de 2027, deverá considerar as competências e habilidades da BNCC e as diretrizes nacionais de aprofundamento das áreas.