Eu não gosto da voz do Chico Buarque. Aquele jeito modorrento de cantar, o timbre, enfim, a voz do Chico não é do meu agrado, mas também é só isso que não gosto nele. Porque, de resto, poucos artistas foram tão significativos para a música brasileira. Além das belíssimas mulheres que conquistou, seus olhos claros também enxergaram como pouquíssimos um país tropical, abençoado por Deus, bonito por natureza e cheio de problemas e desigualdades.
Chico produziu coisas bacanas e algumas genialidades. “Construção” é um dos maiores discos da história deste país e a música título, com suas 17 proparoxítonas narrando o cotidiano de um operário da construção civil, é uma coisa absurda, para ser ouvida, lida e interpretada para o todo e sempre. Usou a criatividade para escapar da censura, e fez “Apesar de você” parecer uma corriqueira briga de casal.
Chico fez tantas coisas incríveis que até recebeu no seu campinho de futebol ninguém menos que Bob Marley, quando o jamaicano esteve no Brasil. Que vida que tem o Chico Buarque. Só que os tempos são tão estranhos que agora resolveram demonizar o Chico por suas posições políticas, reduzindo-o a um mero “mamador de lei Rouanet”. Logo ele, que sempre foi claro nas suas ideias e concepções de mundo e sociedade.
Mas a que ponto da ignorância nós chegamos? Ninguém é obrigado a gostar de uma música, pintura, peça de teatro, filme, ou qualquer outra manifestação artística. Contudo, desqualificar um conjunto de uma história de décadas e reconhecimento mundial por conta de uma posição política é muito mais que antidemocrático. É aviltante, estúpido, bizarro. Na outra ponta, Alexandre Frota virou uma das vozes de “defesa da família e dos bons costumes”. Se cobro democracia, é necessário que eu aceite estas opções, mas concordar já é demasiado. Um país que troca Chico por Frota não pode dar certo.