Quando as coisas não funcionam, em um estado generalizado e arraigado na cultura de uma nação, ocorre um fenômeno de relativização sobre tudo, onde o básico passa a ser diferencial e o que está acima da média fica elevado a um plano superior. É, na verdade, uma grande confusão. A descrença nas instituições, no Estado democrático de direito, na justiça impessoal e célere leva a este quadro.
Quantas notícias já tivemos de taxistas que devolveram dinheiro a passageiros distraídos; trabalhadores da limpeza que procuraram os donos de objetos valiosos perdidos; cidadãos comuns que imediatamente correm aos bancos porque tiveram na sua conta valores depositados por origem desconhecida. Ser honesto deveria ser banal, mas estamos longe disso. E aí passamos a endeusar pessoas que apenas cumprem seu papel, dando-lhes uma falsa e irreal condição divina.
Desnudar esquemas de corrupção que movimentaram mais de R$ 8 trilhões no país é algo grandioso. A Lava Jato, com todas as suas imperfeições, não mostrou que o PT exclusivamente saqueou a Petrobrás e os cofres públicos. Revelou, sim, que havia um sopro de esperança em que a velha crença de que apenas pobre, preto e prostituta ia para a cadeia no Brasil estava começando a ficar no passado, com a descoberta do envolvimento de mega empresários e políticos de diversos partidos em organizações criminosas altamente complexas. Então, procuradores e juízes foram guindados à condição de celebridades. Alguns, divindades. E é claro que isso não é bom para ninguém.
Tenho muitas dúvidas e poucas certezas sobre o quão comprometedoras são as supostas conversas entre o então juiz Sérgio Moro e os procuradores. Não sou operador do Direito, não tenho capacidade de avaliar a ética em um caso com essa complexidade. E há que se compreender melhor o contexto de cada diálogo. Agora, uma convicção eu tenho. Moro, Deltan, entre outros, podem ter cometido equívocos, talvez graves, todavia é preciso calma. Um suposto erro não diminui outros acertos. Estão igualmente afoitos os que sumariamente transformaram Moro em bandido e aqueles que defendem o ministro incondicionalmente, sem esperar as coisas aclararem. Seres humanos não estão acima do bem e do mal. Mas podem se comportar assim quando se acham na condição de Deus.