Entrar no ano novo vai além do ritual da virada, com seus brindes e simpatias nos primeiros minutos. Trata-se de um processo de dias, onde nos desfazemos aqui e ali dos pequenos detalhes que ainda nos prendem ao ano anterior. Primeiro limpando os vestígios do Réveillon, que pode terminar apenas com a descoberta da última rolha, durante o primeiro corte de grama. Mais tarde, segue o desmonte dos enfeites de Natal, onde os pisca-piscas são cuidadosamente enrolados e guardados, na esperança de que funcionem dali uns onze meses. No dia a dia, o ano não começa enquanto não se rasurar a data do primeiro cheque preenchido. E, com o tempo, vamos substituindo o “esse ano” por “ano passado” ao nos referirmos a alguma coisa ocorrida, mesmo que seja há menos de um mês. Assim vamos nos acostumando com o novo calendário na parede.
Dirigindo por esses dias, chamou-me a atenção o adesivo na traseira do caminhão à minha frente. Com a mensagem de ano novo, resumida a uma palavra e um número, o motorista talvez tenta ganhar a simpatia daqueles que ele obriga a reduzirem a marcha nas subidas. Mesmo que ele não tenha essa segunda intenção, a atitude de rodar por aí, distribuindo votos de felicidade estrada afora, merece nossa atenção. Desejar que o ano novo seja melhor para todos pode ser reflexo da nossa consciência de que vivemos em sociedade, e que dificilmente poderemos ser felizes cercados da infelicidade alheia.
Observando bem, o tal adesivo estava desbotado e com orelhas. “Feliz 2018” era o que dizia. Pelo visto o caminhoneiro não deve ter passado pelo processo citado acima, ou é relaxado mesmo. Mas sabe que aquilo até nos faz pensar. Será que os “Feliz 2018” que distribuímos no passado surtiram efeito? Apesar dos votos, podemos mesmo ter certeza de que o 2018 de todos foi feliz? E se a resposta for não, o que faltou? Convicção? Pensamento positivo?
Assim como dizemos “saúde” quando alguém espirra, o “Feliz Ano Novo” também é apenas o desejo de que a pessoa futuramente fique num estado melhor que o atual. Se quiséssemos agir de maneira pró ativa em relação ao bem estar do próximo, ofereceríamos um Naldecon ao invés de uma expressão após ouvir um espirro. Desejar aos outros que o próximo ano seja feliz é mais uma das faces do processo de transição. Não interessa como foi o último. Agora vai!