Demissão na Guarda: História de injustiças

Essa é uma história de chantagem, de demonstrações de poder e de quebra de hierarquia. Mas, principalmente, essa é uma história de injustiças. Semana passada, o prefeito Kadu Müller exonerou o chefe da Guarda Municipal, Humberto Alencar Minks Reinhardt, que estava no cargo desde janeiro de 2018. O afastamento foi comunicado em entrevista coletiva à imprensa pelo secretário municipal de Administração, Edar Borges Machado, que também havia sido responsável pela sua nomeação. Os dois foram companheiros de farda na Brigada Militar. Borges era coronel e Minks tenente quando passaram à reserva. O motivo alegado: o chefe da Guarda teria cometido um erro ao realizar uma operação de travessia de pedestres na RSC-287, em 22 de março. E não só isso: depois de a Administração Municipal reconhecer que aquilo foi um equívoco, Minks esteve na Câmara e defendeu a ação. Soou como insubordinação, algo que, na caserna, é inadmissível, mas, na Política, é só um movimento no tabuleiro. Porém, a verdade não é tão simples.

Pergunta
Tudo começou no dia 13 de março, quando o vereador Erico Velten fez um pedido de informações ao Executivo. Queria saber se existia alguma possibilidade de a Guarda atuar em conjunto com a Polícia Rodoviária Estadual na travessia de pedestres na RSC-287 nos momentos de pico. Na mesma noite, os vereadores Talis Ferreira (PR) e Rose Almeida (PSB) criticaram a idéia, alegando que a função da Guarda é de segurança patrimonial, ou seja, que se restringia a cuidar dos prédios públicos.

Apenas um “ensaio”
Antes que a Prefeitura pudesse responder, a Guarda fez um “ensaio”, dia 22 de março, no bairro Panorama. Em parceria com a Polícia Rodoviária Estadual, ajudou alunos das escolas Valter Belian e AJ Renner a retornarem em segurança para casa, do outro lado da rodovia. O vereador Talis viu a operação e cobrou uma posição do prefeito através de mais um pedido de informações, assinado em parceria com a vereadora Rose e protocolado no dia 4 de abril.

Especialista
Com a polêmica instalada, no dia 10 de abril, Borges concedeu uma entrevista ao Jornal Ibiá, garantindo que a atuação da Guarda teve amparo legal, pois existe um convênio entre o Município e o Estado, que legitima operações conjuntas. Está no artigo 9º parágrafo 13. Apenas ponderou que não seria possível repetir a ação porque tanto a GM quanto a PRE não tinham efetivo. Como Borges foi comandante do pelotão de trânsito e costuma ser citado como uma das maiores autoridades do Estado no assunto, a discussão parecia encerrada.

Mesmas respostas
Uma semana depois, em 17 de abril, o prefeito Kadu respondeu ao pedido de informações do vereador EricoVelten, dizendo que a Guarda não tinha condições de fazer a travessia diariamente, mas que a atividade do dia 22, na Panorama, estava legalmente amparada por um convênio entre o Município e o governo do Estado, através da Secretaria de Segurança. Em 3 de maio, o chefe do Executivo repetiu a mesma versão na resposta que encaminhou ao questionamento dos vereadores Talis e Rose.

Discurso único
Até então, o governo demonstrava coesão. Todos usando o mesmo discurso, como um mantra. Na segunda-feira passada, dia 6, ocorreu uma reunião na Câmara, ainda sobre o mesmo tema. O tenente Minks, chefe da Guarda, repetiu a mesma história: a corporação agiu dentro da lei, mas não pode fazer novas operações por falta de efetivo. E foi aí que o caldo começou a desandar.

Teatro
Como o vereador Talis, desde o início, havia contestado a legitimidade da Guarda para fazer a travessia e viu seu ponto de vista derrotado pelas declarações públicas do prefeito, do secretário Borges e agora do chefe da corporação, ele resolveu agir. Ainda no dia 6, redigiu um documento renunciando ao cargo de líder do governo na Câmara, deixando subentendida a possibilidade de ir para a oposição. Ao melhor estilo “se não é do meu jeito, não brinco mais”, fez birra e acabou levando. Em 48h, Borges e o prefeito mudaram o discurso, assumindo que teriam cometido um equívoco, e demitiram Minks que, pelo jeito, não quis participar do teatrinho.

