Flertando com a morte

É preciso admitir: muitos brasileiros não ligam para a prevenção. Afinal, por que evitar um perigo se podemos sentir a emoção de encará-lo? É uma idiotice, mas o dia a dia nos mostra que é exatamente desta forma que muita gente pensa. Até hoje, apesar da legislação e das provas cabais de que o cinto de segurança salva vidas, milhares de condutores não o utilizam. Nas fábricas, o uso dos Equipamentos de Proteção Individual requer, não raro, uma ameaça de demissão. O chinelo de dedo, proibido entre os motoqueiros pelos perigos que representa, continua sendo o “calçado” mais comum nos dias quentes.

Não é diferente com a Saúde. No século 20, para várias doenças, como sarampo, tétano, poliomielite e febre amarela, os cientistas conseguiram criar vacinas. Num primeiro momento, a população desconfiou e resistiu à imunização. Depois do surgimento de um novo surto, diante da perda de amigos e familiares, a adesão aumentava e até uma certa histeria era criada, mas bastavam dois ou três novos anos sem casos para muitos relaxarem. Resultado: as doenças voltavam.

O exemplo mais recente é a chamada Gripe A. Depois da disseminação e das mortes, em 2009, muita gente correu aos postos quando a vacina surgiu, no ano seguinte. Contudo, a “falta” de novas ocorrências reduziu a adesão, a ponto de sobrarem remédios. Agora, com a Covid-19, parece que todos “redescobriram” o valor da prevenção e correm aos postos. Tanto que o governo, amparado nas estatísticas de imunização dos anos anteriores, não produziu doses suficientes para atender a toda a demanda.

Não é um bom momento para apontar erros e procurar culpados, mas precisamos, sim, refletir sobre a nossa falta de responsabilidade com a própria saúde e com a dos outros. Que esta pandemia nos deixe, de uma vez por todas, a certeza de que não podemos eternamente flertar com a morte. A vida é um bem precioso demais para ser colocada em risco.

Enquanto cidadãos, todos nós temos direitos e deveres. Significa que até poderíamos ser irresponsáveis com a nossa própria existência se isso não colocasse os outros em perigo. A falta de empatia e de solidariedade daqueles que não ligam para o “grupo” nos trouxe até aqui. Já passou a hora de aprendermos essa lição tão básica.

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