Não caia no terrorismo nutricional!

Você pode não ter ouvido falar no termo “terrorismo nutricional”, mas provavelmente já se deparou com ele na sua vida ou na de pessoas próximas. O termo é utilizado para se referir à disseminação de informações alarmistas e distorcidas sobre alimentos e nutrição. Ele é caracterizado por classificar os alimentos de forma binária: bom ou ruim; saudável ou não saudável; prejudicial ou não prejudicial. Segundo a nutricionista montenegrina Camila Kleber de Oliveira, esta prática vem sendo difundida principalmente pela mídia e redes sociais, tornando o ato de comer culposo e estressante. Assim, leva as pessoas a adotarem dietas restritivas justamente por desenvolver medo dos alimentos.

Ela destaca que o terrorismo nutricional pode ser extremamente prejudicial a quem busca uma relação saudável com os alimentos. “Pode criar um sentimento permanente de medo e culpa em relação à comida. Esse medo constante de cometer erros alimentares pode levar a um estado de estresse e ansiedade, prejudicando assim a saúde mental e física das pessoas”, alerta.

Foto: divulgação

Diante desta relação negativa com a comida, Camila afirma que as pessoas acabam se privando do prazer de comer e celebrar a alimentação, pois se sentem pressionadas a seguir dietas restritivas, eliminando certos alimentos e até mesmo grupos alimentares da sua dieta, mesmo que sejam nutritivos e essenciais para a saúde. “A desinformação e as distorções acerca da alimentação saudável podem levar as pessoas a se sentirem mal consigo mesmas por não conseguirem seguir a “dieta perfeita” e isso pode contribuir para problemas de baixa autoestima e distúrbios de imagem corporal”, destaca.

Consequências físicas e mentais
As consequências negativas do terrorismo nutricional são diversas e podem afetar tanto a saúde física como a saúde mental das pessoas. O medo de comer em público e ser julgado por suas escolhas alimentares pode levar a sentimentos de inadequação, vergonha e isolamento social, mas não para por aí.

Camila explica que a adoção de dietas restritas, sem critério, sem acompanhamento profissional e prescritas por pessoas não autorizadas, pode levar ao desenvolvimento de distúrbios alimentares, baixa autoestima, compulsão alimentar ou restrições acompanhadas de atos compensatórios. “A dificuldade em manter uma alimentação equilibrada e saudável aliada às informações alarmistas e distorcidas pode acarretar em transtornos alimentares tais como anorexia, bulimia e compulsão alimentar”.

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Vale lembrar que toda e qualquer dieta muito restritiva não é recomendada. “Dietas que prometem resultados rápidos e milagrosos geralmente são insustentáveis em longo prazo e podem levar ao reganho de peso rebote, o famoso “efeito sanfona”, causando sensação de incapacidade e frustração”, sinaliza Camila. Segundo ela, dietas da moda geralmente são baseadas em estudos científicos frágeis ou em modismos passageiros e, em geral, não oferecem resultados duradouros. “Dietas que eliminam grupos inteiros de alimentos ou que fornecem pouquíssimas calorias, podem levar a deficiências nutricionais, perda de massa muscular, fadiga, fraqueza, desnutrição e outros problemas de saúde. É importante ressaltar que o profissional habilitado a prescrever um plano alimentar é o nutricionista”, sintetiza.

Portanto, não caia no terrorismo nutricional. Para isso, é importante buscar informações confiáveis sobre nutrição e ter uma relação saudável com a comida. “Procure ajuda profissional de um nutricionista para criar um plano alimentar individualizado e que atenda às suas necessidades, com foco no prazer de comer e em ter uma alimentação equilibrada e variada, sem restrições severas, sem culpa ou medo”, acrescenta Camila.

“O básico funciona”
A nutrição é uma ciência complexa e não existe fórmula mágica para uma alimentação saudável. O que funciona para uma pessoa, pode não funcionar para outra. Conforme Camila, uma dieta saudável deve incluir todos os grupos alimentares em proporções adequadas e equilibradas, além de ser variada e priorizar alimentos ricos em nutrientes e minimamente processados. “Deve ser adequada às necessidades individuais, levando em consideração sexo, idade, prática de atividade física, estado de saúde, rotina do indivíduo e preferências alimentares”, ressalta.

A alimentação deve fazer parte de um estilo de vida saudável, fornecendo nutrientes necessários para o bom funcionamento do organismo, promovendo saúde e bem-estar. “Entretanto, não se deve negligenciar as dimensões culturais e sociais intrínsecas à alimentação. Para ser saudável, a alimentação deve abranger nossas memórias e lembranças afetivas, nossas tradições e também nosso prazer em comer.”

