A Árvore da Vida tem galhos secos

Bastou que o frio se intrometesse no outono seco para eu enrolar um cachecol em torno do pescoço e procurasse um bom filme para assistir. Quando me rendo à lareira e a um vinhozinho, não procuro lançamentos cinematográficos para me divertir em frente à smart tv. Procuro bons filmes, independente de ano de lançamento. Os serviços de streamming nos facilitaram uma cinemateca inteira à disposição. Assim que, no final de semana, procurando um bom clássico para assistir, dei-me com “A Árvore da Vida”, de Terrence Mallik, lançado em 2011.

As notícias do Planalto Central, que envolvem os três poderes da República, e os breaking news a cada segundo dando conta de que a humanidade não tem conserto, têm-me feito aumentar a esperança de que, se uma vida melhor é possível, não será neste plano presente.

Não somos só vítimas da história e políticas humanas. Parece-me que toda a atividade poderosa do universo não nos considera, e nos atropela. Que importa se uma supernova explode em algum rincão do cosmo se não controlo ao menos minhas circunstâncias?

A Árvore da Vida me aprofundou na inquietude por não saber me explicar a minha importância cósmica, a não ser pela fé. Um filme que mais nos afoga em silêncio e perguntas.

Ali estava Jack, menino e depois homem, tentando entender a morte do irmão e a vida do pai. E, entre um nascer do Sol e uma nebulosa galáctica, Malick desenha o universo inteiro — aquele mesmo que explode há bilhões de anos, sem dizer se está em expansão ou morrendo — enquanto nós aqui, com os pés molhados da última enchente, nos perguntamos onde colocar o sofá, ou discutimos se devemos consumir ou não ovos e frangos em razão da gripe aviária.

O filme não conta uma história. Ele murmura: olha o cosmos, olha o pó, olha teu nome riscado na areia. Como achar que somos importantes? Como acreditar que a dor da nossa casa perdida, ou da falta de quem nos cativou com sua existência tem algum lugar no meio das estrelas?

Vivemos um tempo líquido — repito mais uma vez Bauman — em que tudo escorre. Afetos, empregos, certezas. Mesmo a fé. A vida escapa entre os dedos, mesmo quando achamos que estamos segurando firme. Malick parece entender isso. Por isso não conta uma história com começo, meio e fim. Ele nos dá fragmentos, respiros, como a vida de verdade.

É isso que o filme sugere sem dizer: que só a fé — esse sentimento que só a gente tem, pode dar sentido àquilo que não tem resposta. O universo é grande, sim. Pode-se imaginar mundos dentro de outros mundos. Mas é só o humano que pergunta: que tenho eu contigo, ó poderoso universo?
E enquanto perguntamos, caminhamos. Pressionados, mas não desanimados; perplexos, mas não desesperados; perseguidos, mas não abandonados; derrubados, mas não destruídos.
Era a fé de Paulo de Tarso. É a minha fé.

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