Houve um tempo em que os gaúchos não consumiam doce de leite. Compravam Mu-Mu. A marca Mu-Mu era top of mind quando este anglicismo ainda não estava incorporado ao vocabulário tabajara. Melhor definir como uma figura de linguagem, a metonímia, que toma um termo por outro com o qual tem uma relação lógica, como a marca por um produto, por exemplo. Assim foi que o mitológico atacante colorado Claudiomiro, agradeceu à Cervejaria Polar pela caixa de “brahma” que recebera como prêmio. Brahma por muito tempo era sinônimo de cerveja.
Não havia boteco nos confins dos rincões do Rio Grande do Sul que não vendesse Mu-Mu. Nas portas havia uma plaqueta com a icônica vaquinha com uma florzinha na boca, avisando: “Aqui tem Mu-Mu”. Nas entradas das cidades, um outdoor mais customizado anunciava: “Montenegro tem Mu-Mu”, por exemplo.
Foi assim que, assentado a uma das mesas do clássico Café Tortoni em Buenos Aires, certa vez, estranhei que o cheiroso churro que nos serviam não era recheado com doce de leite. Chamei o “mozo” que nos atendia e lhe perguntei se não havia “Mu-Mu”. Diante do olhar nublado do garçom, que nos pedira que falássemos em português para treinar-lhe a audição, apressei-me a traduzir: “Dulce de leche, dulce de leche!”
Fiquei sabendo das pretenções políticas a longo prazo do prefeito Gustavo Zanatta quando o entrevistei para a rádio web JP do extindo jornal O progresso, em 2016, ano em que concorreu pela primeira vez a prefeito. Talvez, a família e amigos mais íntimos soubessem dos sonhos de voar do jovem ícaro – então com 37 anos – mas eu, como entrevistador, admirei-me da transparência quase pueril do vereador de primeiro mandato, com quem, antes, nunca havia tido contato. Às vezes, quando temos planos muito bem claros, e os divulgamos, atraímos a invídia alheia e a atenção dos tranca-ruas de plantão.
Assim que, a partir daí, soube que os planos de Gustavo Zanatta para o seu futuro eram políticos. Vereador, prefeito, deputado estadual e… bueno, agora dizem por aí que nem o céu é limite para quem tem foco em seus objetivos.
A propósito, Zanatta deveria ensinar à Câmara de Vereadores que “transparência” não é só um portal onde se espiam os salários de funcionários públicos. Vereadores e vereadoras se concederam auxílio-alimentação de 1050 Reais sem nenhuma prévia discussão com os pagadores de seus proventos (nós outros), à sorrelfa e à socapa, expressões que agradam aos advogados penais quando querem qualificar as ações dissimuladas de criminosos manhosos. Não usaram suas profícuas redes sociais para anunciar de antemão que seriam pais de uma criança indesejada pela enorme família dos pagadores de impostos, maioria dos quais não recebem das empresas privadas para as quais trabalham nenhum auxílio além do parco salário a que submetem por necessidade.
Depois de um primeiro mandato que lhe garantiu mais de 80% de aprovação nas urnas para um segundo turno de quatro anos, tendo cumprido apenas quatro meses dele, Zanatta se lança pré-candidato a Deputado Estadual. Justifica-se o prefeito que Montenegro precisa ter representação na Assembleia para continuar a crescer. Montenegro já teve deputados autóctones e, neste momento, possui um deputado residente, e nunca houve relação direta entre representação na Assembleia com desenvolvimento acelerado, a não ser uma dívida impagável do famigerado Projeto Cura.
Zanatta é jovem e está autorizado a planejar seu futuro político. Porém, foi eleito fragorosamente para cumprir quatro anos de mandato como prefeito. Não o queremos, por ora, como deputado. Queremos um outdoor na entrada da cidade, como aqueles do doce de leite “Mumu”: Montenegro tem Prefeito.