Embora os institutos de pesquisas indicassem uma aproximação entre Fernando Haddad, do PT, e Jair Bolsonaro, do PSL, na reta final da campanha, pouca gente acreditava que seria possível reverter o quadro. Os números dos institutos, porém, estavam certos. O capitão venceu, mas por 55,13% dos votos contra 44,87%, uma diferença bem menor que a registrada nas semanas anteriores e esperadas pela militância. A ausência do presidente eleito em debates e a adesão de lideranças derrotadas no primeiro turno resultaram em alguns apoios, mas o antipetismo, fruto da corrupção nos governos Lula e Dilma, falou mais alto. Jair Messias Bolsonaro chega ao governo, dia 1º de janeiro, como o primeiro representante da “Extrema-direita” após a redemocratização do país, em 1985. Como disseram os seus defensores nas ruas, ele fará um governo liberal na economia e conservador nos “costumes”. Para vencer, o “mito” semeou promessas, como o combate inclemente à violência, o fim dos “ratos” nos cofres públicos, a redução de impostos e da burocracia ao setor produtivo. Seus eleitores, que atuaram como “pedras” nos últimos quatro anos, agora estarão do outro lado, como “vidraças”. A sociedade vai cobrar! Melhor já irem se acostumando.
Oposição – Jair Bolsonaro terá, contra si, uma oposição feroz e articulada. A mostra foi dada já no domingo à noite, quando Fernando Haddad titubeou em cumprimentar o oponente e Guilherme Boulos, o ex-candidato do PSol, convocou uma grande manifestação para hoje. São comportamentos nocivos à Democracia. É preciso respeitar a vontade da maioria que, dentro das regras que norteiam a República, levaram à eleição de Bolsonaro.
Serenidade – Basta analisar os números para entender que Bolsonaro terá chuvas e tempestades a enfrentar o governo. Somando os votos do segundo colocado com os brancos, os nulos e mais os 31,3 milhões de brasileiros que sequer foram às urnas, 60,1% dos eleitores não votaram nele. É uma massa gigantesca, que também será atingida pelas ações do governo e certamente reagirá a seus erros e acertos. Logo, seria prudente um apelo à serenidade também da parte dos vencedores.
Apoios – Não custa lembrar que a maior parte das promessas de campanha só sairá do papel com o aval do Congresso Nacional. Por exemplo, a flexibilização da lei sobre as armas e a maior liberdade para as polícias atirarem para matar nos confrontos com assaltantes e traficantes. Contando com o próprio PSL e com os partidos que já acenaram o apoio ao seu governo, o presidente eleito Jair Bolsonaro, conta com os votos de apenas 136 deputados e 25 senadores. Para aprovar matérias de quórum qualificado, como uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), são necessários 308 votos na Câmara e 49 no Senado.
Representação – Como ocorre cada vez que um partido novo chega ao poder, a grande dificuldade, muitas vezes, é definir quem manda. Esta deve ser uma preocupação imediata do PSL, uma legenda nova, com poucos nomes conhecidos. Mais ainda porque os apoios a Bolsonaro, em maior parte, são apartidários. Agora que venceram a eleição, “tem que organizar isso”. Afinal, quem representa o novo governo?
Como assim? – Os eleitores de Jair Bolsonaro são, em grande maioria, pessoas honestas, revoltadas com a corrupção. Por isso, alguns já estão reclamando da escolha do deputado federal gaúcho Onyx Lorenzoni para a chefia da Casa Civil. No ano passado, ele admitiu publicamente ter recebido, de forma irregular, dinheiro da JBS para a campanha de 2014.
O PSL não pode – nem deve – se comportar como se fosse o proprietário da ética. Entre os eleitores de Fernando Haddad, há muita gente honesta, que sequer teria votado no PT não fosse o discurso virulento do presidente eleito, com ataques a gays, negros, índios e até mulheres. Estas pessoas ainda têm medo.
Posse – Ontem, nas redes sociais, alguns eleitores do 17 pareciam desconhecer que, num primeiro momento, a legislação deve mudar apenas para a posse de armas e não para o porte. Bolsonaro prometeu que os brasileiros poderão tê-las para defender a casa e a família e não para carregá-las na cintura. Tem gente que entendeu errado.
Consensos – Ainda que tenha dito, durante a campanha eleitoral, que não fará concessões aos partidos em troca de apoio, na prática, Bolsonaro terá de dialogar e abrir espaço a aliados no governo. Se as bases forem honestas e houver transparência nos acordos, não há problema. Na Democracia, é preciso saber construir consensos.
Provocação
A agressividade – de lado a lado – registrada nas redes sociais durante a campanha ainda não arrefeceu. Petistas e eleitores de Bolsonaro adotaram a vitimização e o deboche como discursos. Dizer que a eleição foi roubada devido às fake news é duvidar da inteligência das pessoas. Ao mesmo tempo, afirmar que o PT será varrido do mapa é uma demonstração de arrogância incompatível com o novo momento político.
Aprovadas
Muito criticadas no primeiro turno das eleições, as urnas eletrônicas passaram com louvor em mais um teste. Bastou a Justiça Eleitoral fazer o seu papel e “enquadar” os espertinhos que simularam as fraudes denunciadas no dia 7 que elas simplesmente desapareceram.
Transição
A transição para o novo governo, que inicia seus trabalhos imediatamente, levou o presidente Michel Temer a criar 50 cargos remunerados no governo federal para acomodar temporariamente a equipe de Jair Bolsonaro.
