Na semana que vem, mais precisamente no dia 24 de setembro, completo 30 anos de jornalismo, todos eles a serviço do Ibiá. Há poucos dias, refletindo sobre aquele começo, dei-me conta do quanto o mundo era diferente e de como a minha própria vida mudou desde então. O cotidiano era analógico e o tempo passava mais devagar. Pouca gente tinha telefone, carro ainda era um artigo de luxo entre os jovens e as opções de lazer, limitadas. Como o presidente Collor havia confiscado a poupança dos brasileiros, a falta de dinheiro preocupava também os mais ricos (ou pelo menos parecia).
Em 1990, eu tinha 18 anos e, pela primeira vez, estudava à noite na Escola São João Batista, onde concluía o Ensino Médio. Já havia feito cursinho de datilografia – se não sabe o que é, procure no Google – e o desejo de trabalhar “com carteira assinada” me levou a trocar de turno. Nessa nova rotina, eu chegava em casa por volta das 23h30. A Viação Montenegro tinha uma linha “colegial”, que me deixava lá em Campo do Meio, tarde da noite. Bons tempos em que a oferta de transporte coletivo no interior era abundante. Hoje nem ônibus tem lá.
No retorno, sempre havia uma refeição quente me aguardando e, na TV, conseguia assistir ainda a um ou dois capítulos da novela Pantanal, exibida pela extinta Rede Manchete. A trama de Benedito Ruy Barbosa era ambientada num pedaço do país que muita gente não conhecia, em meio a cobras, jacarés, aves coloridas e muito gado. Lembro da personagem principal, uma jovem nativa da região, a Juma Marruá, vivida pela atriz Cristiana Oliveira. Nos momentos de perigo, ela virava uma onça “de verdade”.
O sucesso de Pantanal não estava apenas na trama, que girava em torno da vida difícil no Brasil “profundo”, com suas comitivas de peões tocadores de gado. Nem nos triângulos amorosos ou na trilha sonora. Tampouco, nas cenas de nudez nos banhos de rio das suas personagens femininas, relativamente raras na TV aberta de então. O grande diferencial estava na estética. O autor abusou de imagens da natureza, em longos e generosos planos abertos, transformando a própria paisagem em protagonista. Até hoje a produção é considerava um marco na telenovela brasileira e, mesmo assim, pouca coisa boa assim surgiu nesses 30 anos que se seguiram.
Semana passada, vi no noticiário que a Globo fará um remake de Pantanal em 2021. Algumas atrizes, inclusive, já estão se candidatando à vaga de Juma Marruá e produzindo fotos enroladas em cobras, para mostrarem sua intimidade com a vida selvagem. No mesmo site, deparei-me com notícias assustadoras de incêndios que devastam aquele imenso “paraíso”. Até o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sempre generoso e complacente com os piromaníacos, anda reclamando da fumaça. Ela chegou ao céu do Rio Grande, dias atrás, fazendo-nos uma visita e trazendo um grito de “socorro”. A área tostada beira 1,5 milhão de hectares. Assim como a Amazônia, ano a ano, este importante bioma vem sendo reduzido, carbonizado pelo avanço das pastagens e o plantio de novas lavouras.
Que bom que a Globo fará uma nova edição de Pantanal. Tomara que sobrem paisagens suficientes para encher os nossos olhos e fazê-los brilhar com a mesma intensidade de 30 anos atrás. Não havendo punição aos incendiários e políticas eficientes de preservação das matas e dos animais selvagens, em breve, vê-los na natureza será possível apenas na reprise de uma novela. O Brasil mudou muito nestes 30 anos e, às vezes, pergunto-me se foi para melhor. Tenho sérias dúvidas.