O altruísmo é um dos mais belos sentimentos humanos, podendo ser encontrado até mesmo em bandidos confessos. Não é incomum que ladrões e traficantes sejam justiceiros e benfeitores em suas comunidades e famílias, claro que como estratégia de manter unida e dependente sua barreira de proteção, mas há, em momentos, salvo psicopatas, o humano ajudando, legitimamente, outro humano.
Se a empatia converte momentaneamente bandidos em boas pessoas, é certo dizer que o senso de oportunidade converte bons cidadãos em bandidos de ocasião, arriscaria afirmar que com muito mais frequência.
Não é justo, porém, afirmar que sempre a ocasião faz o ladrão, mas a ocasião acorda a tentação, e esta, bem desperta, gosta de assumir as rédeas do humano que habita.
“Resisto a tudo, menos à tentação” é uma frase provocativa de Oscar Wilde, evidenciando com ironia nossas incongruências.
Diariamente cometemos micro delitos, estimulados pelo senso de oportunidade ou senso da vantagem. Uma ultrapassagem pelo acostamento ou pela rua lateral, que vai trancar mais ainda o trânsito quando o esperto entrar no fluxo principal, alguns metros à frente. As famosas e inocentes furadas de fila, o “achado não é roubado”, comprar celular bem baratinho no grupo de brique sem se importar com a procedência… Alguns argumentam que assim é a vida, que existem os espertos e os trouxas, meio que tangenciando um darwinismo social, a “lei do mais esperto”.
Estes nunca assumem as palavras “roubo”, “receptação”, “ilegal”… tudo está abarcado em “oportunidade”, que é bem mais digerível socialmente. “Eu poderia estar roubando, eu poderia estar matando, mas estou aqui, honestamente, vendendo coisas sem nota e de procedência duvidosa.”
Ninguém é santo, no nível pleno da palavra, este açúcar não saturou na nossa fórmula, tampouco o sal da maldade. Temos ambos, em uma tentativa de equilíbrio constante e tão diversa quanto há humanos. E, convenhamos, alguns desvalidos sociais só encontram meios de sobreviver através de alguns “rolinhos inocentes”. A sociedade absorve e se alimenta de uma dose controlada de maldade, mas nunca morrerá com altas doses de bondade.
Só a sociedade organizada, a política honesta e os valores passados de geração para geração são capazes de frear os arroubos do oportunismo e inspirar a cooperação, evitando o colapso ético e moral.
Os franceses têm um ditado antigo, usado para educar as crianças: “qui vole un œuf vole un bœuf” (Quem rouba um ovo, rouba um boi) que passa a ideia de que não importa o valor, mas a atitude, e que, com a tentação e a oportunidade unidas, quem treinou roubando o ovo, certamente estará mais inclinado a roubar o boi. Precisamos ter isso em mente, ou o boi, o ovo, a vaca, tudo irá pro brejo.