“Não se preocupe.” É a primeira coisa que dizem a quem está preocupado. Pode ter frase mais inútil?
Você não sai por aí dizendo “não se preocupe” para pessoas despreocupadas no intuito de que reflitam, despreocupadamente, sobre não se preocupar no futuro. Basta dizer “não se preocupe” para um tranquilo que imediatamente ele irá se preocupar. “O que está acontecendo?”, “O que eu não estou sabendo?” serão as primeiras perguntas e o início da preocupação do até então tranquilo coitado.
Dizer “não se preocupe” a um preocupado equivale a dizer “pare de cair” a alguém em queda livre, ou “pare de se afogar” a quem não sabe nadar. Na verdade, a pessoa que diz um “não se preocupe” está querendo dizer um “não se desespere”, mas também não se diz isso a quem já está preocupado. Levar a preocupação ao desespero é a especialidade do “não se desespere”.
Na sequência do “não se preocupe”, geralmente vem o “vai dar tudo certo, no final”. Não é uma mentira, o fim é certo, só não é tranquilizador. Este “certo” que contemplará o final é o certo de quem? O meu ou o do caos? O meu ou algum outro das infinitas possibilidades além de mim? O certo é que a possibilidade do meu certo ser o certo que eu quero é remota, se eu nada fizer a meu favor. Daí a preocupação.
Pré ocupar-se é refletir antecipadamente acerca de algo que sabemos ou imaginamos ser iminente. Ocupar-se de algo que ainda não aconteceu é um instinto de planejamento.
O que dizer, então, a quem está preocupado? Me parece mais eficiente dizer: “Muito bem! Você é uma pessoa responsável. Faz sentido ter alguma preocupação sobre este assunto.” E na sequência tentar auxiliar a avaliar os pontos de vista do problema e contribuir com ideias e experiência. Quando alguém simplifica dizendo “não se preocupe” ao preocupado, está sinalizando não estar preocupado com a preocupação alheia. Está gentilmente dizendo “já tenho as minhas, não posso me ocupar com as suas.” Como réplica vingativa, o preocupado poderia dizer ao conselheiro simplista: “Não se preocupe com a minha preocupação, você já tem as suas e são bem complicadas. Mas fique bem, vai dar tudo certo para você, no final.”
Com isso, o conselheiro sentiu o próprio veneno, ficou preocupado por algo que supostamente não está vendo e o preocupado inicial teve um alívio momentâneo, provocado pelo prazeroso sarcasmo. Claro, se você for uma pessoa “boa paz”, não fará isso. Entenderá que o outro, a seu modo, quis ajudar, agradecerá e seguirá com suas ruminações.
O “I Ching” chinês prega que não há o que mude, há apenas o mudar. Todas as coisas são impermanentes porque estão em constante transformação. Essa transformação acontece dentro de um Vazio Infinito (Permanente). Buscar a paz da sabedoria não significa ser irresponsável a ponto de deixar tudo acontecer o tempo todo. Somos parte do caldo universal e não somos pedras, somos seres pensantes e de ação, mas com limites. Saber onde e quando agir e não agir, é a sabedoria almejada. Preocupar-se é legítimo e útil ao bem decidir, à sabedoria e à ação eficaz. Desesperar-se, no entanto, é pior que fazer nada. É cair no precipício picando e agarrando-se a tudo a ponto de provocar uma avalanche.