Demonstração de força
Uma rápida análise das datas e dos documentos apresentados pelo governo e pelo agora ex-comandante da Guarda mostra que não houve qualquer tipo de equívoco. O que aconteceu foi nada mais do que uma demonstração de força. O vereador Talis sabe da importância do seu voto para garantir a estabilidade do governo Kadu e resolveu testar seu poder. Provou que realmente dá as cartas, a ponto de fazer o chefe do Executivo e um de seus principais secretários se curvarem a sua vontade. O mais frustrante disso tudo é que a única pessoa que tentou fazer algo para tornar a travessia da RSC-287 mais segura foi oferecida em sacrifício no altar da velha política. Lamentável!

Dois pesos e duas medidas
Caso o argumento usado pelo governo para justificar a exoneração do ex-tenente Minks fosse verdadeiro, seria justo argumentar que, antes dele, deveria ter sido demitido o secretário de Administração. E o próprio prefeito deveria ter renunciado ao cargo. Afinal, se a legislação foi mal interpretada, os dois também se enganaram, como demonstram as correspondências ao Legislativo e as entrevistas concedidas à imprensa, não só ao Ibiá, mas também a outros jornais e emissoras de rádio. Na Política, porém, as regras são diferentes e a corda SEMPRE arrebenta no lado mais fraco.

Sinais
Ao ceder à pressão do ex-líder de governo, o prefeito Kadu e seus assessores mais próximos podem até ter garantido a manutenção no poder, embora tenham mandado um sinal para que outros “aliados” ajam da mesma forma no futuro. Por outro lado, deixaram muito claro que perderam as rédeas da Administração e uma boa parcela do respeito que ainda tinham junto ao cidadão montenegrino. Às vezes, é preciso ter coragem para fazer o certo, mesmo que envolva grandes riscos e o preço seja muito alto. No fundo, cada um escolhe como deseja entrar para a história.

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Rapidinhas
Erico Velten acha que o Cenário Político se ocupa demais com as roupas que suas excelências usam ou deixam de vestir e que o melhor seria avaliar as estradas do interior. Ok, mas diz aí: é verdade que o senhor não foi à sessão solene da semana anterior por que não gosta de usar terno e gravata?

Com a demissão do tenente Minks, há fortes indícios de que a Guarda Municipal volte a ser comandada por Clóvis Eduardo Pereira.

Ex-vereadora Iria Camargo não apenas voltou ao PDT como está disposta a representar a legenda na disputa pela Prefeitura. Ela também retornou aos microfones da Rádio América, onde mantém um alegre programa vespertino.

Vereador Joel Kerber (Progressistas) está convencido de que existe uma “conspiração para derrubar o prefeito Kadu”. Não brinca!

Vereador Juarez da Silva (PTB) esteve com o vice-governador e secretário de Segurança, Ranolfo Vieira Junior, na semana passada, pedindo reforço nos efetivos da Brigada Militar e da Polícia Civil. Oremos!

As coisas mudam. Quando o prefeito Kadu assumiu e ofereceu espaços aos partidos na Administração, antigos companheiros lembram que Ari Müller foi uma das principais vozes contrárias à entrada do PDT no governo.

Já são 21 os réus nas dez ações criminais resultantes da Operação Ibiaçá. Mas o número pode aumentar.

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Chapa toda
O vereador Valdeci Alves de Castro (PSB) acha que a Câmara cometeu um erro em 2017, por não ter cassado logo a chapa toda (Aldana e Kadu). É, no mínimo, uma observação curiosa vinda do único vereador que, na época, foi contrário ao Impeachment. Além disso, até as torneiras do prédio do Legislativo, na beira do Rio, sabem que ele só foi para a oposição porque não ganhou o cargo de secretário de Viação e Serviços Urbanos.

Provas – Também é importante lembrar que só caberia a cassação da chapa inteira se o então vice-prefeito estivesse envolvido nas denúncias de fraudes que levaram ao Impeachment. Por sinal, justiça seja feita: nos onze processos resultantes da Operação Ibiaçá, o nome de Carlos Eduardo Müller não é citado.

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