O céu é vasto. No céu, cabem todos os nossos sonhos, todos os pesadelos. As estrelas, que veneramos por seu brilho; pelo desenho das galáxias em forma de urso, de cão ou de um lendário caprino a quem damos uma admiração ignorante e mística. A lua, a que conferimos uma dimensão poética por iluminar o terror da noite. E o sol, cuja trajetória na abóboda nos dá mais ou menos luz, mais ou menos calor, de acordo com seus ciclos. O céu é vasto. Nele cabem todos os nossos sonhos, todos os pesadelos.
Pois esta semana, a ciência mostrou um pouco mais de nossa insignificância perante o universo. Clareou no justo momento em que sóis e estrelas estavam sendo absorvidos por um mega evento galáctico; com as luzes que estavam morrendo sugadas por um abismo, a exuberância do nosso poder em compreendê-lo, em significá-lo perante a existência. Fotografamos um buraco negro. Nada menos. Um monstro engolidor de universos. O Hades, o verdadeiro inferno. A singular força que um dia nos tragará, fazendo sumir no nada tudo que um dia foi Pedro, foi João, foi Maria, o amor entre nós e o ódio. O que foi Jair, a merda toda.
O inferno é somente outro lugar orbitando no céu. Um buraco. Negro.
Eis a ciência, esta arte elaborada por um cérebro que se construiu para compreender o mundo. Ela afirma: nada é simples; tudo é complexo. Além da vida, nada nos faz carinho. Tudo é depredação, explosão, vazio, fim. Só a vida dá sentido à beleza. Só a vida sorri. Só a vida é essa teia de prazeres e pecados, só a vida é um beijo profundo, um abraço, uma lágrima sentida. Só a vida sente orgasmos. Fora disso, é o caos, um infinito buraco negro a beber a luz e a terra, o equilíbrio, o que existe e o que não.
Quase no limiar do céu, há 55 milhões de anos luz, há um diabo bebendo e se embriagando com a luz do mundo. E é só um deles. Há outros. Não afeta nossa geração nem as vindouras. Muito antes de sermos tragados por ele, nosso sol se apagará, como uma lamparina de rua do século XIX, como uma vela no quarto de um leitor solitário de uma casa perdida no meio do nada. Um dia, um bom livro, um bom poema, um grande amor serão interrompidos ao meio. Um dia, a vida se resumirá a uma luz que escoa para um sumidouro, como para uma fossa, um buraco, negro e fétido. Nesse dia, a História entrará em seu redemoinho derradeiro. Mas, não antes. Não antes! Antes faremos de tudo para manter a vida viva. O que perdemos nesta geração, depositaremos como esperança na próxima.
Provou-se o que predissera Einstein, há 100 anos. O lado sério do mundo continua e continuará seu caminho em busca da verdade. Vez em quando, teremos algum retrocesso. Mas tudo passa. E esse momento também passará. Se compararmos com a Idade Média, até que estamos indo rápido. Na velocidade antiga, levaríamos cem anos para cada passo.
A ciência, com suas descobertas, reafirma que a humanidade é a única luz perene, que se reacende dia após dia, noite após noite, caos após caos, loucura após loucura. Temos quase um tempo cósmico para acertarmos o passo antes que o céu, residência de todas as metáforas e todas as realidades, nos apresente ao grande demônio que mora lá, predador do apocalipse.
Se, porém, afirmarem que os Buracos Negros são planos, poderemos ser tragados por um em breve. E serão outros mil anos de trevas até um novo Renascimento.