Treinamentos em salão social, bloco de Carnaval, Felipão defendendo as cores da cidade… Detalhes que, no momento em que acontecem, podem passar despercebidos, mas ao longo dos anos, tornam-se fundamentais para a construção da história. Em 150 anos de Montenegro, muitas equipes e jogadores, de diferentes modalidades, colocaram seus nomes na história do esporte montenegrino.
Quando falamos de voleibol no Município, é impossível não recordar os feitos de Riograndense e Frangosul nas quadras. Também dentro dos ginásios, o Mandarins brilhou no futsal nas décadas de 1970 e 1980. No futebol de campo, os times Montenegro, Renner e América tiveram seus momentos de glória na cidade. A equipe da Brenner levou o nome do município ao litoral e fez história nas areias de Tramandaí, nas disputas do tradicional Bolamar.
Mais recentemente, nos clubes sociais, Expulsos do Bar, Ellite, Fase Boa, 21 de Julho e Peludos escreveram seus nomes na história de Grêmio Gaúcho e Cantegril como equipes vitoriosas e tradicionais nas competições de futebol sete. Além dos títulos, essas equipes protagonizaram disputas memoráveis e revelaram muitos atletas para o esporte local.
Um dos técnicos mais vitoriosos do futebol brasileiro, o gaúcho Luiz Felipe Scolari, o Felipão, defendeu as cores do time Montenegro quando era professor na escola A.J. Renner. Entre as partidas de futebol históricas que foram disputadas no município, um amistoso entre a Seleção de Montenegro e o Internacional se destaca.
O duelo foi disputado no Estádio dos Taquarais, a fim de arrecadar recursos para o goleiro montenegrino Schneider, que atuava no Inter na época. Com atletas renomados no elenco, como Ruben Paz, Fernandes e Caíco, o time colorado era treinado por Enio Andrade, técnico que conduziu o Inter ao título brasileiro invicto em 1979. Na partida, o time de Montenegro abriu o placar, mas o Inter virou e acabou vencendo por goleada.
O Mandarins e sua contribuição para o futsal
Em 1976, foi fundado em Montenegro o bloco de Carnaval “Primeira do Vale”, no Clube do Comércio. Em paralelo, foi criado um time de futebol de salão, a fim de disputar o tradicional campeonato do Taninão, o mais forte da cidade na época. Logo em sua estreia, o time se sagrou campeão do certame. Na sequência, o Clube do Comércio começou a exigir que os membros e jogadores do bloco fossem associados do clube.
Isso colocou em xeque a continuação da equipe, já que alguns atletas não eram sócios. No entanto, em 1977, Norberto Nogueira da Silveira, o Beto Chapéu, um dos fundadores do bloco e do time, decidiram deixar o clube e fundaram a Bateria Independente, escola de samba muito conhecida na cidade. Naquele ano, a equipe de futsal disputou a competição do Taninão pela Comauto, e levantou a taça mais uma vez.
Então, Beto Chapéu e outros integrantes resolveram fundar o Mandarins, time de futsal que marcou época na cidade até o final da década de 80. Pela terceira vez seguida, a equipe conquistou o título do campeonato do Taninão em 1978. O tricampeonato fez a equipe buscar alçar voos mais altos, e então, o Mandarins foi filiado à Federação Gaúcha de Futebol de Salão.
Além de campeonatos adultos, o time começou a trabalhar com as categorias de base (infantil, infanto-juvenil e juvenil). “Nessas faixas etárias tivemos mais sucesso. No adulto, nunca conseguimos chegar a uma final estadual. Eram oito times na final. E o juvenil, que foi a melhor coisa que aconteceu no Mandarins, chegou a três finais”, relembra Beto Chapéu.
“O trabalho foi muito bem feito e deu resultado. Fazíamos frente a Grêmio, Inter, Gondoleiros e Vale, que eram os melhores times da época. O maior legado foi formar pessoas boas no município. Tiramos vários jovens das bobagens, do caminho ruim, das drogas”, complementa Beto.
Como Montenegro se tornou a Capital Gaúcha do Vôlei
Entre as décadas de 1970 e 1990, Montenegro respirava voleibol. A história começou, de fato, em 1972, como relembra Celso Orth. Primeiro como Riograndense, com um trabalho “voluntário” de atletas e treinadores. “A gente gostava, a doação era dos dois lados. O benefício era por gostar de fazer aquilo. Foi um projeto que foi crescendo, crescendo…”, conta Celso.
Seu irmão, Cilon Renato Orth, foi um dos treinadores mais importantes do voleibol gaúcho. Enquanto Celso treinava a equipe feminina do Riograndense, Cilon comandava os homens. Os treinos do masculino aconteciam à noite, após a aula (da faculdade) dos atletas, que chegavam às 22h30. Treinavam até meia-noite e meia.
