O galo

Uma e meia da madrugada, do banheiro ouvi o galo cantando. Não é incrível? Alguém no meio da cidade ainda tem um galo! Não vivo em uma metrópole, mas já é uma dessas cidades que reúne o melhor e o pior dos dois mundos. O galo é um resquício do interior, os assaltos às joalherias uma moda importada das capitais. O escândalo íntimo da vez, que deixa de ser íntimo pois todos se conhecem e os engarrafamentos nas horas de pico. Os animados encontros no café para xingar o prefeito, os vereadores, o presidente, os juízes… Temos de tudo nas cidades de interior.
Mas, voltemos.

Uma e meia da madrugada, seu galo? Que espécie de profissional é você? Saiba que somos colegas, o galo é o símbolo da propaganda, pois faz o primeiro anúncio do dia. Saiba também que você é um publicitário ansioso. Para cada tipo de anúncio, há o momento ideal, ou timing, para usar o anglicismo profissional.

Do silêncio do banheiro, aguardo mais um tempo: Sim, é mesmo um galo. Ora, poderia ser um despertador bem humorado de um vizinho, mas, por instinto, sabemos quando é um galo de verdade ou um galo gravado. Invisto mais uns minutos, pensando qual a razão de um galo cantar a essa hora.

Ele pode estar próximo a uma luz artificial que o confunde a todo instante com o nascer do sol. Pobre galo, deve viver um inferno de insônia. Amanhã tentarei vê-lo, deve ser um galo com grandes olheiras. Talvez alcoólatra.
Mas, espere! Ficou mais incrível. Outro galo respondeu! Nunca havia percebido que galos conversam por cantadas sequenciais.

Isso é comum nos cachorros. Um late na outra quadra, depois um no meio da quadra, aqui em casa uns dez latem, depois no vizinho e assim segue a onda. Imagino que a mensagem corra a cidade. E sempre tem o cãozinho angustiado que fica latindo sozinho quando todos os outros já foram dormir, como se ficasse perguntando: será que ouviram direito? Será que não distorceram um “au” para um “auu”? Olha as fake latidas! Alguém tem retorno? Podem, por favor me dizer o que ficou decidido?
Cara chato! Sempre tem, no interior e nas capitais. Mas voltemos ao galo.

Como não posso deixar uma curiosidade faminta, fui ao Google. Ao digitar “galos que cantam” ele já completou “à noite”. Incrível! Descobri que cientistas (sempre eles) da Universidade de Nagoya, dirigidos pelo professor Takashi Yoshimura, fizeram experimentos com galos. Concluíram que há vários estímulos para o canto e que o amanhecer é apenas mais um. Galos cantam quando sentem qualquer possibilidade de perigo e outros abalos na normalidade. E a minha dúvida para o “diálogo” dos galos foi sanada. Eles cantam também para mostrar quem manda e o que canta antes geralmente é o dominador; os outros, menores, o seguem na cantoria. Mesmo com o estudo, os cientistas não chegaram a uma conclusão fechada sobre todos os porquês dos galos.

Como os humanos gastam tempo com coisas estranhas, pensou o cara que, a uma e meia da madrugada, sentado no vaso, elucubrava sobre galos que cantam à noite.

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