Uma história inverossímil

Avô e neto assistem ao Jornal Nacional. O menino, com as mãos cruzadas sobre o colo. O avô, com os olhos fixos no Willian Bonner. Nem pisca. Até que… Vô! – fala o menino. O avô – avô precoce diga-se: os filhos têm filhos muito cedo! – levanta a mão como quem pede silêncio. Netos não respeitam mais avôs como antigamente.

– O que é política?

– Política? – o homem repergunta. Pensa um pouco e responde: – a arte de gerir o bem comum. O menino fica frio, de olho nas notícias. De repente:
– E por que este ministro Fachin quer processar tantos políticos se eles só fizeram o bem comum?

A conversa tomou um rumo incômodo. Não se debate política com um menino de onze anos.

– Bom… eles não representam a verdadeira política – respondeu.

O menino ficou firme. Um beiço sério, como o assunto exigia. Passaram-se minutos. Pareceu que o assunto morrera. Mas… – Vô?, e o avô levantou os olhos pro céu. – Sim?

– Sabe o que eu acho?

– Não sei, guri. Diz pra mim o que tu acha.

– Acho que política é um serviço. Um serviço que o cara presta pra sociedade. Como um produto que ele vende.

O velho (não tão velho) encheu as bochechas de ar e ficou pensando. Um produto?

– Sabe Vô, assim ó: ele vende para o povo sua maneira de gerir. Como o jogador de futebol vende seu jogo. Como um padre vende sua crença. Um político vende a mesma coisa: uma coisa que não dá pra pegar. Uma ideia.

– Uma ideia… disse o avô olhando pela primeira vez para o neto.

– Isso Vô. Ele vende uma ideia. Não é como vender um carro, uma geladeira, uma casa. Ela só precisa funcionar na cabeça de quem compra. Daí fica fácil de enrolar.

– Mas existe quem faz política por ideal…

– Existir, existe. A gente só não tá vendo.

O velho (não tão velho) deixou o queixo cair. – Ô menino… as coisas não são bem assim…

– São sim Vô! Olha só: quem não tem nada de útil a ofertar à sociedade, começa a vender o que não tem sentido. Olha só quanto jogador de futebol, quanto pastor tem na política.

– Ah, mas tem empresário também. Gente das coisas úteis.

– Ah, tem! Por quê? De quem é o dinheiro público, Vô?

– É de todos – responde o avô, meio atônito.

– Então, o que é de todos não é de ninguém. Eles entram na política para criar leis que facilitem seus negócios. Daí o dinheiro que não é de ninguém passa a ser deles.

– Não posso acreditar que tu, com onze anos, não creia no idealismo.

– Eu creio, Vô. Só não o vejo! Para muitos, a política é só uma forma de ganhar a vida sem dar nada em troca. Nem mesmo um ideal. Até o partido mais idealista do país se afoga na lama.

– Eu…

– Tá, Vô, deixa assim. Olha lá o Sérgio Chapelin.

– É o Willian Bonner.

– Que diferença faz, Vô?

É, pensou o velho (não tão velho), ter onze anos não é mais como antigamente.

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