Visto e revisto

Tirar o visto americano é uma viagem por si só. Uma experiência emocionante, com direito a friozinho na barriga, de fazer inveja às mais radicais montanhas-russas.
Nada é simples: desde a fotografia para o visto, que tem de ser assim, assada, sem sorrisos, óculos, adereços, nem um fio de cabelo na testa. Orelhas aparecendo. Depois da foto e do (enorme) formulário, finalmente, vias de fato: a entrevista.
Para entrar no Consulado, temos que nos despir de todos os pertences eletrônicos e, cá entre nós, ficar sem celular hoje em dia é quase o mesmo que andar nu. Só você mesmo e seus documentos; no meu caso, nada de bolsa, apenas o marido a tiracolo, com seu próprio visto para dar uma forcinha no meu. A primeira conferência de documentos se dá, ainda, na agência de viagens. Antes de passar pela porta do Consulado, uma segunda. E daí, na entrada do prédio, a primeira revista, a segunda revista e a terceira conferência de documentos. E, apesar de não haver mais nenhuma inspeção, a gente segue sob as vistas das câmeras e dos vigilantes: “É pra minha segurança”, penso, enquanto disfarço, observando quem me observa sem disfarces.
Depois dessa maratona, aí sim, o chamado à fatídica entrevista. Um americano sorridente perguntou quais as minhas intenções lá nos Esteites. Passear, ufa! Passear é bom; sorriso é bom. Oh, God! E seguiu perguntando:
– Vocês têm feelyes?
– Oi?
– Feelyes?
Olhei para o meu marido como quem pergunta “O que é feelyes?”, como quem diz “me ajuda!”. O olhar dele me respondeu que, apesar de tanto curso, de tanta conversação, não entendia, não sabia.
O americano empurrou a cadeira para trás, eu achando que ele havia desistido, cochichou com alguém e voltou sorrindo:
– Fil-lhos. Vocês têm fil-lhos?
– Ah! Filhos? Sim, sim, dois.
Sorrimos ainda mais depois que ele nos disse que os vistos estavam aprovados! O meu e os dos “fil-lhos”.
Depois do visto, é só relaxar, torcer para o dólar cair e conhecer uma nova cultura, viver outros costumes. Deixar o chimarrão de lado por alguns dias, afinal eu é que vou não fazer como as minhas amigas e arriscar ter de explicar ao Tio Sam o que estou fazendo com erva e bomba dentro da minha mala.

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