Aquele costume tipicamente político de aparecer em fotos com o dedo em riste, apontando para alguma coisa, foi muito bem analisado pelo Gerson Kauer, na sua crônica intitulada “Aponte o Dedo” e publicada nesse mesmo espaço, tempos atrás. Segundo ele, a imagem do político com cara séria ou preocupada enquanto aponta para uma planta de obra, ou o horizonte, confere ao mesmo um ar de competência, liderança, próprio de quem sabe o rumo certo a seguir, e que mostra aos seus seguidores, usando o indicador.
Indo além, posso afirmar que o uso do dedo na política não pára por aí. Enquanto os governantes são fotografados apontando obras, a oposição direciona seus dedos para os problemas não resolvidos pelos primeiros. Faz parte da dinâmica política esse embate entre a situação vendendo a ideia que estamos muito bem, e a oposição divulgando o contrário. Assim se constroem os barracos políticos; com discursos inflamados que evoluem para dedo na cara. Esse tipo de atitude já é esperada, portanto, nem surte tanto efeito. Comparando com futebol, seria o mesmo que receber uma trombada; um zagueiro num atacante é lance normal, mas o que pensar se recebesse o mesmo de um estranho, enquanto caminha na rua?
Isso lembra uma crescente mudança na postura da população quando o assunto é protestar por suas demandas. Não se espera mais que um político ou líder sindical faça a frente na hora de organizar uma manifestação. Ao invés disso, a própria população cria a rede de cooperação necessária para dar vida ao protesto e, ainda por cima, tenta evitar que aproveitadores usem a visibilidade resultante em benefício próprio. É a expressão da opinião pública em seu estado mais puro.
O resultado são situações onde políticos se vêem confrontados, até com dedo na cara, por pessoas que apenas desejam ter suas reivindicações atendidas. Não são elas marionetes que foram protestar de ônibus, no centro, em troca de sanduíche e uns trocados; são cidadãos que têm mais o que fazer, mas por descaso ou incompetência do setor público, sentem uma piora na sua qualidade de vida, causada por aqueles que se elegeram prometendo o contrário. Aí, excelentíssimos, não tem paciência infinita.
Acho bom os políticos levarem a sério esse tipo de manifestação. Lembrando que os dedos que hoje lhes são apontados durante as cobranças são os mesmos que digitarão os números na urna eletrônica. E todos sabem que é nessa hora que eles mais sentem a dedada do eleitor.