Os frutos da dedicação e do amor ao esporte começaram a ser colhidos no início da década seguinte, com o bicampeonato estadual conquistado em 1981 e 1982. “O título era impensável naquela época. Ganhar da Sogipa, com o tamanho do clube, e nós sem estrutura nenhuma. Muitas vezes o treino era feito dentro do salão social do Clube Riograndense. Enquanto o pessoal estava fazendo festa, a gente tinha jogo sábado à noite, em Bento Gonçalves, Passo Fundo… E cada time, masculino ou feminino, viajava numa Kombi, e não se conseguia colocar 12 atletas. Iam 10 jogadores e o treinador, e um ainda dirigia a Kombi”, recorda Celso.
Vôlei destaque mundial
“Existia um compromisso dos atletas, que eles mesmos regulavam. Não deixavam ninguém sacanear, nem deixar de treinar. Eles se policiavam e policiavam os outros. Tinham uma disciplina muito grande, mesmo sem terem ‘benefício’. O vôlei foi crescendo por causa disso, porque as pessoas envolvidas eram extremamente dedicadas. Pessoas que eram líderes dentro daquela turma de amigos”, acrescenta.
O amor e o envolvimento pelo time foram se espalhando pela comunidade montenegrina. O ginásio do Domingão lotava sempre para os jogos da equipe. Quando o Riograndense atuava fora de casa, os torcedores alugavam ônibus para acompanhar. “A saudade bate porque foi uma coisa inovadora, de dedicação, de gostar daquilo, de se cuidar para poder jogar. Era um grupo especial”, enaltece Celso Orth.
O ex-treinador lembra que a equipe montenegrina tinha atletas convocados para a Seleção Brasileira, como Dirceu no masculino e Cíntia no feminino. O projeto mudou de status oficialmente em 1988, com a profissionalização do time, que passou a se chamar Frangosul. A partir daí, os treinos aconteciam todos os dias, duas vezes por dia – manhã e noite.
Na temporada 1991/1992, a Frangosul ficou entre as quatro melhores equipes do mundo. Além de dominar o Estado, a equipe montenegrina foi vice-campeã brasileira em 1991 e medalha de prata no Sul-Americano daquele ano.
Em 1987, Celso Orth precisou escolher entre o vôlei e a odontologia. “Eu não estava conseguindo conciliar. Foi uma das decisões mais difíceis da minha vida, mas tinha que optar. Largar o glamour do vôlei para um consultório onde eu não tinha cliente. Foi bem punk, uns cinco anos até me estabilizar. Foi uma decisão difícil, mas tive sorte. O mercado do vôlei praticamente zerou, e a odontologia cresceu”, declara.
Para o ex-treinador, o grande legado do projeto do Riograndense e da Frangosul foi ajudar na formação da educação de muitos jovens, que se espelharam no modelo de disciplina e dedicação que levaram aquela equipe tão longe. “Moldar essas pessoas acho que foi o mais importante. Claro que nos moldamos juntos, aprendíamos com eles. Brigamos para ganhar, juntos”, completa.
Montenegro, a capital gaúcha do voleibol na década de 80
Ponteiro da equipe desde o início do projeto, Luiz Fernando de Oliveira fala com orgulho dos tempos de glória do Riograndense. “O time foi crescendo com o passar dos anos, e o sonho do nosso líder, o Cilon, foi tomando forma e nos ‘contaminando’ positivamente. Nos comprometemos tanto nos treinamentos, como nas vésperas dos jogos, e os resultados vieram”, ressalta.
Além do sonho e da disciplina, outro aspecto foi fundamental para o sucesso do time montenegrino nas quadras: o espírito de equipe. “Do companheirismo germinou a amizade e tornou-se uma irmandade entre nós jogadores. Durante os jogos, todos se ajudavam. A vitória ou a derrota sempre foi responsabilidade de todos, não havia espaço para estrelismo”, valoriza Fernando.
Nas competições estaduais, o ex-jogador relembra que, com exceção da Sogipa e da Ginástica, de Novo Hamburgo, o Riograndense vencia todos seus adversários. O técnico Cilon Orth desafiava o grupo constantemente, recorda. “Ele dizia que éramos capazes, mas se desviarmos dos maiores confrontos, nunca cresceremos. Falava que os desafios são as oportunidades de nos conhecermos e evoluirmos. E assim, com Cilon nos capacitando técnica e mentalmente, passamos a vencer a Ginástica e, logo em seguida, a Sogipa, que pensávamos ser imbatível”, salienta.
Após o bicampeonato gaúcho do Riograndense no início da década de 80, Montenegro foi intitulada a capital gaúcha do voleibol. Grande líder daquela equipe vitoriosa, Cilon Orth é considerado um exemplo para os atletas. “Além de ter sido um excelente técnico, os considerávamos nosso segundo pai. Nos deixou muitas lições de vida. Nós, que tivemos a oportunidade de viver tudo aquilo, carregamos com muito orgulho e gratidão seus ensinamentos, para nossas vidas pessoais e profissionais”, completa Luiz Fernando.