Para onde foi o bom senso?

Tenho me feito esta pergunta muitas vezes nestes últimos meses. Cada vez que entro nas redes sociais, percebo que os sentimentos que nos tornam humanos desapareceram. Ofensas de todos os tipos, palavras de baixo calão e toda a sorte de xingamentos. Parece que ninguém mais sabe como discutir idéias e opiniões sem destruir a imagem do outro. Tempos muito estranhos.

Para entender um pouco deste “novo normal” talvez tenhamos que analisar o que aconteceu politicamente no nosso país na última década. Desde 2013 vivemos uma crise política marcada pelos protestos de junho de 2013, os panelaços antigoverno, o impeachment de Dilma Rousseff (2016), a prisão do ex-presidente Lula (2018) e a greve dos caminhoneiros (2018). Muitas das manifestações refletiam o descontentamento e frustração social de grande parte da população. A partir daí a tensão política foi aumentando e atingiu um grau inédito de enfrentamento entre dois polos: esquerda e direita. O centro sumiu.

Um dos gatilhos para a polarização foi a Operação Lava-Jato, com dezenas de políticos da base do governo presos ou acusados de corrupção. Surgiu em parte da sociedade um sentimento antipetista. E o partido que governou o Brasil por quase 15 anos se viu atacado por novos grupos de oposição que clamavam por mudanças. O ápice desta “batalha” foi a eleição do presidente Jair Bolsonaro.

Depois disso, aconteceu o que não imaginávamos neste povo cordato que é o brasileiro: a alegria foi substituída pela fúria desmedida e a tolerância deu lugar à arrogância. Basta o outro ter um pensamento diferente para ser considerado inimigo. Há relatos de pessoas que brigaram com a família, que foram hostilizadas na rua, atacadas por vestirem camisetas associadas a partidos ou que tiveram carros quebrados em carreatas.

E o novo coronavírus chegou para acirrar ainda mais as tensões. Só que agora são os a favor de ficar tudo fechado (e todos em casa) e aqueles que acham que já ficamos recolhidos por tempo demais. Sabemos que o ideal é que os dois lados sejam atendidos. Que se proteja as pessoas do contágio, mas que não deixemos afundar a economia. Os debates, entretanto, não se desenvolvem neste nível aceitável. As pessoas partem para a ignorância e facilmente digitam ofensas e xingamentos.

Podemos comparar este cenário de intolerância ao nosso eterno duelo Grêmio x Inter, onde há torcedores que perdem as estribeiras quando seu time é derrotado. Tanto é verdade que pessoas já foram mortas em virtude desta “paixão cega” que nada vê que não a própria fúria.

O pior é que ainda não falei do racismo, da violência contra a mulher, da intolerância religiosa e de gênero, do bullying, etc. etc.

No que isso tudo vai dar, eu não sei. Está muito difícil “dormir com um barulho destes”. O radicalismo nunca deu bons frutos. Estão aí, na história da civilização, dezenas de exemplos, cujos resultados foram catastróficos para a humanidade. A verdade é que o bom senso, a tolerância e o respeito sempre foram e sempre serão o melhor antídoto contra o vírus da intransigência.

Tenho esperança de que um novo mundo é possível. Acredito neste sonho. E não vou parar de tentar buscá-lo.

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