Era uma vez um país muito peculiar. Os esquisiquistenses eram pessoas que não conseguiam falar o mesmo que fazer. Quando faziam algo, diziam o contrário e vice-versa, e versa e vice. Assim sempre acabavam fazendo merda, seja pelo ato, seja pela palavra. Neste país, as pessoas iam às ruas gritando e batendo tachos, dizendo que queriam acabar com tudo o que havia de ruim. Queriam o fim das bandalheiras, queriam representantes decentes e justos nas altas cortes esquisiquistonianas. Porém, desde que o país foi parido, o mesmo povo só escolheu líderes loucos, mal intencionados, burros e bandidos ousados.
Quando o protesto acabava, aproveitavam para encher seus tachos batidos de produtos saqueados das bancas e barracas dos comerciantes que encontravam pelo caminho. Protestar dava muita fome. Os esquisiquistenses eram pessoas que tinham ética e valores de mão dupla, não tinham clareza do que era certo e errado pois, às vezes, o errado era muito legal pra ser errado. Por outro lado, muitas vezes o certo era difícil e penoso, então não poderia ser certo o certo ser tão sofrido. Oscilavam em atitudes e discursos contrários, não havia esforço conjunto. Como patetas, viviam a esmo cuidando apenas de suas necessidades básicas e esperavam que tudo, um dia, melhorasse por mágica ou providência de algum ser iluminado. A filosofia esquisiquistoniana era “deixar como está para ver como fica”.
Um dia, não se sabe de onde, apareceu um sábio andarilho em Esquisiquistão. Com a mente viajada, o velho não estava impregnado com os conceitos e manias esquisiquistenses e, nos primeiros dias de estadia, já havia percebido a raiz do problema. Reuniu todos na praça para dar um grande conselho. Todos os cidadãos estavam lá, afinal ele poderia ser o iluminado portador da mágica solução para Esquisiquistão.
– O problema de vocês é a palavra. Vocês têm muitas. A palavra dá sentido às coisas, mas se uma mesma coisa for dita com diferentes palavras, a coisa perde o sentido.
Os esquisiquistenses olhavam de um jeito esquisito para o sábio enquanto ele continuava:
– Quando os recursos de todos são desviados pelos seus líderes, vocês chamam “corrupção”, quando vocês os desviam chamam “oportunidade”; quando um jovem da vila dos casebres rouba, é “ladrão, vagabundo”; quando um jovem da colina dos palácios rouba, é “jovem infrator”. Quando algo mal feito os prejudica, usam o termo “gambiarra”; quando o malfeito os beneficia é “jeitinho criativo”. Quando o bêbado é da outra família, é “viciado sem-vergonha”; quando é da sua família, é “pobre coitado doente”. Meu conselho é que usem menos palavras, cortem pela metade, usem um nome para cada coisa, assim elas terão um sentido e o sentido os fará tomar decisões.
O sábio deixou o conselho e foi embora, não se sabe para onde. Os esquisiquistenses ficaram refletindo, o sábio tinha razão, teriam que eliminar metade de suas palavras. O problema é que não chegavam a um consenso de qual metade. Assim tomaram a única atitude possível: eliminaram todas as palavras e viveram eternamente em silêncio, deixando tudo como estava para ver como ia ficando.