E se…

Ah, se a gente escolhesse o amor. Se a mente mandasse nos neurotransmissores, ou a taquicardia fosse quando a gente quer, ou borboletas no estômago só ficassem loucas quando permitíssemos. Se o amor fosse mais razão e menos coração. Mais escolhas e menos entranhas. Sofreríamos menos, faríamos sofrer bem menos. Ah, se o amor fosse diferente do que o amor é… Talvez tivéssemos alguma chance contra ele.

Mas a quem queremos enganar? Estamos fadados ao fracasso ao lutarmos contra ele; também o estamos quando lutamos a seu favor. Pode ser até que a gente vença, por fora, mas por dentro ele nos consome e se lambuza, devora almas como se não fossem nada. No fim, estamos à sua mercê.

A paixão é uma droga poderosa e viciante que invade nossos cérebros com suas reações químicas, como quem invade uma praia deserta em que não há defesas, sem pudor, sem vergonha na cara. Apaixonados que somos, despimos a alma e o corpo de preconceitos e vestimos a liberdade e a alegria de compartilhar sinapses de prazer. O prazer nos rege.

Mas paixão não é amor. Paixão arrebata a gente, tira o chão na velocidade da luz e, nessa mesma velocidade, nos devolve a ele, o suficiente para sermos capazes de mínima ponderação. Não, o amor não é tão sensato, não é oito ou oitenta. O amor são infinitas nuances dentro de um arco-íris. Ele é tudo o que não podemos decidir.

E é verdade que não se escolhe. Que a química não é regida por nós e sim somos regidos por ela. Que o coração dispara quando dispara e que não temos o menor controle sobre nada em nossas vidas. Que as borboletas moram no estômago, mas elas obedecem a alguma outra coisa que não a nós.

É verdade, também, que o amor é lindo, embora louco, e faz a gente tomar decisões que a razão nunca aprovaria, mas das quais nos orgulhamos. Só que, às vezes, o amor pode ser corrosivo, tóxico e nem é tão incomum assim. Acho que lutar contra ele é o que há de mais difícil na vida; no caso do amor que machuca, ou se luta a batalha mais dura da vida, ou a gente ainda vai se perguntar “que vida?”. Então, é melhor lutar. Difícil é enxergar.

Como tudo o que o ser humano sente, não existe matemática em nós senão a que explica o caos. Somos um caos de reagentes formando um caos de produtos; como reagimos ao caos leva a outros gigantes caos particulares de cada um. A mente e o coração são capazes das mais complexas mágicas: a paixão, o amor, a luta contra tudo isso, quando necessária. Nunca vamos vencer batalhas sem cicatrizes; só quem as possui conseguirá lê-las. Para os outros, serão incógnitas indecifráveis.

Loucura pensar que buscamos o amor a vida toda, nos apaixonamos inúmeras vezes, e embora muitas dessas vezes não vivamos essas paixões, elas são incontroláveis dentro de nós. Por fora, podemos parecer tranquilos ou satisfeitos. Por dentro, quem é que sabe? Pode ser um buraco negro, uma galáxia inteira, uma estrela grandiosa e brilhante ou a própria anti-matéria. Cada um é um universo novo; cada sinapse um Big Bang. Nebulosas andando por aí, nebulosas. A entropia é a única lei.

Ah, se a gente escolhesse o amor… A vida seria muito mais fácil. A dor seria solucionada com uma pitada de razão. Como num passe de mágica, o desespero daria lugar à calmaria. O amor seria sempre correspondido. Amaríamos quem deveríamos amar, sem drama ou platonismo. Talvez a magia toda acabasse e esse fosse o preço do controle. Talvez fosse uma merda; talvez, a solução.
Ah, e se fosse?
Mas não é.

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