Mais uma criança morta pelas mãos de quem a colocou no mundo. Mais uma assassina apresenta-se à Polícia para comunicar um desaparecimento e confessa ser a responsável por colocar fim à breve vida. Mais uma vez o Rio Grande do Sul se choca com um crime bárbaro, desta vez, em Imbé. Antes mesmo do corpo do menino, de sete anos, ser encontrado, detalhes dos maus-tratos vividos impõem contornos mais dolorosos à história.
O menino vivia com a mãe e a companheira dela. Ambas estão presas. Em um vídeo divulgado pela polícia, a tortura psicológica e as agressões sofridas ficam evidenciadas. O menino relata à namorada da mãe que não segura o xixi para lhe chamar a atenção e ficar “solto”, mas a mulher diz: “se tu te mijar, eu te desmonto a pau”. Ficou comprovado, ainda, que o menino era acorrentado em um armário e, como havia conseguido escapar recentemente, as duas mulheres avaliavam a compra de corrente e cadeado para prendê-lo com “mais força”.
Impossível não ficar com o coração apertado diante de tanta crueldade. E também não lembrar de casos recentes. Rafael Winques foi assassinado aos 11 anos por sua mãe, Alexandra Dougokenski, em maio de 2020, na cidade de Planalto, no norte do RS. Bernardo Boldrini foi morto, também aos 11 anos de idade, em 4 de abril de 2014, em Três Passos, no Noroeste do RS. Foram condenados pelo crime o pai Leandro Boldrini e a madrasta Graciele Ugulini. O Brasil se chocou, no último 8 de março, com a morte de Henry Borel, de quatro anos, espancado no apartamento onde morava com a mãe, Monique Medeiros, e o padrasto, o médico e vereador Jairo Souza Santos Júnior, e chegou morto ao hospital. Mensagens no WhatsApp e depoimentos confirmaram que não era a primeira vez que ele sofria agressões.
Por mais chocante que esses quatro casos sejam, o pior é pensar que estes são apenas os que vieram à tona pelo desfecho ser a morte e pela investigação policial. Mas quantos Henrys, Rafaels e Bernardos são humilhados, espancados e torturados sem que a história venha a público? Se não lhe tiram a vida, ainda assim, lhe tomam a infância e o direito universal de serem amparados, apoiados e preparados para a vida adulta. Será mesmo que ninguém ouviu os gritos deste menino morador do Litoral Gaúcho – sua identidade está sendo preservada – nem desconfiou do sofrimento que lhe era imposto? Será que não houve nenhuma oportunidade de lhe salvar a vida? Será que perto de nós não há crianças que precisam ser salvas? Para mais uma, foi tarde. Para outras, pode ainda ser tempo.