Mudar ainda é a regra
Único estado brasileiro que nunca reelegeu um governador, o Rio Grande do Sul manteve a regra neste domingo, ao provocar nova alternância no poder, com a eleição de Eduardo Leite (PSDB). A vitória do candidato tucano já era esperada. As pesquisas de intenções de voto indicavam que a vantagem seria superior a 10%, mas a rápida adesão de José Ivo Sartori, que buscava o segundo mandato, à campanha de Jair Bolsonaro à presidência, nivelou a disputa. O voto “Sartonaro” beneficiou governador, que possivelmente teria virado o jogo se houvesse mais uma semana de campanha. Leite chega ao Palácio Piratini com os votos de 53,62% dos gaúchos, contra 46,38% do seu oponente.
Popularidade – Chamou a atenção, durante a apuração, a expressiva votação que Eduardo Leite fez em sua cidade. Prefeito de Pelotas entre 2013 e 2016, obteve mais de 90% dos votos de seus conterrâneos, provavelmente algo inédito na história da política gaúcha. Significa que foi um bom gestor e reforça a esperança de que conseguirá tirar o Rio Grande do Sul do atoleiro em que se encontra.
Cenário favorável – A derrota de José Ivo Sartori (MDB) é a rejeição a um governo lento, que passou quatro anos numa tentativa infrutífera de renegociar a dívida do Estado com a União. É difícil entender que não tenha saído acordo ainda, quando o governador e o presidente da República são do mesmo partido. Aliás, também é do MDB o ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, braço direito de Michel Temer, e o seu principal representante na Câmara, o deputado federal gaúcho Darcísio Perondi. Aliados não faltaram.
Respeito – Sartori talvez entre para a história como o governador que tentou colocar a casa em ordem e, por isso, deve ser respeitado. Só que não conseguiu. Os servidores continuam recebendo religiosamente com atraso e os investimentos em infraestrutura são quase nulos. Era de se esperar que, diante de um quadro tão grave, o eleitor buscasse outro “tratamento”.
Sem base – Eduardo Leite tem apenas 33 anos, o que o torna o governador mais jovem da história do Rio Grande do Sul. E assim como o presidente eleito, Jair Bolsonaro, está longe de ter uma bancada forte no Legislativo. Ele assumirá contando com apoio de 19 parlamentares e precisará negociar a adesão de mais partidos para passar seus projetos. Para uma lei comum, cuja aprovação requer maioria simples, são necessários 28 votos. Vai ter de negociar.
Baixando o nível – Diferente da campanha para a presidência, marcada pelas fake news nas redes sociais desde o primeiro dia, a disputa pelo Palácio Piratini transcorreu em alto nível no primeiro turno. Contudo, nas últimas semanas, com Sartori atrás e diante de uma derrota iminente, alguns de seus apoiadores resolveram baixar o nível. Principalmente pelo Whats app, distribuíram mensagens apelativas contra o oponente. Algumas, inclusive, de caráter pessoal
Reforma – Mesmo que o presidente eleito tenha ficado com José Ivo Sartori no segundo turno, espera-se que, uma vez empossado, Bolsonaro trate os problemas do Rio Grande do Sul de forma “republicana”, superando as diferenças partidárias com o governador. O capitão já disse, em alguns discursos, que estados e municípios devem ter maior autonomia. Quem sabe, através de uma ampla reforma tributária, que não drene até Brasília quase tudo que é arrecadado em impostos e depois devolva somente algumas migalhas.
Recorde
A votação de Jair Bolsonaro em Montenegro foi recorde. No primeiro turno, ele já havia conquistado 55% dos eleitores, contra 19% de Fernando Haddad. Domingo, somou 67%, enquanto o candidato do PT obteve 33%. Proporcionalmente, o crescimento do petista foi maior.
Repetição – Na votação para o governo do Estado, Eduardo Leite e José Ivo Sartori ficaram muito próximos no dia 7 de outubro. O tucano foi o primeiro colocado, com 36%, ao passo que o candidato à reeleição obteve 32%. Desta vez, a diferença pró-Leite foi quase a mesma, de 53% a 47%, índices que praticamente repetem o resultado final do pleito.
Omissão – Destaque negativo, mais uma vez, para o elevado índice de abstenções. No segundo turno, 10.048 eleitores de Montenegro simplesmente não foram votar. Eles representam 21% do total de pessoas aptas. É o dobro da média dos demais municípios da região.
De lavada
A votação expressiva de Jair Bolsonaro em Montenegro nem se compara, proporcionalmente, a de outras quatro cidades da região, onde o capitão obteve mais de 80% das indicações. São elas, na ordem: Tupandi (83,75%), Bom Princípio (83,26%), Pareci Novo (82,29) e São José do Hortêncio (82,13%). O melhor desempenho de Fernando Haddad, na região, ocorreu em Capela de Santana, onde fez 41,17% dos votos.
Margens menores
Já na disputa pelo governo do Estado, o candidato José Ivo Sartori foi o vencedor em 14 das 20 cidades da região. Seu melhor desempenho ocorreu em São José do Hortêncio, com 69,94% dos votos. Eduardo Leite teve seu melhor resultado em Capela de Santana, com 57,34% das indicações. Em Maratá, onde o prefeito é do seu partido, ele venceu com uma margem pequena: 53,96% a 46,04%.