Fotos: freepik

Lembre-se: para ser saudável não precisa ser caro ou complicado. “Priorizar alimentos naturais e da estação, planejar as refeições, aproveitar as ofertas, cozinhar e cultivar alimentos em casa são ações que podem contribuir para uma alimentação saudável e mais acessível”, analisa. O básico funciona, o tradicional arroz com feijão é um prato tipicamente brasileiro, muito saudável e que cabe no bolso de todos. “A alimentação saudável deve ser uma fonte de prazer e saúde, não de sofrimento e culpa”, conclui a nutricionista.

Exemplos de terrorismo nutricional e seus riscos
O ovo, a gordura, os alimentos que contêm glúten, e o leite são exemplos. Ao eleger tais alimentos como “vilões”, a mídia também procura apresentar alternativas e possíveis substitutos, frequentemente não ideais, podendo resultar em sobrecarga para o organismo ou até mesmo subnutrição.

A busca por um substituto da farinha de trigo também serve como exemplo. O glúten presente na farinha de trigo tem sido substituído por opções como a farinha de arroz, considerada uma alternativa mais saudável. No entanto, a farinha de arroz é tão refinada e processada quanto a farinha de trigo. Adicionalmente, essa opção é menos acessível à maioria da população.

Voltando às dietas restritivas, além de apontar alimentos individuais como culpados, o terrorismo nutricional propaga dietas que restringem grupos alimentares ou eliminam refeições, frequentemente em busca de resultados como perda de peso em curto prazo. Entre as dietas restritivas mais comuns, incluem-se o jejum intermitente, que envolve alternar entre períodos de jejum e alimentação, seja por horas ou dias; a dieta cetogênica, que é caracterizada por um plano alimentar rico em gorduras e baixo em carboidratos; a dieta low carb, que visa reduzir significativamente a ingestão de carboidratos, aumentando a proporção de proteínas e gorduras e a dieta paleolítica, que é baseada na premissa de consumir alimentos semelhantes aos disponíveis para nossos antepassados na Era Paleolítica, excluindo grãos, laticínios e alimentos industrializados do plano alimentar.

Cuidado com as redes sociais
Se existe uma pressão pelo corpo “ideal”, existe demanda de conteúdo sobre como alcançá-lo. Nas redes sociais, pessoas ganham a vida produzindo conteúdo sobre como emagrecer, exercícios e um lifestyle de saúde. O que os nutricionistas explicam é que com tanta informação, as pessoas sabem o básico e para ganhar audiência é preciso uma chamada comercial e um tom de novidade. É aí que quem produz conteúdo on-line investe no que especialistas chamam de terrorismo nutricional. “Açúcar vicia como cocaína. Cortar o glúten é o segredo para emagrecer. Leite é inflamatório. Pão é vilão. Bolo de chocolate pode levar ao Alzheimer.” Todas essas afirmações não têm qualquer base científica, mas estão em massa na internet em vídeos com títulos que buscam chamar a atenção.

Em uma busca rápida pelo Instagram, por exemplo, há 35 milhões de publicações com a hashtag dieta. Grande parte desse conteúdo traz vídeos de pessoas compartilhando sua “rotina saudável” na perda de peso, com dicas de como emagrecer e até indicação de produtos emagrecedores sem a sinalização de que são publicidades.

Também com o up no uso das redes sociais e a tecnologia, os modelos de beleza podem ser editados, esconderem plásticas, publicarem fotos de ângulos escolhidos para parecerem o que não são. Sendo assim, o que existe on-line nem sempre é real ou é só parte da história. Isso também serve para as “dietas malucas” e restritivas divulgadas por grandes influenciadores. É consenso entre os nutricionistas que qualquer dieta muito restritiva não é recomendada. Com publicações facilmente encontradas nas redes, muitas pessoas deixam de comer diversos alimentos embarcados no modismo, justamente pela “realidade” que estão vendo através das telas. A problemática inicia a partir deste momento: pessoas deixam de usufruir de determinados alimentos por puro medo.

É de extrema importância que as pessoas saibam, cada vez mais, escolher a dedo os conteúdos que estão consumindo, afinal, sabe-se ainda que uma alimentação saudável inicia na relação saudável com os alimentos. Não é preciso ter medo da comida. Ter um nutricionista que possa te fornecer as informações corretas é fundamental para que sua saúde física e mental não fiquem comprometidas durante o processo.

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