Imagine uma pessoa que te deve um dinheiro – bastante dinheiro – que você contava para resolver problemas importantes. Essa pessoa passa anos enrolando. Quando finalmente encontra um jeitinho de pagar, se acha no direito de impor condições. Diz que só paga, se você abrir mão de juros, correção monetária ou qualquer valor adicional sobre o empréstimo. Ainda tem a audácia de dizer onde você vai gastar parte do dinheiro que ela finalmente está pagando. É mais ou menos isso que está fazendo o Governo do Estado com as prefeituras para quitar a dívida da Saúde contraída entre 2014 e 2018.
No caso de Montenegro, devem ser pagos R$ 2,56 milhões. É menos do que consta nas tabelas da secretaria municipal de Saúde, que calcula que deixou de receber R$ 2,73 milhões em programas como a Assistência Farmacêutica Básica e as Equipes da Saúde da Família (ESF’s).
Não bastasse a discrepância, que ainda terá que ser buscada posteriormente, a Prefeitura ainda precisou aceitar abrir mão dos juros e da correção monetária. Na avaliação do governo municipal, foi o equivalente a cerca de R$ 400 mil que deixarão de ser recebidos. Com a faca no pescoço, o Município aceitou a condição sob pena de passar ainda muitos anos até receber o pagamento integral. É uma revoltante realidade.
E tem mais. O Governo do Estado determinou que parte do dinheiro pago terá uma destinação certa. Pelos menos 20% do que vier deverá ser usado pra custear um novo programa, o “Cirurgia+”, que visa atender a demanda represada de consultas, exames e cirurgias do Sistema Único de Saúde. Não há dúvida de que o programa é importantíssimo, mas essa forma de custeio é questionável. É o devedor determinando como que o credor terá que gastar um dinheiro que, enfim, recebeu. E o devedor faz isso, ainda ganhando as glórias por ter criado a iniciativa em prol da população.
Ninguém aqui está negando que é ótimo que o governo estadual esteja se recuperando financeiramente; conseguindo pagar um pouco do que deve. Mas o formato como está fazendo isso, mais uma vez, prejudica o lado mais fraco. É injusto que as prefeituras tenham que aceitar tais condições.
A 1ª experiência com as emendas impositivas
Até se tentou um movimento, na Câmara de Vereadores, para unir valores individuais de emendas impositivas em algum investimento de maior porte em Montenegro. Acabou não vingando. Camila Oliveira (Republicanos) contou que, pensando no atendimento ao interior, entrou em contato com a secretaria de Desenvolvimento Rural e soube que a compra de uma motoniveladora poderia virar o jogo na manutenção das estradas. Mas a aquisição gira em torno de R$ 600 mil. O vereador Ari Müller (PP) aceitou abraçar a pauta com ela; e o então suplente do PDT, Onório Motta, também disse topar. Porém, ainda faltava dinheiro e os demais parlamentares já tinham se comprometido com outras demandas. Felizmente, em visita a Montenegro, o deputado federal Ubiratan Sanderson (PSL) viu a correria e prometeu tentar viabilizar a compra com verbas federais.
No geral, quem se destacou na divisão do dinheiro municipal foi o vereador Felipe Kinn (MDB). Ele foi o que mais “pingou” recurso em ações diferentes. Foram seis. Vários grupos pela cidade – do Tradicionalismo ao Esporte – foram contemplados com suas emendas e, agora, “devem essa” ao parlamentar.
Dos dez vereadores, Paulo Azeredo (PDT) acabou sendo o único que, devido à licença que tirou, não conseguiu que fossem protocoladas suas emendas ao orçamento. Perdeu o prazo. Foi justamente ele um dos principais responsáveis pela criação do dispositivo nesse ano.
Convite montenegrino
Luciano Hang, dono das Lojas Havan, recebeu da vereadora Camila Oliveira (Republicanos) um ofício convidando a empresa para instalar uma loja em Montenegro. O documento foi assinado pelo prefeito Gustavo Zanatta e pelo secretário de Indústria, Comércio e Turismo, Waldir Kleber. A entrega aconteceu na inauguração da nova loja da marca, em Canela.
Transparência
Indicação protocolada pelo vereador Gustavo Oliveira (PP) sugere que a Prefeitura estude a implantação de um sistema de rastreamento dos seus veículos. A ideia é tornar os dados da frota do Município públicos; disponibilizando informações como localização em tempo real, velocidade e consumo de combustíveis desde as máquinas grandes até os carros pequenos. O parlamentar defende que será “uma forma de controlar os desperdícios com o dinheiro público”.
Complicou
A Comissão de Ética da Assembleia Legislativa aprovou, na última semana, o relatório que pede a cassação do mandato do deputado estadual Ruy Irigaray (PSL). Dentre os eleitos, ele foi o segundo parlamentar mais votado em Montenegro, conquistando 594 eleitores; atrás apenas de Luciano Zucco, do mesmo partido, que teve 1.265 votos. Uma ex-assessora de Irigaray o acusa de usar funcionários do gabinete, pagos com dinheiro público, para fins pessoais. O relatório, agora, vai pra Comissão de Constituição e Justiça do Legislativo e, então, pra votação no plenário.
Pouco discutido
Além da autorização para que o Município abra mão de quase R$ 400 mil para receber o pagamento da dívida do Estado, a Câmara de Vereadores aprovou, na quinta, outro projeto que deveria ser mais debatido. Ampliou a faixa de financiamento do Avançar Cidades, que permite que a Prefeitura faça empréstimo de até R$ 20 milhões para a pavimentação de ruas. A dívida será paga durante vinte anos, a partir de 2026. E não é sobre questionar a capacidade de endividamento do Município ou a importância de ambos os textos, mas são assuntos que mereceriam uma discussão mais profunda perante a comunidade. Foram os dois aprovados por unanimidade e sem discussão. Os parlamentares apenas debateram os temas nas reuniões da CGP e do Câmara em Pauta; ambas fechadas ao público em geral.
Um novo presidente
Em seu primeiro discurso após ser eleito como presidente da Câmara de Vereadores, Talis Ferreira (PP) destacou como sua carreira no Legislativo, ao longo de cinco anos, foi uma construção até o novo desafio. E acompanhando essa trajetória é possível ver, sim, como o perfil do parlamentar mudou com o passar do tempo. O comportamento do progressista parece bem mais agregador, tanto que seu nome foi caminho para um consenso, entre os vereadores, sobre quem assumiria a mesa diretora. Mais cedo neste ano, Felipe Kinn (MDB) também tinha colocado o nome à disposição mas, dialogando, foi feito acordo para viablizar apenas a chapa única. Preservou uma certa harmonia no poder.
Quem não gostou muito desse processo de “escolha”, porém, foi a vereadora Camila Oliveira (Republicanos). Ela revelou na tribuna que foi deixada de lado no processo decisório; e disse que só não se absteve de votar em respeito a vereadora Ana Paula Machado (PTB), que integra a chapa como a 1ª secretária. A republicana já tinha indicado interesse em assumir o Legislativo e defende que, no futuro, ou ela ou a colega, como mulheres, assumam o cargo.