Há perguntas mais valorosas do que respostas. Não tenho dúvidas.
Muitas vezes me questiono sobre ser justamente este o sentido: não haver resposta. Talvez “a resposta” seja um ato, um movimento, um fazer. Entre estas perguntas, há uma, em particular, com a qual me deparo desde a faculdade. Ela fala de cuidado: “Quem cuida de quem cuida?”.
Uma criança recém-nascida, uma doença, um acidente. Todos são motivos para “quebrar” a rotina diária. Muitas vezes, gerando sobrecarga física e/ou emocional e sobrecarregando uma pessoa em particular: o cuidador.
Há pais e mães que dedicam a vida ao cuidado de filhos incapacitados fisicamente ou mentalmente. Filhos que cuidam de pais definhando ao leito de morte. Há quem viva às voltas com aquele familiar imerso no vício.
Profissionais da saúde, que passam a maior parte do seu dia convivendo com a doença, com a dor e o sofrimento humano. Bombeiros, socorristas, policiais, médicos, enfermeiros, que lidam diretamente com a morte, sempre ali à espreita.
Invariavelmente, muitas destas pessoas chegam ao esgotamento. Adoecem, sem se dar conta da sua própria ferida. E quem cuida de quem cuida?
A mitologia grega conta a história de Quíron (Kheíron), o grande centauro. Centauros eram criaturas híbridas, metade homem, metade cavalo. Grandes guerreiros, no entanto, violentos, delinquentes, rudes e abusivos. Quíron, ao contrário, destacou-se pelo dom do ensinamento. Educado pelos deuses Apolo e Ártemis, torna-se um grande mestre em muitas áreas. Bondoso, civilizado e inteligente, lembra da característica de um mestre. Todas as crianças educadas por Quíron se tornam notáveis. Entre elas, Aquiles, Asclépio, Jasão, Ajax, Hércules…
Entretanto, a vida de Quíron não foi de toda sorte. Fora atingido mortalmente por uma flecha envenenada e acometido de uma ferida incurável. Mas como poderia um ser tão notável – que chegou a treinar o próprio deus da medicina – não conseguir curar a si? A única resposta é uma nova pergunta. Uma ferida ensina sobre “a cura” ou sobre “o cuidado”?
Quíron é o curador-ferido, aquele que precisa lamber a própria ferida. Uma imagem daqueles que, através da sua própria dor, do sofrimento, de uma ferida mortal, se tornam melhores. Suas dores os tornam empáticos à dor do outro.
Há algo neste “não respondido” por palavras, mas vivo e pulsante na atitude do cuidado. Algo simbolicamente representado na figura dos centauros. Também somos metade humano, metade animal. Quando feridos, qual “lado” escolhemos mostrar?
Paz e bem!