Um recado perigoso

Há muitos anos, um homem foi condenado à morte porque, durante um assalto, matou um policial. Julgado e considerado culpado, recebeu a pena capital. Seria executado na forca. O sujeito tinha uma extensa ficha criminal, que incluía furtos, roubos, um sequestro e até um estupro. Era o que muitos considerariam um caso perdido. No seu último dia, antes do encontro com o carrasco, perguntaram-lhe qual havia sido o seu primeiro delito e quando fora cometido. O condenado pensou um pouco e respondeu: “Foi aos sete anos, quando ‘peguei’ uma bola numa loja de brinquedos”.

Com algumas variações, muitos de nós ouviram histórias assim, geralmente contadas por pais zelosos como um alerta para que não tomássemos a estrada sem volta da criminalidade. Com razão, partiam do princípio de que não importava o valor do bem que se tirasse de outra pessoa. Roubar uma bala era tão errado quanto bater uma carteira ou desviar dinheiro público de uma estatal. Pena que muita gente não assimilou a lição e se tornou bandido. A situação chegou a tal ponto que certas práticas criminosas já nem são punidas.

Em 2018, um morador de Blumenau (SC) foi pego numa tentativa de furto de um botijão de gás usado no quintal de uma casa. Inicialmente, o réu havia sido condenado a dois meses e 20 dias de prisão, mais uma pequena multa. No entanto, a sentença foi substituída por uma medida restritiva que o impede de sair de casa durante os finais de semana. A Defensoria Pública catarinense recorreu da decisão judicial e, na última segunda-feira (4), o presidente do STJ, ministro Humberto Marti
ns, concedeu habeas corpus e suspendeu a tramitação da ação penal.

A justificativa: o acusado é primário e não possui antecedentes criminais. Além disso, o valor do bem furtado seria irrisório e acabou sendo restituído. O botijão foi avaliado em cerca de R$ 25,00 na época do crime. O ministro Humberto Martins destacou, em seu despacho sobre o caso, que o STJ tem aplicado, em processos semelhantes, o princípio da insignificância. Este é o ponto.

Num país em que todos os dias a gente vê os criminosos do colarinho branco se beneficiando de uma legislação permissiva com quem rouba milhões, parece realmente cruel que o “ladrão de galinhas” fique atrás das grades. Com o dinheiro que roubaram, “os grandes” conseguem pagar excelentes advogados, especialistas em encontrar fissuras no escudo legal que deveria nos proteger contra as safadezas. Infelizmente, parece que a sociedade se acostumou com isso. Um erro grave!

Não sou radical a ponto de defender cadeia para todo e qualquer tipo de crime, mas também não concordo que o autor de um furto, provavelmente o mais leve deles, tenha imunidade. Afinal, alguém foi prejudicado e normalmente as vítimas são trabalhadores que lutaram muito para adquirir seus bens, por mais “insignificantes” que pareçam para alguns togados. Então, ao invés de promover a Justiça, talvez estejamos mandando um recado perigoso para a sociedade: o de que “não dá nada”. E se não dá nada roubar algo “pequeno”, por que parar por aí?

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